A Harmonia é a Lei do Universo e
Desmantela Cada Forma de Amargura
Carlos Cardoso Aveline
*
O espaço
rodeia os objetos. O silêncio contém o som, e a eternidade envolve todas as contagens
de tempo.
*
Os dias que fecham um mês ou completam um ano são oportunidades para revisar e
completar tarefas. Cabe reexaminar a agenda e desistir de ações desnecessárias.
A paz interior é importante: um ciclo deve terminar bem, para que o próximo
ciclo comece de modo correto.
*
Os mais diferentes tempos são simultâneos e convivem no momento de agora. A
Vida é uma combinação de ciclos muito diversos. Eternidades grandes e pequenas
interagem, e ciclos imensos estão presentes em cada segundo.
*
Para tornar-se capaz de existir no reino da realidade durável, o peregrino aprende
a ser nada. Antes de poder escutar a música da vida interna, é preciso deixar
de ouvir o barulho. É quando já não tem ambição alguma, que o peregrino alcança
metas valiosas. A ausência de poder no mundo o capacita para mudar a vida de
modo significativo.
*
O propósito dá significado à vida, fazendo com que possamos aprender e evoluir.
Quanto mais experiência a alma tem, mais nobre é a sua intenção. À medida que o
seu propósito se eleva, o peregrino se torna mais humilde.
*
Quem deseja alcançar um nível elevado de comunhão com outros seres, precisa
antes enfrentar a solidão. Renunciando a desejos, podemos tomar providências
para merecer aquilo que seria desejável. Quando abandonamos a ilusão de obter isso
ou aquilo, começamos a viver no território da transcendência. Silenciando,
somos capazes de escutar. Quanto mais profundo o silêncio, maior a capacidade
de ouvir o que é valioso.
*
Tanto a paz como a violência começam na mente. A fonte de harmonia não está na
negação do conflito, mas na compreensão. Quando alguém enxerga as raízes do
conflito no eu inferior, a luta com outrem se torna inútil e sem significado, e
é colocada num segundo plano. O guerreiro eficaz sabe que a paz profunda da
mente é o primeiro passo na direção da vitória.
*
A dor é com frequência um resultado da alternância entre apego e rejeição. A
paz durável transcende o movimento da gangorra infantil que oscila do prazer
para o sofrimento, do contentamento para a frustração, ou vem de volta da
tristeza para a alegria. A felicidade está em compreender a vida, e o seu
alicerce depende da percepção da unidade entre os pares de opostos.
*
Para ter acesso à melhor inspiração possível, o estudante de filosofia deve
parar de tempos em tempos toda atividade e pensar naquela que é para si a mais
elevada fonte de conhecimento espiritual.
*
Com frequência parece desimportante pensar no mais elevado. Aparentemente não
tem urgência. Não provoca fortes emoções. No entanto, essa prática é decisiva
para o carma individual e coletivo. O seu poder de cura não pode ser descrito.
Através dela, podemos nascer invisivelmente no reino espiritual.
*
Alguns indivíduos de boa vontade têm como seu dharma e dever a necessidade de
renovar o carma coletivo do qual são parte, e fazem isso apontando para
horizontes largos e possibilidades mais altas.
*
Através de fatos e palavras, os pioneiros do futuro rompem as visões de
realidade que expressam o processo médio comum das ilusões estabelecidas.
Precisam fazer isso desde uma perspectiva inteiramente nova, na qual não haja
lugar para a raiva. Porque o ódio pertence à frustração, que provoca derrota,
que resulta da ignorância. E a renovação pertence à confiança na vida, que
provoca felicidade, que resulta da sabedoria.
*
Há pelo menos um significado maior oculto em cada circunstância que nos rodeia,
e frequentemente mais de um. Por isso o velho ditado popular afirma: “Nada é
por acaso”.
*
Tudo está em unidade, sob a superfície das aparências. A interação entre todas
as coisas aumenta a responsabilidade individual e a necessidade de ser forte.
*
As circunstâncias da vida são vistas conforme a motivação que nos anima. E a
nossa motivação varia nos diferentes níveis de nossa alma, que nem sempre
conhecem perfeitamente uns aos outros. Quando decidimos tirar lições de tudo o
que acontece, as circunstâncias se tornam fontes de uma sabedoria que cura
todos os males.
* Assuntos
fúteis devem ser deixados de lado para que tomem conta de si próprios, enquanto
focamos a ação em questões de interesse permanente.
* Uma
saudável indiferença aos pequenos altos e baixos do eu inferior é necessária,
se quisermos ser capazes de prestar atenção às questões que dizem respeito à
alma espiritual.
*
O prazer faz parte da vida, assim como a dor, e requer um sentido de desapego. O
exagero na busca da satisfação pessoal produz grande quantidade de sofrimento
desnecessário. A correlação errada entre estes dois fatores estabelece o
sadomasoquismo: o prazer no sofrimento do outro, e a satisfação com o seu
próprio sofrer.
*
Quantas pessoas têm o costume de lamentar-se? Quantos fazem isso com evidente
autossatisfação? Há quem tenha grande apego ao seu próprio sofrimento. Por
outro lado, as mesmas pessoas podem ter prazer ao ver a derrota alheia. Exemplos
disso ocorrem no futebol, nas lutas político-eleitorais, e nas disputas de
poder em cada aspecto da vida. A busca de vingança é um privilégio dos que são
espiritualmente cegos. Todo exagero na busca de bem-estar pessoal distorce o
princípio do prazer e fere a lei do equilíbrio.
*
Em uma sociedade materialista, não faltam formas de decadência moral, surgidas
do exagero doentio e cego. O caráter de um ser humano
se mostra no modo como ele busca e encontra o bem-estar. A verdadeira paz está
fora do território do egocentrismo.
* Um renascimento cármico e cultural no século 21 dependerá da
criação de uma nova onda de Vida Contemplativa, nos seus aspectos individuais e
coletivos. Isso inclui as artes, a música, a literatura, a filosofia e a
psicologia. Mentes estreitas tornam a vida difícil; horizontes amplos produzem
bem-estar.
* Uma felicidade secreta está oculta em cada folha de outono e
pode ser encontrada nas águas da primavera ou do verão. Ela faz com que se mova
o vento do inverno, e à noite olha para nós desde as estrelas no céu. O
contentamento eterno atravessa todas as horas do dia e anima as quatro fases da
Lua.
* Nada que seja concreto e objetivo é nosso de fato. As coisas e
situações são dadas a nós por algum tempo, inclusive aquilo que aparentemente
nós mesmos construímos. É melhor cuidar bem daquilo que parece ser nosso, enquanto
ainda está perto de nós. Por outro lado, tudo o que aprendemos é nosso para
sempre. Recomenda-se confirmar se aprendemos de fato tais lições.
* A harmonia é a lei do universo e desmantela, não sem sofrimento,
cada forma de rancor e amargura. A felicidade movimenta o sistema solar sobre a
base da bem-aventurança e de acordo com o que é justo e adequado.
* A ética da vigilância cuida principalmente daquilo que deve ser
evitado nas ações humanas. A ética da criatividade trata das ações que devem
ser estimuladas, porque renovam a vida de modo saudável. Embora a ética da
vigilância seja de uma importância decisiva, ela está longe de ser suficiente.
Também precisamos daquele tipo de consciência moral que produz esforços belos,
que inspira a construção de melhores relações, e espalha o amor pela Vida na
sua diversidade e na sua unidade. A ética da vigilância é aquela que mantém as
nossas energias vitais longe do erro e permite que elas fluam de modo criador,
construtivo e luminoso.
000
“Ideias ao Longo do
Caminho - 28” foi publicado como artigo independente em 13 de novembro de 2019. Uma
versão inicial e anônima dele faz parte da edição de dezembro de 2016 de “O Teosofista”, pp. 15-16. Notas curtas
das pp. 5, 12 e 14, escritas pelo mesmo autor e publicadas naquela edição, estão
incluídas no texto.
Embora o título “Ideias ao Longo do
Caminho” corresponda ao título em língua inglesa “Thoughts Along the
Road”, também de Carlos C. Aveline, não há uma identidade exata entre os
conteúdos das duas coletâneas de pensamentos.
000