A Vida Tal Como a
Conhecemos é Apenas a
Matéria-Prima Para
a Vida Como Ela Pode Ser
S. Radhakrishnan
Sarvepalli
Radhakrishnan
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Nota
Editorial:
Publicado pela primeira vez em 1939, o
texto a
seguir [1] expressa adequadamente a visão de futuro
da filosofia esotérica autêntica. S. Radhakrishnan
descreve a fraternidade planetária como o
futuro natural
da nossa humanidade. Ele sugere que a
autodisciplina e
a autorresponsabilidade são parte do
caminho para uma
vida comunitária que tenha como base a
sabedoria.
Nascido em setembro de 1888, Sarvepalli
Radhakrishnan
foi o primeiro vice-presidente e o segundo
presidente da
Índia após a independência. Ele escreveu diversas
obras
importantes sobre as filosofias da Índia, e
ajudou a
expandir a ponte intercultural entre as
tradições do Oriente
e do Ocidente. Os livros de Radhakrishnan
- entre eles
“The Principal Upanishads”, “An Idealist View of
Life” e “Indian Philosophy” (este em dois
volumes) - têm
numerosos elementos em comum com a
teosofia original de
Helena Blavatsky. Além disso, Sarvepalli
Radhakrishnan fez
oposição às guerras e às armas nucleares.
Ele defendeu o fim
das castas e mesmo das classes sociais na
Índia. Amigo
pessoal do Sr. B. P. Wadia - um dos principais líderes da Loja
Unida de Teosofistas [2] - S. Radhakrishnan
foi um verdadeiro
estadista. Ele sabia que o nosso planeta é
uma comunidade
sem fronteiras, cuja evolução ocorre
através da lei da ajuda mútua.
(Carlos Cardoso Aveline)
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As
verdades fundamentais de uma religião espiritual são duas: 1) o nosso
verdadeiro eu é o ser supremo, que devemos descobrir, e no qual devemos
transformar-nos; 2) este ser supremo é o mesmo em todos.
Quando uma alma encontra a sua essência,
ela não é mais consciente de si como um ser isolado. Ela passa a ser consciente
da vida universal, da qual todos os indivíduos, raças, e povos são apenas
variações.
Um impulso único anima todas as aventuras
e aspirações do ser humano. A experiência da alma que percebe a sua unidade
essencial com todos os seres está expressa nas palavras “eu faço parte de você
e você faz parte de mim”.[3]
A
fraternidade é vida; a falta de fraternidade é morte. Não podemos escapar da
solidariedade secreta da raça humana. Ela não pode ser abolida pelas
insanidades passageiras do mundo. Aqueles que buscam viver em paz com os
membros da sua própria espécie e com todos os seres não aceitam, satisfeitos, o
massacre de milhares de seres humanos, usando como desculpa o fato de que eles
não pertencem à sua raça ou seu país. Trabalhando a partir de uma visão mais
ampla, que tudo abrange, eles ignoram os modos artificiais de viver que nos
seduzem e nos afastam das fontes naturais da vida.
Nossas
atitudes cotidianas diante de outros povos e nações são máscaras artificiais, hábitos
mentais e emocionais laboriosamente cultivados através de um longo exercício da
dissimulação. A natureza social do ser humano é distorcida e assume formas
estranhas devido ao veneno que é colocado em seu sangue e que o transforma em
um animal feroz. O racismo e o nacionalismo, que nos estimulam a exacerbar
nossos sentimentos mais inferiores, a ameaçar e enganar, a matar e saquear,
tudo com um sentimento de que somos profundamente virtuosos e estamos cumprindo
a vontade de Deus, são ideologias abjetas para os que estão espiritualmente
despertos. Estes sabem que todas as
raças e nações vivem sob a mesma
abóboda celeste. Eles proclamam uma nova relação social e buscam construir uma
nova sociedade com liberdades civis para todos os indivíduos, e com liberdade para
todas as nações, grandes e pequenas.
Uma Meta Elevada e
uma Decisão Estável
Não
podemos ficar desanimados com o colapso de uma civilização construída sobre a
audácia da dúvida especulativa, sobre o impressionismo moral e o entusiasmo
confuso e feroz por raças e povos, porque tal civilização tem em si elementos
antissociais e antiéticos, que merecem ser destruídos.
Uma
tal civilização não está planejada para priorizar o bem da humanidade em seu
conjunto, mas para garantir a comodidade de alguns poucos privilegiados, entre
os indivíduos, e entre as nações. Tudo o que for realmente valioso será
preservado no novo mundo que está lutando por nascer.
Apesar
das aparências, vemos na atual inquietação do mundo o surgimento gradual de uma
grande luz, a confluência de esforços vitais, uma compreensão crescente de que
há um espírito secreto no qual todos vivem em comunidade, e do qual a
humanidade é o mais alto instrumento na Terra.
Há
um desejo crescente de expressar esse conhecimento e de estabelecer um reino do
espírito na Terra. A ciência produziu os meios necessários para o transporte
fácil de seres humanos e a comunicação do pensamento. Intelectualmente, o mundo
está unido por uma rede de ideias comuns e conhecimento recíproco.
Até
mesmo obstáculos como os dogmas religiosos já não são tão fortes como eram no
passado. O progresso do pensamento e da visão crítica está ajudando as
diferentes religiões a fazerem soar a nota da verdade eterna e universal, a
verdade do espírito. Esta é a verdade que a vida busca e obedece, e através
dela a vida encontra a felicidade em todos os tempos e lugares.
Somos
capazes de ver mais claramente que a verdade de uma religião não está no que é
especifico e exclusivo dela, nem é a mera letra morta da lei, na qual os
sacerdotes procuram insistir, e pela qual os fiéis estão dispostos a lutar. A
verdade está naquilo que cada religião é capaz de compartilhar com todas as
outras. A compreensão suprema que a humanidade deve alcançar de si mesma e do
mundo só pode ser alcançada através dos valores que são humanos e universais.
A
humanidade ainda está em construção. A vida tal como a conhecemos é apenas a matéria-prima
para a vida como ela pode ser. Estão ao alcance da nossa espécie uma plenitude
e uma liberdade até aqui inéditas. Basta unir-nos como seres humanos e avançar
com uma meta elevada e uma decisão estável.
O Poder dos Indivíduos
O
que se necessita não são declarações solenes e programas de ação, mas o poder
do espírito nos corações humanos, um poder que nos ajudará a disciplinar nossas
ações e libertar-nos da cobiça e do egoísmo, e a organizar o mundo que
desejamos.
NOTAS:
[1] Traduzido
do volume “Eastern Religions and Western Thought” (“Religiões Orientais e
Pensamento Ocidental”) de S. Radhakrishnan; primeira edição, 1939, Oxford
University Press; Third impression, Oxford India paperback, 1989, 396 pp., ver
pp. 32-34.
[2] A amizade
entre o estadista e o teosofista está registrada no texto “B. P. Wadia, a Life of Service to Mankind”, do Sr. Dallas TenBroeck,
que pode ser encontrado em nossos websites associados.
[3] Há aqui
uma alusão indireta à tradicional saudação indiana “Namastê”, que significa: “O
ser divino em mim saúda o ser divino em você.”
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Para
conhecer a teosofia original desde o ângulo da vivência direta, leia o livro “Três Caminhos Para a Paz Interior”, de
Carlos Cardoso Aveline.
Com 19
capítulos e 191 páginas, a obra foi publicada em 2002 pela Editora Teosófica de
Brasília.
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