É Preciso Viver no Plano Celeste e, ao MesmoTempo, Educar a Si Mesmo em Cada Detalhe
Helena P. Blavatsky
É Preciso Viver no Plano Celeste e, ao Mesmo
Tempo, Educar a Si Mesmo em Cada Detalhe
A Hidra de sete cabeças,
da mitologia grega, é um símbolo do egoísmo, ou seja, da
ignorância espiritual. Ela tem que ser derrotada por Hércules, o candidato à Iniciação.
ignorância espiritual. Ela tem que ser derrotada por Hércules, o candidato à Iniciação.
0000000000000000000000000000000000000000000000000
Nota de 2023:
Se fosse convidado a escolher os dez artigos que considero
mais importantes entre os que foram escritos por Helena P.
Blavatsky, seguramente O Grande Paradoxo estaria na lista.
(Carlos Cardoso Aveline)
000000000000000000000000000000000000000000000000000
O paradoxo parece ser a linguagem natural do Ocultismo. Mais do que isso, ele
parece penetrar profundamente no coração das coisas, e assim parece ser
inseparável de qualquer tentativa de colocar em palavras a verdade, a realidade
que está na base das aparências externas da vida.
E o paradoxo acontece não somente nas palavras, mas na
ação, na própria conduta da vida. Os paradoxos do ocultismo devem ser vividos,
não falados apenas. Aqui reside um grande perigo, porque é muito fácil
perder-se na contemplação intelectual do caminho, e assim esquecer-se de que a
estrada só pode ser conhecida quando se caminha por ela.
Um paradoxo assustador se apresenta ao estudante já no
início e o confronta assumindo novas e estranhas formas em cada curva do
caminho. Talvez esse estudante tenha procurado o caminho desejando uma
orientação, uma regra sobre o que é certo para a conduta em sua vida.
Ele aprende que o alfa e o ômega, o começo e o final da vida
é altruísmo; e ele sente a verdade da afirmação de que somente na profunda
inconsciência do autoesquecimento a verdade e a realidade do ser podem
revelar-se ao seu coração sedento.
O estudante aprende que esta é a lei única do ocultismo,
ao mesmo tempo a ciência e a arte do viver, o guia para a meta que ele deseja
alcançar. Ele está cheio de entusiasmo e entra bravamente na trilha da
montanha. Então ele descobre que seus instrutores não encorajam seus voos ardentes
de sentimento, seu anseio pelo Infinito que o faz esquecer de tudo - no plano
externo e factual de sua vida e sua consciência. Pelo menos, se não eliminam seu
entusiasmo, eles lhe apontam, como primeira e indispensável tarefa, vencer
e controlar seu corpo. O estudante descobre que, longe de ser
encorajado a viver nos pensamentos sublimes de seu cérebro e fantasiar que
alcançou o éter onde está a verdadeira liberdade - com o esquecimento de seu
corpo, suas ações exteriores e sua personalidade - a ele são atribuídas tarefas
muito mais terrenas. Toda a sua atenção e vigilância são requeridas no plano
exterior; ele não deve nunca se esquecer de si mesmo, nunca descuidar de seu
corpo, sua mente, seu cérebro. Ele deve aprender a controlar a expressão de
cada detalhe, verificar a ação de cada músculo, dominar o mais leve movimento
involuntário. A vida diária à sua volta e dentro dele mesmo é assinalada como
objeto do seu estudo e da sua observação. Em vez de esquecer o que geralmente é
chamado de banalidades, pequenos descuidos e erros acidentais da língua e da
memória, ele é forçado a tornar-se, a cada dia, mais consciente desses lapsos
até que, finalmente, eles parecem envenenar o ar que ele respira e sufocá-lo; até
que ele parece perder a visão, e o contato, com o grande mundo de liberdade
pelo qual está lutando; até que cada hora e cada dia parecem cheios do amargo sabor
do eu, e seu coração sente-se doente com a dor e a luta do desespero. E a
escuridão fica ainda mais profunda porque a voz interior grita incessantemente:
“Esqueça de si mesmo. Cuidado, do contrário você se torna autocentrado - e a erva gigante do egoísmo espiritual
firmemente se enraizará em seu coração; cuidado, cuidado, cuidado!”
A voz leva seu coração até suas profundezas, porque ele
sente que as palavras são verdadeiras. Sua batalha diária e contínua o ensina
que estar autocentrado é a fonte do sofrimento, a causa da dor, e sua alma está
cheia de desejo de liberdade.
Assim, o discípulo é tomado pela dúvida. Ele confia em
seus instrutores, porque sabe que através deles fala a mesma voz que ele ouve
em seu coração. Mas agora eles dizem palavras contraditórias; a voz interna, a
única, recomenda esquecer de si mesmo totalmente, em prol da humanidade; a
outra, a palavra falada por aqueles de quem ele busca orientação, recomenda primeiro
dominar seu corpo, seu eu exterior. E a cada hora ele vê mais claramente como é
difícil aquela batalha com a Hidra, e vê sete cabeças crescerem novamente no
lugar de cada uma que ele decepou.
No começo ele oscila entre as duas coisas, ora obedecendo
a uma, ora obedecendo à outra. Mas logo ele aprende que isso é infrutífero.
Porque o sentido de liberdade e leveza que no princípio vem quando ele deixa seu
eu externo sem vigilância para que possa procurar internamente ar puro, logo
perde sua intensidade e um choque repentino lhe revela que ele escorregou, e
caiu, no caminho que vai montanha acima. Então, em desespero, ele se lança
sobre a traiçoeira serpente do eu e luta para sufocá-la até a morte; mas seus anéis
espiralados, sempre fugidios, evitam suas mãos; as tentações insidiosas de suas
escamas brilhantes cegam sua visão e, novamente, ele se envolve no turbilhão da
batalha que o vence dia a dia e que, finalmente, parece preencher o mundo
inteiro e apaga tudo o mais, exceto sua consciência.
Ele está cara a cara com um paradoxo esmagador, cuja
solução deve ser vivida antes que possa ser realmente entendida.
Em suas horas de meditação silenciosa, o estudante
descobrirá que há um espaço de silêncio dentro de si, em que ele pode se
refugiar dos pensamentos e desejos, do turbilhão dos sentidos, e das ilusões da
mente. Mergulhando sua consciência profundamente em seu coração, ele pode
alcançar este lugar - a princípio, somente quando ele está sozinho em silêncio
e na escuridão. Mas quando a necessidade de silêncio cresce, ele o procurará
mesmo no meio da batalha com o eu, e o encontrará. Ele apenas não deve
abandonar seu eu exterior nem seu corpo. Deve aprender a retirar-se em sua cidadela
quando a batalha se torna árdua; mas precisa fazê-lo sem perder de vista a
batalha; sem se permitir fantasiar que assim ele vencerá. Essa vitória só se conquista
quando tudo é silêncio fora e dentro da cidadela interior. Lutando desse modo, de
dentro do silêncio, o estudante descobrirá que resolveu o primeiro grande
paradoxo.
Mas o paradoxo ainda o segue. Quando ele consegue
retirar-se para dentro de si mesmo, ele busca lá apenas refugiar-se da
tempestade em seu coração. E quanto mais ele luta para controlar as ondas de
paixão e desejo, mais ele compreende que gigantescos poderes ele jurou vencer. Ele
ainda se sente, quando não está em silêncio, muito parecido com as forças da
tempestade. Como sua força insignificante pode competir com esses tiranos de
natureza animal?
Esta pergunta é difícil de responder em palavras diretas -
caso haja uma resposta para ela. Mas a analogia pode apontar o caminho onde a
solução será procurada.
Ao respirar, colocamos uma certa quantidade de ar nos
pulmões e, com isto, podemos imitar em pequena escala o poderoso vento do céu.
Podemos produzir uma fraca imagem da natureza: uma tempestade em copo d’água,
uma brisa para soprar ou mesmo afundar um barco de papel. E podemos dizer: “Eu
faço isso, isso é minha respiração”. Mas não podemos soprar nossa respiração
contra um furacão, menos ainda prender o vento em nossos pulmões. No entanto,
os poderes do céu estão dentro de nós; a natureza das inteligências que guiam a
força do mundo está unida à nossa
natureza, e se entendermos isso e nos esquecermos de nosso eu exterior, esses
ventos poderão ser nossos instrumentos.
Assim é na vida. Enquanto o homem apegar-se ao seu eu
exterior - e apegar-se a cada forma que ele assume quando sua “pele mortal” é
deixada de lado - ele estará tentando afastar um furacão com o sopro de seus
pulmões. Tal esforço é inútil e vão; porque os grandes ventos da vida, cedo ou
tarde, o dominarão. Mas se ele mudar sua altitude [1] dentro de si mesmo, se ele agir sabendo que seu corpo, seus
desejos, suas paixões e seu cérebro não são ele mesmo - embora ele esteja a
cargo deles e seja responsável por eles -; se tentar lidar com eles como partes
da natureza, então poderá ter a esperança de tornar-se uno com as grandes marés
do ser, e de alcançar, finalmente, o
lugar pacífico do autoesquecimento.
NOTA:
[1] “Mudar sua altitude”, ou seja, elevar-se. (CCA)
000
O texto acima está disponível nos websites da Loja Independente de Teosofistas desde 04 de dezembro de 2011. Foi publicado pela primeira vez em 1887. É aqui traduzido de “Collected Writings” de H.P. Blavatsky, TPH, India/USA, volume VIII, pp. 125-129. Título original: “The Great Paradox”. Tradução: CCA.
000
Leia mais sobre a educação da vontade:
000

Helena Blavatsky (foto) escreveu estas palavras: “Antes de desejar, faça por merecer”.
000