21 de abril de 2025

Páscoa - do Autossacrifício ao Despertar

 
A História de Jesus Narra a
História de Todas as Grandes Almas
 
Joana Maria Ferreira de Pinho
 



A Páscoa corresponde à ressurreição de Cristo e é uma das celebrações mais importantes do cristianismo. Ela representa a vitória da vida sobre a morte, e algo que alguns tendem a esquecer: que a bênção é fruto do autossacrifício.

A Páscoa está repleta de símbolos - alguns religiosos, outros herdados de tradições populares e pagãs. Todos, de alguma forma, estão ligados às ideias de renovação, fertilidade e recomeço, como podemos ver no texto “A Páscoa Como Renascimento Interior” [1].

Nesse artigo de Carlos lemos que “as principais datas do calendário cristão são adaptações de festividades não-cristãs dedicadas à celebração do Sol e dos ciclos naturais.” A Páscoa não é exceção:

“[Ela] é comemorada perto do equinócio da primavera, no hemisfério norte, e do equinócio do outono, no hemisfério sul. Nesta época do ano, a noite e o dia têm a mesma duração. A partir da época da Páscoa, o equilíbrio entre a luz e a sombra é rompido a favor da luz solar, no hemisfério norte. Por isso, tradicionalmente, a Páscoa é vista como o anúncio de um novo começo e como algo que abre espaço para o ressurgimento da vida em todas as dimensões da natureza.”

Em outro texto é feita uma associação entre o ciclo anual da distribuição da energia solar e as grandes iniciações, ou seja, os estágios superiores do caminho espiritual.

Temos em “A Magia do Final de Ano”:

“…A ‘ressurreição de Cristo’ é, na verdade, o despertar já no reino divino do grande adepto, mahatma, rishi ou sábio, que teve sua condição humana ‘crucificada’, isto é, se libertou da roda do renascimento obrigatório. (…) A quinta iniciação, aseka, corresponde à ressurreição. O adepto, o mahatma, o rishi, o Imortal - simbolizado por Jesus no Novo Testamento - ressurge em um reino superior ao humano e está livre do sofrimento tal como o conhecemos, mas ainda permanecerá guiando a humanidade no caminho da sabedoria.” [2]

O Cristo na Cruz e o Christos Cósmico

O termo específico Christos, para a Teosofia, representa o princípio divino mais elevado do ser humano. Embora Jesus Cristo represente em geral o sexto princípio, o princípio do absoluto altruísmo, há um outro aspecto de Cristo como instância cósmica; e este nível superior da consciência crística corresponde ao sétimo princípio da consciência, Atma.

Em “A Doutrina Secreta”, Helena Blavatsky compara “Christos” ao sétimo princípio - Atma.[3] Assim, a Páscoa simboliza tanto o sacrifício - no sexto princípio, Buddhi - como a ressurreição, no sétimo princípio, Atma. Trata-se de uma grande iniciação. É a vitória de Atma (Sol) e de Buddhi (Luz), unidos. É a derrota do egoísmo e do sentimento de separatividade. Carlos explica que a dialética entre Atma e Buddhi também está simbolizada pela cooperação entre Jesus e o seu Pai do Céu.

Após o período de sacrifício, simbolizado no hemisfério norte pelas perdas e renúncias do inverno, a Páscoa marca a passagem para uma nova fase: a expansão da consciência.

Durante o inverno, plantamos as sementes do desapego, da paciência, da humildade e da introspeção. Essas virtudes preparam a alma para a renovação. A Páscoa, então, é o renascimento e o florescimento dessas sementes, que começam a brotar com a manifestação da luz crescente.

Jesus Cristo sacrificou-se para salvar a humanidade. Essa é a história de todas as grandes almas. Esses seres abdicam de si mesmos para ajudar a libertar a humanidade da ignorância e do sofrimento desnecessário. No entanto, essa não é uma escolha que as almas fazem de um dia para o outro. Ela resulta da vivência acumulada durante várias encarnações. Ao longo de várias vidas, essas almas vão dedicando a sua existência à verdade. E a vida de Jesus, tal como narrada no Novo Testamento, resume a peregrinação de uma alma comprometida com a verdade e com a vida.

Não há outro caminho.

Todo aquele que se queira unir ao “pai do céu”, isto é a Atma, à alma universal, segue o caminho do autossacrifício, o qual engloba o autoconhecimento, o autoaperfeiçoamento e corresponde a uma vida dedicada ao altruísmo.

Como sabemos, as comemorações cristãs estão relacionadas com cultos pagãos. O Sol tem uma relação direta com os principais acontecimentos da vida de Jesus dos Evangelhos. Assim, por exemplo, os cristãos celebram o Natal logo após o solstício do inverno, no hemisfério norte. O nascimento de Jesus simboliza o nascimento da luz. E a Páscoa ocorre após o equinócio da primavera, quando os dias começam a ficar mais longos do que as noites e a vida desperta para um grande e novo ciclo de manifestação.

A Teosofia dos Ovos de Páscoa

Nas celebrações populares da Páscoa os ovos estão muito presentes. Sejam usados em jogos, em doçaria tradicional ou como elementos decorativos, não podem faltar ovos na Páscoa. As famílias e as escolas em Portugal tinham o costume de pintar ovos como forma de celebração. As crianças adoravam esta atividade. Nasciam verdadeiras obras de arte.

Em “A Páscoa Como Renascimento Interior” lemos que “os ovos de Páscoa são herança dos festivais pagãos da primavera do hemisfério norte.  Eles simbolizam o renascimento da vida em toda sua variedade.”

Em “A Doutrina Secreta” temos muitas passagens sobre o “Ovo”.

Partilho aqui algumas delas:

* “O ovo virgem é num sentido abstrato a condição-de-ovo, ou o poder de desenvolver-se através da fecundação, e é portanto eterno e sempre igual. E assim como a fecundação de um ovo ocorre antes de ele ser posto, também o germe periódico e não-eterno, que se transforma mais tarde no simbolismo do ovo do mundo, contém em si, quando emerge, ‘a promessa e a potência’ de todo o Universo. Embora a ideia em si mesma seja, naturalmente, uma abstração, uma expressão simbólica, ela é um símbolo real porque sugere a noção da infinitude como um círculo infinito. Ela traz para a visão mental a imagem do Cosmo emergindo do espaço ilimitado, no espaço ilimitado; um Universo que é tão destituído de fronteiras em seu tamanho como na sua manifestação objetiva.” (p. 99, Parte I, do Volume I)

* “A imagem de um ovo também expressa o fato, ensinado em Ocultismo, de que a forma primordial de tudo o que é manifestado, desde um átomo a um globo, desde um ser humano até um anjo, é esferoidal. Em todas as nações, a esfera tem sido o símbolo da eternidade e da infinitude - uma serpente engolindo sua própria cauda. Para compreender o seu significado, no entanto, deve-se pensar a esfera como se ela fosse vista desde o seu centro. O campo de visão ou de pensamento é como uma esfera. Os seus raios saem do nosso ser em todas as direções e vão até o espaço exterior, abrindo visões ilimitadas ao nosso redor. Ela é o círculo simbólico de Pascal e dos Cabalistas, ‘cujo centro está em toda parte, e cuja circunferência não está em parte alguma’, uma noção que faz parte desta imagem.” (pp. 99-100, Parte I, do Volume I)

* “O ‘Ovo do Mundo’ talvez seja um dos símbolos mais adotados universalmente, e é altamente sugestivo, tanto no sentido espiritual como no sentido fisiológico e cosmológico. Ele é encontrado, portanto, em todas as teogonias universais, e é amplamente associado ao símbolo da serpente. Esta última é em toda parte, em filosofia como em simbolismo religioso, um emblema da eternidade, da infinitude, da regeneração e do rejuvenescimento, assim como da sabedoria. (…) O mistério da aparente autogeração e da evolução a partir do seu próprio poder criador repete, no ovo, em miniatura, o processo da evolução cósmica.” (p. 100, Parte I, do Volume I)

* “O ovo foi incluído como símbolo sagrado na cosmogonia de todos os povos da Terra, e era reverenciado tanto por causa da sua forma como devido ao seu mistério interno. Desde as primeiras concepções mentais do ser humano, ele era visto como aquilo que representa do modo mais eficiente a origem e o segredo da existência. O desenvolvimento gradual do germe imperceptível dentro da casca fechada; o trabalho interior, aparentemente sem qualquer interferência de forças externas, que, desde um nada latente, produziu um ativo algo, que não necessita de coisa alguma exceto calor; e que, tendo gradualmente evoluído até ser uma criatura concreta, viva, quebra a sua casca, aparecendo aos sentidos externos de todos como um ser autogerado e autocriado, - este deve ter sido desde o início um milagre notável.” (p. 377, Parte II, do Volume I)

* “Os cristãos - especialmente das igrejas grega e romana - adotaram completamente o símbolo, e veem nele uma comemoração da vida eterna, da salvação e da ressurreição. Isso é corroborado pelo antigo costume de trocar ‘Ovos da Páscoa’.” (p. 386, Parte II, do Volume I)

Percebemos que o ovo, presente nas tradições populares da Páscoa, carrega um simbolismo que vai muito além do recreativo ou decorativo. Permanece no subconsciente de todos o significado desse símbolo e as associações feitas a ele.

Na perspectiva esotérica, como ensinado por Helena Blavatsky em “A Doutrina Secreta”, o ovo representa o mistério da criação, o potencial criativo que se manifesta a partir do invisível. Símbolo da origem do cosmos, da alma e da vida, o ovo pode ser encontrado em todas as grandes cosmogonias antigas.

O ovo contém em si a promessa de uma nova existência. Assim, ao pintar, ao oferecer ou contemplar ovos na Páscoa, mesmo que subconscientemente, participamos de um ritual ancestral que celebra o renascimento, não apenas da natureza, mas da própria alma humana, em seu caminho rumo ao despertar espiritual.

E o que tem o ovo a ver com o que representa a ressurreição?

Um Estado de Unidade com o Absoluto

O ovo é símbolo do eterno e do universal. A ressurreição, como vimos anteriormente, corresponde a uma etapa avançada do caminho, na qual o peregrino ressurge em um reino superior ao humano. Os Mahatmas dizem em uma das suas cartas que a ressurreição corresponde ao Nirvana [4]. O Nirvana, segundo os próprios Mestres, é um estado de unidade com o Absoluto.

O trabalho interior, do qual Helena Blavatsky fala, que ocorre dentro do ovo e aparentemente sem qualquer interferência de forças externas, aparecendo como um ser autogerado e autocriado (p. 377, Parte II, do Volume I), representa de certa forma a longa jornada da alma humana, o trabalho de todo o aprendiz de sabedoria eterna.

A Páscoa, mais do que uma celebração religiosa, é um evento interno de renascimento, onde o verdadeiro “milagre” acontece quando conseguimos romper as limitações do eu inferior e entrar em contato com a nossa natureza espiritual profunda.

Nesta época do ano, o calendário convida-nos a refletir sobre a peregrinação interior.

Lembra-nos também que a bênção implica desafios e sacrifícios. A Páscoa, portanto, pode ser celebrada todos os dias do ano, quando a meta é servir a Vida e melhorar a nós mesmos.

NOTAS:

[1]A Páscoa Como Renascimento Interior”, texto de Carlos.

[2]A Magia do Final de Ano”, artigo de Carlos.

[3] “The Secret Doctrine”, vol. II, nota de rodapé, p. 231.

[4] “Cartas dos Mahatmas”, Vol. II, Ed. Teosófica, Brasília, Apêndice I de LBS, p. 372.

000

O artigo “Páscoa - do Autossacrifício ao Despertar” foi publicado dia 21 de abril de 2025 nos websites da Loja Independente de Teosofistas.

000

Leia mais:








* Examine a seção temática “Cristianismo e Teosofia”.  

000 



Helena Blavatsky (foto) escreveu estas palavras: “Antes de desejar, faça por merecer”.

000