Região Amazônica é um Livro de Saber
Atemporal, um Tesouro Que Pertence aos PovosEmanuel Tadeu Machado

A Amazônia abrange boa parte do continente sul-americano.
Atravessa nove países, e o seu relevo diversificado inclui planícies, planaltos
e montanhas. A intensidade da vida se expressa através do calor equatorial e da
constante umidade, decorrente da presença de um grande volume de água.
A água é um fator preponderante na região, desde o
subterrâneo até o ar. A grande bacia de rios, que por vezes possuem centenas de
metros ou até alguns quilômetros de largura, irriga o corpo florestal,
transportando vida e energia.
O curso dos rios é um espetáculo deslumbrante, que nos
leva a refletir acerca da grandiosidade da vida com seus movimentos de fluxo e
refluxo. A umidade da floresta também contribui para um resfriamento sazonal na
época das chuvas.
A floresta não distingue quatro estações do ano, para ela
o tempo é dual, e essa dualidade se reflete em seus ciclos. Chuva e Sol, maré
baixa e maré alta, vento e calmaria, céu e rio, tudo é duplo. O homem amazônico,
ou amazônida, vivencia essa dualidade
em seu quotidiano. Por vezes tem consciência da dualidade, mas na maioria das situações
deixa-se levar pelos ciclos naturais de vida da região.
A intensidade da floresta se traduz por suas árvores
fortes, que possuem raízes relativamente superficiais espalhando-se por dezenas
de metros, mesclando-se às raízes umas das outras, sejam grandes ou pequenas, e
formando um enorme corpo vegetal que se manifesta como um só ser e espírito. As
raízes da floresta são seu cerne. Nelas está concentrado o potencial de
desenvolvimento da vida. É surpreendente a capacidade de reação da floresta ante
as ações de degradação, como queimadas ou desmatamentos.
Sua fauna é rica e diversificada. Seus animais exóticos,
por vezes ainda desconhecidos pelo homem, expressam a sabedoria da natureza
enquanto cumprem com o seu Dharma,
vivendo e evoluindo integrados à floresta.
Manter um contato vivo com a floresta, em meio à mata ou
na margem dos rios, é um exercício de percepção de um mundo mais sutil e de
reencontro com as aspirações sagradas. É perceptível uma atmosfera espiritual
diferente, que começa a fazer sentido à medida que se sossega a mente. Alguns
habitantes da floresta e da margem dos rios conseguem essa percepção sublime, expressando
profunda espiritualidade em seus singelos deveres quotidianos.
A floresta pode fornecer de tudo. Alimento, abrigo e
sabedoria são o básico que os povos amazônicos têm à sua disposição. O simples
ato de observar as águas fluírem, com a luz solar espraiando-se sobre as ondas
densas da água doce e barrenta, com o vento úmido que canta aos ouvidos, é um
convite para se esquecer de si, ouvindo a profusão do silêncio na alma.
Contemplar um rio é imergir a mente no silêncio.
Aqueles que habitam o interior da mata, longe dos centros
urbanos, das grandes rotas de navegação, dos grandes e pretensiosos projetos de
desenvolvimento, que contemplam e dialogam com a sabedoria da floresta, podem
ter um vislumbre da vida circundante, sendo partícipes de uma corrente multidimensional.
A sabedoria disponível no livro da floresta pode ser
interpretada por todos, basta abraçar a atmosfera vibrante que permeia o
ambiente da floresta. A percepção do ambiente se modifica. Tudo é observado
como vivo e dinâmico. A exemplo das palavras de um velho amazônida que vive às
margens de um grande rio, “as águas estão
vivas, o rio está vivo, se for entrar lá, sempre peça permissão para entrar e
tirar de lá o seu sustento”. O
respeito à natureza e ao seu espaço deve ser refletido no homem que deseja
viver neste território sagrado.
A experiência de conviver com uma floresta é benéfica e
pode proporcionar importantes lições de ordem intuitiva. Conforme escreveu
Carlos Cardoso Aveline:
“Se o amor por uma árvore ou floresta é recíproco, deve
haver um processo de reconhecimento e aceitação mútuos. Como pode dar-se isto?
Em primeiro lugar, para sermos aceitos por uma floresta, devemos aproximar-nos
dela tranquilamente, deixando de lado preocupações de ordem pessoal. Ao entrar
nela, é bom mover-se pouco e avançar cumprimentando-a silenciosamente com nosso
coração. É correto conversar com ela em pensamento. Aos poucos, os seus cheiros
e sons nos envolvem, e somos recebidos e incluídos pela comunidade complexa de
animais e vegetais que constituem o local. É isto que nos dá a sensação de
sentir-nos à vontade em uma floresta, e não o fato de passarmos mais ou menos
tempo nela. Há gente que mora em florestas, mas, por falta de sintonia, procura
passar a maior parte do tempo longe delas, em ambientes urbanos. Outras pessoas
moram em cidades, mas buscam as florestas por uma necessidade de renovação
interior: não veem a floresta como madeira a ser derrubada, mas como uma
comunidade da qual podem fazer parte espiritualmente”. [1]
A Amazônia, assim como qualquer bioma do planeta, guarda
um livro de saberes atemporais, imprescindíveis aos seres, em suas jornadas de
evolução espiritual. Ela é um tesouro legado aos povos, para auxiliar em sua
realização histórica.
Por séculos, muitos povos habitaram a região. Os povos
indígenas que floresceram e morreram ao longo da Amazônia conforme as leis dos
ciclos históricos, preservando a perfeita integração com a floresta, souberam
evoluir tomando as leis naturais como referencial em suas vidas. A cultura de
tais povos e sua visão de mundo merecem ser estudadas e aprofundadas.
A cultura indígena pode parecer inadequada ao modo de
pensar moderno, remetendo a uma ideia de atraso civilizatório, porém devemos
lembrar que o verdadeiro avanço é espiritual e se dá com o cultivo ao desapego
e através do aprendizado com a natureza em suas manifestações sutis.
Cardoso Aveline afirma:
“Os indígenas (…) tinham uma visão relativamente estreita do mundo. Vemos
com facilidade os erros do pensamento indígena tradicional, porque é sempre
fácil enxergar os defeitos alheios e nossas limitações são outras. Mas apesar
das cegueiras culturais, dos tabus e nacionalismos tribais, havia nas
sociedades indígenas - como há hoje na nossa - uma tradição de sabedoria
transcendental. Ela permanecia à disposição dos que estavam prontos e eram
capazes de erguer os olhos para ela. Quando o aprendiz está pronto, a sabedoria
aparece - em qualquer tempo e lugar.”[2]
Para viver na Amazônia, o homem deve se integrar a ela.
Deve reconhecer que ela é um grande ser vivente, um componente importante ao
equilíbrio do planeta. Antes de viver na
região, o homem deve intentar viver com
a região, integrando-se às suas leis ecológicas. Assim, deve respeitar os
espaços e cursos naturais, não impedindo suas transformações, nem espalhando
alterações artificiais que têm consequências desastrosas ao delicado equilíbrio
da região.
Muitos veem a Amazônia como uma terra exótica, com uma
fauna e uma flora exuberantes, com uma cultura ainda primitiva, pronta para ser
explorada e atender os anseios consumistas de uma sociedade doente e ignorante.
A exploração desmedida da floresta, do solo e dos rios
causa impacto direto no ser humano. Os grandes projetos barragistas e de
exploração mineral e agropecuária carregam consigo mazelas sociais causadoras
de grande sofrimento. Quanto mais se degrada a região, mais o povo é afetado,
pois, mesmo sem saber, ele possui uma ligação sutil com tudo o que o cerca. As
energias da vida que permeiam o espaço amazônico vibram conforme os ataques que
sofrem, e isso se reflete no microcosmo de cada ser vivente, causando
debilidade moral e física.
Podemos nos referir a uma civilização amazônica, que
transcende as fronteiras estaduais brasileiras e nacionais. Essa civilização
está hoje permeada pelo medo e pela incerteza. A destruição da floresta e de
seus valores tem impacto direto na identidade do homem amazônico, que sofre
inconscientemente junto com a floresta. Os problemas sociais decorrentes são
fruto desse distanciamento entre o homem e a sabedoria da floresta. É imprescindível que haja um exercício de despertar,
fazendo com que seja reconhecido o valor da floresta, desde as esferas físicas
até as mais sutis.
Cabe empreender esforços para que seja promovido o
resgate dos valores culturais da Amazônia, o resgate de seus rios e florestas,
das tradições dos seus povos, não somente dos indígenas, mas do que de melhor
os que aqui chegaram têm a oferecer. Assim nascerá uma comunidade integrada a
um ideal de ecologia humana e profunda. Cabe reconhecer a ligação de espírito entre
os seres que participam desse enorme bioma, tratando o homem como um deles.
Por si só a Amazônia evolui. Cabe ao homem reconhecer tal
realidade e verificar a necessidade de evoluir em conjunto.
O Dia da Amazônia
Em 5 de setembro de 1850, D. Pedro II, o imperador-filósofo
[3], criou a província do Amazonas, por
meio da Lei nº 582, desmembrando-a da província do Grão Pará.
O dia da Amazônia, estabelecido por lei em 2007, surgiu
como uma homenagem à criação da Província do Amazonas, por D. Pedro II.
O objetivo da data é chamar a atenção para a necessidade
de preservação do bioma amazônico, alertando o Brasil e o mundo para a adoção
de medidas de combate à destruição da floresta, e para que sejam pensadas
soluções de desenvolvimento regional sem que seja necessária a exploração
desmedida da biodiversidade. Pretende-se também fomentar o debate sobre os
problemas atuais da Amazônia, bem como promover a educação de jovens, acerca da
importância da preservação da floresta.
A visão humanista do Imperador o levava a preocupar-se
com a ecologia. Em 1862, quando não se falava em questões referentes a
preservação ambiental, o Imperador adquiriu no Rio de Janeiro uma fazenda, que
abrange o atual parque nacional da Tijuca, e promoveu o seu reflorestamento com
mata atlântica nativa.
Outro fruto da consciência ecológica do Imperador é a
criação do Museu Botânico de Manaus, em 1883, por esforços do naturalista João
Barbosa Rodrigues. A Princesa Isabel foi a maior responsável pela criação do museu.
A Amazônia é vital para o planeta. Sua preservação
constitui um desafio para a humanidade. O nascimento de uma consciência
ecológica resultante da redescoberta de tradições e valores esquecidos é vital
não só para o bioma amazônico, mas para a humanidade, em sua biodiversidade
planetária.
NOTAS:
[1] “A Vida Secreta da Natureza”, Carlos
Cardoso Aveline, terceira edição, editora Bodigaya, Porto Alegre, 2007, p. 25.
[2] Ver o texto “A Sabedoria Ecológica dos Indígenas”, de Carlos Cardoso
Aveline, disponível em nossos websites associados
[3] Ver o texto “A Filosofia de Dom Pedro II”, de Carlos Cardoso Aveline,
disponível em nossos websites associados.
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Veja o texto “Meditando Pelo Despertar da Amazônia”, de
Carlos Cardoso Aveline, que está disponível em nossos websites associados.
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Em setembro de 2016, depois de
cuidadosa análise da situação do movimento esotérico internacional, um grupo de
estudantes decidiu formar a Loja Independente de Teosofistas, que tem como
uma das suas prioridades a construção
de um futuro melhor nas diversas dimensões da vida.
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