A Paz Interior Surge do
Conhecimento Verdadeiro
Mahatma Gandhi

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Nota Editorial:
O lema do movimento teosófico é “Não
há religião
superior à Verdade”. A ideia central da filosofia de
Mahatma Gandhi, como se vê no texto
a seguir, é a mesma.
O fato não é casual, porque Gandhi descobriu a riqueza
cultural do seu próprio país
graças ao movimento teosófico,
conforme narra no capítulo 20 na
Parte I da sua Autobiografia.
É verdade que os teosofistas não
acreditam em qualquer
tipo de deus monoteísta, enquanto
Gandhi, falando para
milhões de pessoas humildes na
primeira metade do século
20, usava a palavra “Deus”. Porém,
para Gandhi, a divindade
não é alguém que manipula
artificialmente o cosmo e os seres
humanos. Segundo ele, “Deus” é
apenas a verdade universal, e
isso é perfeitamente correto para
a filosofia esotérica autêntica.
A seguir, fragmentos do livro de
Gandhi “Cartas ao Ashram”.[1]
(Carlos Cardoso Aveline)
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Abordarei primeiramente a Verdade, pela razão mesma de ser
do Ashram Satyagraha [2],
que é procurar a Verdade e esforçar-se para colocá-la em prática.
A palavra Satya (Verdade) vem de Sat, que
significa ser. Na realidade, não
existe nada a não ser a Verdade. É por isso que Satya ou Verdade talvez seja o
nome mais importante para Deus. Com efeito, dizer que a Verdade é Deus é mais
certo que dizer que Deus é a Verdade. Muitos não imaginam nada além de um
soberano ou de um general; os nomes de Deus como Rei dos reis ou Todo-Poderoso
são de uso corrente e permanecem entre nós. Se, no entanto, refletimos um pouco
mais profundamente, vemos que Sat ou Satya é, para designar Deus,
o nome mais exato e que possui um sentido mais completo.
Onde está a Verdade está, também, o conhecimento que é
verdadeiro. Onde não está a verdade não podemos encontrar o conhecimento
verdadeiro. É por isso que associamos a palavra chit, conhecimento, àquela de Deus. E onde se encontra o
conhecimento verdadeiro há sempre a felicidade (ananda) [3], e
não há lugar para a dor. A verdade sendo eterna, também a felicidade que dela
deriva o é. É por isso que conhecemos Deus sob o nome de Sat-Chit-Ananda. É o que reúne em si a Verdade, o
Conhecimento e a Felicidade.
Somente a devoção a esta Verdade justifica a nossa
existência. A Verdade deve ser o centro de toda nossa atividade. Ela deve ser o
sopro da nossa vida. Quando o peregrino chega a esta etapa do caminho que
percorreu, ele descobre sem nenhum esforço as outras regras da vida e a elas se
amolda instintivamente. Mas sem Verdade será impossível observar na existência
algum princípio ou alguma regra.
Crê-se, de forma geral, que para seguir a lei da Verdade
é suficiente dizer a verdade. Em nosso ashram devemos dar à palavra satya,
verdade, uma significação mais profunda. A Verdade deve manifestar-se em nossos
pensamentos, em nossas palavras e em nossas ações. Para aquele que realizar a
Verdade em toda a sua plenitude nada mais resta a aprender, pois todo o
conhecimento está necessariamente ligado à Verdade. O que não estiver neste
campo não é Verdade e, consequentemente, não é conhecimento verdadeiro. Ora,
não podemos ter paz interior sem o conhecimento verdadeiro. Uma vez que
apliquemos tal critério infalível da Verdade, poderemos discernir,
imediatamente, o que vale a pena ser feito, ou ser visto, ou lido.
Mas como realizar esta Verdade, que lembra um pouco a
pedra filosofal ou a vaca inesgotável? [4]
Chega-se, diz a obra Bhagavad Gita, a uma devoção
na qual se consagra tudo ao espírito [5],
e se vê com indiferença todos os outros interesses que a vida pode oferecer.
Entretanto, apesar de toda esta devoção, o que parece verdade a um parece frequentemente
um erro a outro. Que isso não perturbe a procura. Se fizermos um esforço
sincero, poderemos perceber que as verdades diferentes na aparência são
inúmeras folhas que parecem diferentes, mas que são de uma mesma árvore.
NOTAS:
[1] O texto é reproduzido das páginas 25 a 27 de “Cartas ao Ashram” (Ed.
Hemus, São Paulo, 125 pp.). Antes de ser publicado como texto independente, o artigo
foi divulgado na edição de janeiro de 2011 de “O Teosofista”. (CCA)
[2] Ashram: local de retiro em comunidade, comunidade dedicada ao caminho
místico. (CCA)
[3] Felicidade. No livro em português temos “alegria”, mas a palavra
“felicidade” é mais indicada para traduzir “Ananda”. O termo também equivale a
bem-aventurança. (CCA)
[4] Kamdhenu era uma vaca mitológica que pertencia a um sábio chamado
Vasinshtha. Tudo o que se perguntasse a ela, uma resposta era dada. A expressão
entrou já na língua corrente de toda a Índia. (Nota da edição brasileira de
“Cartas ao Ashram”)
[5] Abhyasa. (Nota da edição brasileira de “Cartas ao Ashram”)
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