As Características De Uma Equipe Vencedora
Carlos Cardoso Aveline
Carlos Cardoso Aveline
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A
vida humana é coletiva. Ninguém pode existir isolado. Mesmo quando estamos
momentaneamente sozinhos, é possível sentir a presença sutil de várias pessoas
em nosso mundo interior. A memória e a imaginação de um indivíduo abrigam
multidões.
A questão crucial não é, pois, se queremos ou não
relacionar-nos com outras pessoas. A interação é inevitável: a questão é saber
se temos o talento necessário para transformar nossos relacionamentos de modo
que eles passem a ser fontes de sabedoria e felicidade.
Um casal unido
pelo amor constitui uma equipe completa e nele a cooperação envolve todas
as esferas da vida.
A família é um
grupo ainda mais complexo. O trabalho, a comunidade e a associação teosófica são
espaços de convivência onde sempre é possível aumentar os níveis de ajuda
mútua.
As condições
externas nem sempre fazem diferença. Pode haver um clima psicológico ótimo
enquanto se enfrenta grandes obstáculos, e o estado de espírito do grupo pode
ser pouco inspirador mesmo quando a situação externa é favorável. Os fatores decisivos
para o êxito são as metas e os métodos adotados. Vejamos aqui dez prioridades e características
da equipe eficaz:
1)Objetivos Bem Definidos
Este ponto vale para
o indivíduo, a empresa, a família e a agrupação de estudos filosóficos. Qualquer
associação de pessoas precisa metas físicas e espirituais claras. O futuro não
deve ser esperado, mas visualizado e construído de modo ativo. Qual é o cenário
desejável para dentro de cinco, dez, quinze e vinte anos?
2)Funções e Responsabilidades Distribuídas
Numa equipe
eficaz, o talento das pessoas é identificado e empregado nas áreas certas. Os líderes distribuem responsabilidades
apostando no surgimento de novos talentos. Eles criam situações de aprendizado
positivo e fazem com que seus colegas ganhem novos conhecimentos a cada dia.
3)Fortes Laços de Confiança Mútua Entre os Indivíduos
Quando as pessoas
podem confiar umas nas outras, o grupo obtém resultados melhores. O que se
necessita é um companheirismo produtivo e não a amizade ociosa de quem evita
comprometer-se. É decisiva a construção de relações fortes e dinâmicas entre os
integrantes da equipe.
Os muros e as
máscaras são destruídos pela solidariedade na ação. Eventuais sentimentos de
inveja indicarão uma falha na área da autoconfiança e da relação do indivíduo
com sua própria alma espiritual. E isso deve ser olhado de frente. A autoestima
destrói a inveja. A humildade deve andar junto com a coragem. A mediocridade
aparecerá dentro e fora de cada um, para ser compreendida e transcendida sem
atropelo. O motivo da gradualidade é um fato objetivo: a morte da ignorância
raramente é súbita. A iluminação é gradual.
4)Respeito à Autonomia do Indivíduo
Uma boa equipe não
funciona como rebanho. Cada membro é fundamentalmente autônomo e sabe ouvir a
voz da sua própria consciência. O grupo respeita o espaço individual e preserva
as diferenças. Os talentos de cada um enriquecem a equipe toda. Perante a vida, cada um é absolutamente
responsável por si mesmo e por suas ações. A autonomia é a chave da criatividade.
5)Conflitos Administrados Corretamente
As diferenças de pontos
de vista não são suprimidas superficialmente, o que levaria a disputas
subterrâneas e desleais. Para que as contradições internas não cresçam em
excesso, devem ser examinadas honestamente e colocadas no contexto maior do
ideal comum. Não se pode tolerar conflitos descontrolados. É preferível possuir
menos gente no grupo do que aceitar divergências que impedem um clima
construtivo. Porém, sempre que um conflito ultrapassa os limites do razoável,
devemos reavaliar o grupo como um todo.
Liderar é aceitar
as pessoas com seus defeitos e estimular o melhor delas sem exigir perfeição. Os
que chegam ao movimento teosófico trazem consigo cicatrizes e limitações. A hipocrisia, porém, é um veneno mortal e deve
ser evitada pelo uso da franqueza. Uma pedagogia transparente desestimula o uso
de máscaras. Aprender é desafiante e cada estudante deve estar preparado para sofrer o que considera profundas injustiças pessoais. Atrás das injustiças, há lições
sagradas para ele.[1]
6)Avaliação Regular do Progresso
do Grupo
Num grupo
saudável, os erros e os acertos são colocados na balança. As lições são absorvidas.
Os avanços são destacados, e os méritos, reconhecidos. A ajuda mútua ocupa um
lugar central na estrutura e na escala de valores. Nenhum membro do grupo se
coloca como infalível ou esconde seus erros.
Quando toma a
iniciativa de falar das suas falhas, o integrante do grupo elimina as causas da
inveja e dá exemplo de seriedade e tranquilidade. Porém a autoestima é central
em qualquer aprendizagem. A visão dos erros deve ser colocada dentro do contexto
maior da meta clara, do potencial positivo e dos acertos já obtidos na
caminhada. O pensamento sobre o que é ótimo constitui o combustível que leva o
peregrino até a vitória.
7)Olhar na Frente e Abortar o Perigo
Uma função
importante de um grupo de pioneiros é sair na frente do perigo e abortar a
derrota. Todo mal que ainda não ocorreu pode ser evitado, segundo Patañjali
ensina. O fracasso pode ser prevenido a tempo, se tivermos um olhar
suficientemente atento.
Outra chave para a
vitória da equipe é a capacidade do indivíduo de colocar-se no lugar dos
outros, mantendo bons sentimentos. Isso
significa que, num exército, cada soldado deve pensar como um general. Na
família, o filho pode colocar-se na posição do pai. Na empresa, o funcionário mais
humilde é capaz de pensar, compreender e colaborar com a estratégia do
conjunto. A identidade mútua entre líderes e liderados é básica para a eficácia
coletiva.
O pioneiro
criativo tem conhecimento, iniciativa própria e um compromisso pessoal com o objetivo
comum. Ele deseja sinceramente o bem de cada um dos seus colegas. Ele ajuda a
reexaminar e clarificar constantemente a missão e as metas comuns, através do
diálogo com os companheiros de missão. Ele estimula uma interação sincera entre
as pessoas, desarma os sentimentos traiçoeiros e desautoriza manobras desonestas
dentro e fora do grupo. Ele dá o exemplo prático do que cada membro da equipe
deve fazer, nos vários aspectos do trabalho e da convivência. Desse modo,
merece o respeito de todos.
Se um indivíduo
atua do modo correto, a vida lhe abrirá portas mais cedo ou mais tarde. E
quando alguém que tem uma função de liderança não atua de modo responsável, perderá
em algum momento as oportunidades que não soube aproveitar.
O pioneiro deve
combinar tarefas diferentes. Definido o objetivo, suas funções incluem conhecer
profundamente o terreno de operações, avaliar as forças favoráveis e os obstáculos,
e estabelecer um método e um ritmo adequados de trabalho em função do tempo
disponível. Ele motiva seus colegas, usa corretamente os talentos da equipe e
alcança passo a passo a vitória enquanto mantém o esforço comum em um ritmo
equilibrado.
8)A Arte de Ser Transparente
Construída e
preservada uma relação de confiança, o líder eficaz revela ao grupo as
informações decisivas, democratizando e compartilhando os dados necessários
para que todos compreendam a realidade. Ele estimula o pensamento estratégico
por parte dos seus colegas. Ele rejeita a obediência cega e mecânica, porque
sabe que um grupo vencedor necessita do talento criativo de todos.
Devemos conhecer o
pensamento dos nossos colegas. O trabalhador dotado de bom senso sabe que não é
o dono da verdade. Ele tem algo a aprender com cada um. Apoiando a todos, deixa
claro que precisa do apoio deles, fazendo com que cada membro da equipe se
sinta espiritualmente corresponsável pelo êxito coletivo.
É correto antecipar
e prever as consequências de cada decisão a ser tomada. O que farão, e o que
dirão, por exemplo, os adversários? A sabedoria estratégica chinesa ensina:
“Aquele que não
conhece a si mesmo e não conhece o adversário perde todas as batalhas. Aquele
que conhece a si mesmo, mas não conhece o adversário, perde metade das
batalhas. Aquele que conhece a si mesmo e conhece o adversário ganha todas as
batalhas.”
Conhecer a si mesmo significa ter uma meta clara, ouvir os colegas e
manter a equipe motivada. Conhecer o seu
adversário significa poder antecipar as consequências do que fazemos e
prever o que farão aqueles que se opõem ao nosso progresso.
9)Delegar Tarefas: Saber Confiar
Depois de fazer
uma avaliação correta da realidade, o trabalhador eficaz define o rumo da ação,
dentro dos limites do seu dever. Suas decisões estratégicas podem ser lentas.
Podem ser graduais. Mas, salvo raras exceções, ele não volta atrás depois de
tomar uma decisão importante.
A decisão correta
requer coragem, prudência e sabedoria. Diante da necessidade de fazer uma
grande escolha, o líder quase percebe que está profundamente só. Há um nível de
carma ou responsabilidade que é só dele.
Deve possuir uma forte estrutura psicológica para arcar com as consequências
do que faz.
Para liderar - ou
para participar do processo de liderança, o que é a mesma coisa - o indivíduo
deve examinar sua base emocional e sua capacidade de tomar decisões em sua
própria vida. Ninguém poderá ser firme perante um grupo se não for firme
perante si mesmo. “Maior que um general capaz de vencer mil homens em um campo
de batalha, é o homem capaz de vencer a si mesmo”, afirmou um sábio. Quem
lidera a si sabe liderar os outros.
O trabalhador
eficaz distribui tarefas a seus colegas, confiando no crescimento deles. A prioridade
é provocar um esforço bem-intencionado em um sentido geral correto, deixando
que as pessoas ganhem experiência ao corrigir seus próprios erros e consolidar
seus acertos.
Depois de apontar
o rumo ao grupo de ação, o líder passa a interferir no processo do esforço na
proporção necessária para evitar erros graves.
Cabe fazer com que
cresça o melhor em cada um. Delegar é estimular uma independência solidária e
ações autônomas. Isso é possível quando há uma forte confiança recíproca e um
clima psicológico saudável. Não cabe ficar marcando passo no mesmo lugar. Ao
transferir conhecimentos e responsabilidades a seus colegas, o coordenador de
um esforço coletivo obtém uma oportunidade para aproveitar novos espaços e
abrir frentes de trabalho mais amplas para si mesmo e para o grupo inteiro. Por
isso ele deve ter liberdade suficiente, em sua agenda, para poder olhar
adiante, buscar o novo, dialogar com o desconhecido, renovar e inovar.
10)Sintonizar com a Vitória
Há um elemento
crucial no êxito de uma equipe que permanece subconsciente em grande parte dos
casos. Trata-se de saber até que ponto
nos permitimos ser felizes. Estamos disponíveis para o pleno êxito, ou algum
processo de autolimitação psicológica nos proíbe de obter vitórias?
Diante de um
grande sofrimento, uma criança explica a situação imaginando que se trata de
uma punição por algo de errado que fez. Assim, para cada dor surge uma culpa
imaginária. Muita gente se acostuma com
a infelicidade e adota a ideia de que certas vitórias são impossíveis. Surge então
um apego ao sofrimento. A derrota conhecida passa a ser subconscientemente mais
desejável que uma vitória ainda nunca vista.
Esse sentimento
negativo cria uma autolimitação instintiva e automática cada vez que surgem
possibilidades de uma vitória, seja ela pessoal ou coletiva. O círculo vicioso da dor é um inimigo de
todo pioneiro. Para conquistar eficiência em nossas ações, é preciso libertar-nos
da herança inconsciente de sofrimento do passado e reprogramar-nos para o bem,
para o progresso e para a vitória. A libertação reorientadora ocorre com mais
força quando praticamos o desapego e fortalecemos o contato consciente com o
centro de paz em nosso coração.
A vitória
duradoura surge do eu superior. O incentivo solidário dos amigos e colegas é um
elemento decisivo. Um grupo humano em que predomina a boa vontade reeduca a
todos no sentido de dissolver as causas do sofrimento e despertar a luz da
intuição divina. Assim se amplia a capacidade de construir o novo e de
sintonizar com uma felicidade que é incondicional e transcende toda circunstância
externa. Ao longo deste processo, a expansão da inteligência espiritual pode
ser gradativa, mas não tem limites.
NOTA:
[1]
Veja o artigo “A Sala de Espelhos”,
de Carlos Cardoso Aveline. O artigo está disponível em nossos websites associados.
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Uma versão inicial do artigo acima foi
publicada em outubro de 2002 na revista “Planeta”, de São Paulo.
Leia, do mesmo autor, os textos “Quatro Ideias Para Um Poder Solidário”,
“Um Por Todos e Todos Por Um”, “Um Segredo do Trabalho Teosófico”, “A Prática do Estudo Teosófico”, “A Magia da Ajuda Mútua”, “Três Frentes de Ação”, “A Tarefa à Nossa Frente” e “A Sala de Espelhos”.
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Sobre o mistério do despertar individual
para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.

Com tradução, prólogo e notas de Carlos
Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014
por “The Aquarian Theosophist”.
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