18 de julho de 2017

A Agricultura do Espírito

Teosofia Ensina a Plantar
Ideias Novas em Lugares Limpos

Joana Maria Ferreira de Pinho




A vida simples que muitos ouvem seus pais e avós descreverem enquanto partilham momentos de família parece, por vezes, estar distante do tempo atual.

Porém poucas gerações nos separam da época em que a vida, apesar de apresentar dificuldades, tinha um ritmo humano e natural. A Terra e os mais velhos eram respeitados. O trabalho trazia valor. A disciplina era uma aliada da educação e do progresso.

Os indivíduos estavam mais próximos do ciclo solar e orientavam suas vidas não só pelo mapa da Terra, mas também pelo mapa do céu. As pessoas viviam o tempo, e o tempo não corria à sua frente como parece ocorrer atualmente em grande número de casos.

Hoje vive-se ao ritmo das máquinas, e a ditadura consumista está presente um pouco por todo o mundo. Produz-se e consome-se a um ritmo demasiado rápido. Este é o tempo dos bens e das relações descartáveis.

Apesar de existirem homens e mulheres que moldam sua personalidade conforme os acontecimentos externos, um número expressivo de indivíduos faz da verdade uma força que comanda suas vidas.

Carlos escreveu:

“O nosso dever é construir solidariamente uma cultura em que a sinceridade possa ser tolerada.”[1]

Uma vida simples abre espaço para que essa construção se expanda. A calma é fonte de entendimento e de comunhão com a verdade. À medida que avançamos no cultivo da tranquilidade, o autocontrole, o autoconhecimento e o autorrespeito amadurecem como frutos do esforço.

A mãe Terra alimenta nossos corpos físicos e dá-nos abrigo. Tudo o que precisamos no nível físico da existência é produzido por ela em conjunto com a vasta comunidade de seres minerais, vegetais, animais e humanos que a habitam. Os astros e as inteligências divinas auxiliam o processo de plantio e colheita. Assim como a Terra é um imenso ecossistema composto de diversos e pequenos ecossistemas, podemos vê-la como parte de um ecossistema ainda maior, o ecossistema universal.

O planeta alberga uma humanidade complexa e cada vez mais numerosa. Há muito que se estuda a capacidade de a Terra gerar alimento e recursos suficientes para satisfazer toda população. É hora de os indivíduos de boa vontade fortalecerem o altruísmo. Concentrando mente e coração naquilo que é correto, criamos soluções para os desafios presentes. 

A generosidade rege a existência. Enquanto o ser humano respeitar o planeta e a Vida, enquanto ele se guiar pela simplicidade, pela partilha e ajuda mútua, não faltará aos indivíduos o que eles necessitam para viver dignamente.

O problema não está na Terra, assim como o mal não está no Universo, mas surge do egoísmo. Um Mahatma escreveu:

“O verdadeiro mal surge da inteligência humana e sua origem está inteiramente no homem que raciocina e que se dissocia da Natureza. Só a humanidade, portanto, é a verdadeira fonte do mal. O mal é o exagero do bem, produto do egoísmo e da ganância humanos.” [2]

As sociedades estão muito focadas no crescimento econômico e material e pouco concentradas no desenvolvimento espiritual dos indivíduos. Isso é visível na dinâmica familiar de grande parte das famílias. Nada de material pode faltar às crianças. Dá-se tudo e mais alguma coisa, como se a felicidade das crianças dependesse do consumo de bens. Com isso os adultos tentam que os objetos façam o papel que eles próprios devem cumprir: acompanhar as crianças, e estimular nelas o melhor.

Precisamos educar e ser educados acima de tudo para a vida, e isso significa aprender e participar da agricultura do espírito. “Não só de pão vive o homem” (Mt 4: 4). É necessário despertar para a vida interior e para as necessidades espirituais do ser humano.

Farias Brito explica:

“…O conhecimento está para o espírito, como a nutrição para o corpo. (…) Há, pois, um pão do corpo e um pão espiritual. (…) Devemos trabalhar pelo conhecimento, pois é pelo conhecimento que o espírito se conserva e desenvolve.” [3]

O conhecimento sobre o qual Brito escreve é o saber alcançado pelo amor à verdade. O ser humano cresce em sabedoria caminhando com ética pela Terra ao mesmo tempo que eleva a consciência até o infinito. Para que a alma se expanda, precisamos nutri-la. O alimento para o corpo é produzido na Terra, enquanto o alimento da alma se cultiva no Céu, símbolo do eu superior.

As almas infantis esperam que alguém as alimente, já as almas maduras plantam e colhem seu próprio alimento.

“Luz no Caminho” ensina:

“O homem que quiser viver e agir na vida superior não pode ser alimentado com uma colher, como um bebê. Deve alimentar-se por si mesmo.” [4]

Mais do que alimentar a si mesmos, os agricultores do espírito alimentam o mundo, seguindo o conselho dado em “Luz no Caminho”:

“Não desejes plantar sementes para a tua própria colheita; deseja apenas plantar para que surjam frutos que alimentem o mundo. Tu és parte do mundo; ao alimentares o mundo, tu te alimentas.”[5]

O cultivo do espírito dá-se no território do autoesquecimento e da impessoalidade.

Os estudantes de teosofia que se esforçam por vivenciar os ensinamentos são alquimistas da natureza humana e agricultores do espírito. Os Mestres de Sabedoria dão indicações preciosas sobre o tema, entre as quais destaco as seguintes:

* “Ideias novas têm de ser plantadas em lugares limpos (….).” [6]

* “…O dever do teosofista é como o do agricultor; abrir os sulcos e semear os seus grãos da melhor maneira possível: o resto é com a natureza, e ela é a escrava da Lei”. [7]

* “Semeie grãos saudáveis e escolha seu solo, e o futuro o recompensará com colheitas inesperadas. Tenha fé, meu Irmão, e quando menos esperar seus olhos podem abrir-se para uma visão tão gloriosa que deslumbraria qualquer mortal comum.” [8]

* “Você criou felicidade, e felicidade será criada para você. A semente crescerá e florescerá e, sob a sombra benéfica do arbusto celeste plantado por suas próprias mãos, você mesmo sentará um dia (…).” [9]

* “…Doces serão os frutos da planta celeste da Compaixão e da Caridade.” [10]

* “…Um grão produzirá uma enorme quantidade na hora da colheita.” [11]

Sabemos das vantagens da agricultura biológica. Frutas e verduras livres de pesticidas químicos são fonte de saúde. Também na agricultura do espírito deve ser deixado de lado o uso de qualquer tipo de veneno, como a vaidade, a inveja, entre outros.

No cultivo que respeita a vida, as pragas agrícolas são combatidas usando métodos naturais e que preservam o meio ambiente. Assim, para se combater a ignorância deve ser usado o conhecimento, e ao orgulho pode-se aplicar a humildade.

Na ausência de atenção, a erva daninha do egoísmo pode invadir  até as plantações mais produtivas. Devemos arrancar essa erva pela raiz, com cuidado para que não caiam sementes na terra. “Luz no Caminho” ensina:

“Não vivas no presente nem no futuro, mas no eterno. Esta erva daninha gigantesca [do egoísmo] não pode florescer lá; a sua mancha na existência é eliminada pela atmosfera do pensamento eterno.” [12]

Há muito por pesquisar sobre a sabedoria milenar do cultivo da virtude. A vida de cada estudante é um laboratório alquímico. Sua existência, quando vivida como um terreno fértil de gratidão e de compromisso com o eu superior, gera a experiência necessária para que se cultive com responsabilidade o altruísmo.

Não vale a pena deixar para amanhã o que pode ser feito hoje. Plantar o bem hoje e sempre é fonte de paz. O plantio da sabedoria traz a vitória da Luz. 

NOTAS:

[1] Do texto “As Palavras Verdadeiras”, de Carlos Cardoso Aveline, que está disponível em nossos websites associados.

[2] Palavras de um Mahatma citadas no texto “A Vida Toda é Bela”, de Carlos Cardoso Aveline. Publicado em nossos websites.

[3] “Ensaio Sobre o Conhecimento”, texto de Farias Brito, p. 16. Veja em nossos websites.

[4] “Luz no Caminho”, de M.C.; tradução, notas e prólogo de Carlos Cardoso Aveline, The Aquarian Theosophist, 2014, 85 pp., p. 40.

[5] “Luz no Caminho”, de M.C., The Aquarian,  p. 83.

[6] “Cartas dos Mahatmas”, Ed. Teosófica, Brasília,  vol. I, Carta 12, p. 87.

[7] “Cartas dos Mahatmas”, vol. II, Carta 111, pp. 206-207.

[8] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, Ed. Teosófica, Brasília, segunda série, Carta 10, p. 181.

[9] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, Ed. Teosófica, Brasília, segunda série, Carta 7, p. 175.

[10] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, Ed. Teosófica, Brasília,  segunda série, Carta 14, p. 186.

[11] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, Ed. Teosófica, Brasília, segunda série, Carta 11, p. 183.

[12] “Luz no Caminho”, de M.C., The Aquarian Theosophist, p. 21.


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O texto acima está disponível nos websites da Loja Independente de Teosofistas desde 18 de julho de 2017.

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