Uma Prática Diária Dos Que Buscam a
Sabedoria
Carlos Cardoso Aveline
Segundo
a tradição esotérica, as palavras mais importantes não estão escritas em papel.
Elas não estão online, e não podem ser encontradas na memória eletrônica de um
computador.
O
sábio grego Platão escreveu que as melhores palavras são registradas na
alma.
Em
seu diálogo “Fedro” [276], ele aborda o nível de consciência em que a verdade
pode ser realmente compreendida. E
Platão descreve deste modo um diálogo entre Sócrates e Fedro:
“Sócrates
- Eu me refiro a uma palavra inteligente, gravada na alma do aprendiz, uma
palavra que pode defender a si mesma e que sabe quando falar e quando
permanecer em silêncio.”
“Fedro
- Você se refere à palavra viva do conhecimento que possui uma alma, e da qual a palavra escrita é apenas
uma imagem?”
“Sócrates
- Sim, é a ela que me refiro.”
Séculos
depois de Platão, Lúcio Sêneca, o filósofo do mundo romano, escreveu:
“O
estudante tem de dedicar-se a alguns autores escolhidos, alimentar-se da sua
substância, para que alguma coisa fique gravada na alma.” [1]
A
mesma ideia ocorre no Velho Testamento, onde Ezequiel, 3:10, recomenda:
“Guarda
no coração todas as palavras que te hei de falar, e ouve-as com os teus ouvidos.”
E
no Novo Testamento vemos estas palavras de Paulo em 2 Coríntios, 3:
“Porque
já é claro que vocês são a carta de Cristo (....) escrita não com tinta, mas
com o Espírito (....) vivo; não em tábuas de pedra, mas nas tábuas de carne do
coração.”
Platão,
Sêneca, Ezequiel e Paulo não estão sozinhos ao falar de ensinamentos que são registrados
na alma do aprendiz. De algum modo, a memória humana pode conter uma estante de
livros. Desde a antiguidade, os estudantes orientais e ocidentais de filosofia
costumam criar uma espécie de “biblioteca portátil” em suas mentes e a levam
consigo onde quer que estejam nas 24 horas do dia. A força maior ou menor desta
biblioteca depende do grau de compromisso do estudante com a sabedoria, e com a
vitória da sua própria alma.
A
prática milenar da memorização de livros e ensinamentos é cada vez mais
necessária no século 21. Graças a ela, em qualquer momento de pausa o estudante
atento impede que sua mente fique ociosa. Durante a espera em uma fila de
banco, quando o sinal está vermelho no trânsito, em um engarrafamento ou na
fila do caixa do supermercado, o buscador da verdade chama a si, para reler,
algumas das ideias principais que estão escritas na sua alma. Ele as repassa,
as recita mentalmente, e as observa. Ele as emite repetidamente no plano da
mente, como um mantra, e o mantra o protege e o fortalece, enquanto atrai bom
carma.
O
estudante também pode redigir em sua mente ideias adequadas para os desafios
de cada momento. Deste modo, mantém sua
mente concentrada e assume uma responsabilidade crescente sobre tudo o que passa
por sua consciência, e tudo o que lhe acontece.
Ele
já não precisa agarrar fisicamente um livro, ou visitar nossos websites associados, para “ler” sobre teosofia. Ele memoriza as frases e ideias que considera
fundamentais para o momento atual do seu esforço e reflete demoradamente sobre
elas, percebendo a força de autodeterminação que emerge deste fato.
Ele
percebe novas nuances nas mesmas ideias fundamentais. Ao longo do dia, ele cria
oportunidades para voltar a estes princípios inspiradores, esvaziando sua mente
de assuntos mundanos. A prática tem efeitos positivos sobre a qualidade do seu
sono e de seus sonhos, sobre seus relacionamentos pessoais e sua eficiência no
trabalho. Com o despertar da vontade espiritual, sua mente fica clara e suas
emoções se purificam. Ele vivencia então diretamente o fato de que felicidade
interior é algo que se planta, muito antes de colher.
NOTA:
[1]
“Conversas na Biblioteca, um diálogo de 25 séculos”, Carlos Cardoso Aveline,
Ed. Edifurb, Blumenau, SC, 170 pp., 2007, ver pp. 30-31.
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Uma
versão inicial do texto acima foi publicada no boletim “O Teosofista”, em
agosto
de 2008, sem indicação de nome de autor. Título original: “Estudante Pode
Criar Biblioteca Portátil”.
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Sobre o mistério do despertar individual
para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
Com tradução, prólogo e notas de Carlos
Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014
por “The Aquarian Theosophist”.
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