Sabedoria
Universal Destrói
a Velha
Crença em Deuses Tribais
Carlos Cardoso Aveline
Carlos Cardoso Aveline
A consciência humana no século 21 é crescentemente planetária e
tende a reexaminar o mundo das religiões adotando o ponto de vista do bom
senso. Já é hora, portanto, de enfrentar
uma pergunta incômoda: será possível que a ideia de um Deus monoteísta seja uma
das fontes mais importantes dos constantes conflitos que vemos no Oriente Médio
desde o tempo das cruzadas?
A resposta parece ser afirmativa.
A ideia de um Deus pessoal e nacionalista
está presente na Torá judaica, no Velho
Testamento cristão e no Alcorão islâmico. As três religiões têm origens tribais.
A sua religiosidade institucional, predominantemente dogmática, legitima as
guerras e a violência. É verdade que a religião judaica e o povo que a segue
sofreram perseguições incomparáveis desde a Idade Média, e só recentemente o
povo judeu pôde formar um Estado Nacional próprio e começou a defender-se no
plano militar. Mas a pergunta essencial é:
“Qual a relação
entre o conceito de Deus e a ameaça mundial causada hoje pelo terrorismo
e por outras formas de obscurantismo religioso?”
A filosofia esotérica ensina que há muitos tipos diferentes
de inteligência divina no cosmo, e que o caminho espiritual é não-violento,
plural e diversificado. Na maior parte
dos casos, porém, os teólogos das religiões monoteístas imaginam um deus exclusivista, autoritário,
individualizado, situado fora do cosmo,
um deus pessoal, e politicamente
controlado por esta ou aquela instituição que afirma representá-lo. Este deus, supostamente, decidiu um dia, como
por um capricho, criar o universo e colocar a Terra, fixa, no seu centro. O mesmo Deus vem promovendo e
abençoando há milênios a guerra, a violência e a injustiça. Tal ideia teológica é um absurdo. Fica claro
que este deus foi criado à imagem e à semelhança de sacerdotes limitados por
uma estreita visão tribal do mundo e do universo.
Mas nem sempre houve monoteísmo. Na Grécia, Roma e Egito antigos, havia uma
pluralidade de deuses. O mesmo ocorria nas tradições religiosas dos povos
indígenas das Américas. No hinduísmo, os
deuses são plurais. No judaísmo esotérico, também: “Elohim” é uma palavra
que indica plural, como ressalta H.P. Blavatsky. Até no cristianismo deus
refere a si mesmo como “nós” (Gênesis, I, 26) e existem as “hostes
celestes”. A Santíssima Trindade é uma pluralidade divina.
O budismo e o taoismo são duas religiões que não veem
necessidade de usar o enganoso conceito de “Deus”. O fato é que a ideia
de um Deus monoteísta foi imposto à humanidade durante a idade média, para
servir como um imperador absoluto dos céus,
modelo e fonte de legitimidade para o domínio totalitário do Papa e de
outros monarcas supostamente divinos.
A filosofia esotérica, porém, considera que a verdadeira
religiosidade jamais se separa da Razão. Um dos Mestres de Sabedoria Oriental que
inspiram o movimento esotérico moderno escreveu:
“O Deus dos teólogos é simplesmente um poder imaginário
(...), um poder que até agora nunca se manifestou. Nossa principal meta é
libertar a humanidade deste pesadelo, ensinar ao homem a virtude pelo bem
da virtude, e ensiná-lo a caminhar pela vida confiando em si mesmo, ao invés de
depender de uma muleta teológica que por eras incontáveis foi a causa direta de
quase toda a miséria humana.” [1]
Estas palavras são claras e ajudam a compreender a fonte
dos conflitos atuais no Oriente Médio. O
Mestre acrescentou:
“É a crença em Deus e nos Deuses que faz de dois terços da humanidade
escravos de um punhado daqueles que os enganam com o falso pretexto de
salvá-los. O homem não está
sempre pronto a cometer qualquer tipo de maldade se lhe disserem que seu Deus
ou Deuses exigem o crime - vítima voluntária de um Deus ilusório, escravo
abjeto de seus ministros astuciosos? (...) Durante dois mil anos a Índia
gemeu sob o peso das castas, com os brâmanes engordando só a si mesmos com o
melhor da terra, e hoje os seguidores de Cristo e os de Maomé estão cortando as
gargantas uns dos outros em nome - e para maior glória - dos seus respectivos
mitos. Lembre que a soma da miséria humana nunca será diminuída até aquele dia
em que a parte melhor da humanidade destruir, em nome da Verdade, da moralidade
e da caridade universal, os altares dos seus falsos deuses.” [2]
Neste aspecto, o
Mestre coincide com o ponto de vista científico e com a
filosofia clássica ocidental.
O budismo está entre as religiões que não promoveram guerras. Apesar dos seus defeitos e limitações, é uma
religião filosófica e permanece livre do conceito de um “Deus” singular.
A crença monoteísta externaliza a divindade, ignorando o fato de que a
divindade está sobretudo dentro da
consciência de cada ser humano. Sempre que “deus” passa a ser algo externo, os sacerdotes profissionais e “castas
religiosas” surgem e se multiplicam enquanto as guerras, a crença cega e o ódio
sistemático são promovidos para matar e oprimir nações em nome do “único deus”.
Sobre as religiões presentes no Oriente Médio, cabe lembrar estas palavras de Helena
Blavatsky:
“Verdadeiramente, os espíritos demoníacos do fanatismo do Cristianismo
primitivo e medieval e do Islamismo preferiram permanecer desde o início na
escuridão e na ignorância; e ambos fizeram ‘ - o sol ficar vermelho de sangue, a terra ser um túmulo,o túmulo um
inferno, e o próprio inferno ser feito de trevas ainda mais escuras!’ As duas religiões conquistaram os seus seguidores
com a ponta da espada; ambas construíram seus templos sobre o sacrifício religioso de vítimas humanas.”[3]
A verdade é frequentemente incômoda e politicamente incorreta.
A necessidade de transcender religiões dogmáticas foi ensinada pelos
Mestres de Sabedoria e por Helena Blavatsky. Este aspecto do seu ensinamento,
no entanto, é tão forte e desafiador que
vem sendo “piedosamente” ignorado desde a década de 1890 por setores influentes
das principais organizações teosóficas. Os teosofistas
sinceros não podem ter orgulho disso.
Para cumprir sua missão o movimento esotérico deve colocar a verdade
acima das conveniências e examinar diretamente as causas do sofrimento humano.
A pluralidade de deuses e de enfoques religiosos está na base da
fraternidade universal que orientará a civilização do futuro. Nenhuma religião
é proprietária da verdade. Todas elas têm importantes erros a corrigir através
do diálogo e da humilde pesquisa. Uma sabedoria eterna inclui as diferentes religiões
nos aspectos mais elevados da sua ética e de seus ensinamentos.
NOTAS:
[1] “Cartas dos Mahatmas Para A. P.
Sinnett”, Ed. Teosófica, Brasília, Carta 88, volume II, p. 55. A carta pode ser
encontrada em nossos websites associados sob o título de “Mestres Ensinam Que Não Há Deus”.
[2] “Cartas dos Mahatmas Para A. P. Sinnett”,
Ed. Teosófica, Carta 88, volume II, pp. 61-62.
[3] “A Doutrina
Secreta”, Helena Blavatsky, tradução online passo a passo da edição
original, disponível em nossos websites
associados. Estas linhas estão na segunda
metade da Introdução.
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Uma versão inicial do artigo acima foi publicada,
sem indicação de autor, na edição de janeiro de 2009 de “O Teosofista”.
Veja também o artigo “A Teosofia e o Oriente Médio”, que está publicado em nossos websites.
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Sobre
o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição
luso-brasileira de “Luz no Caminho”,
de M. C.
Com tradução, prólogo e notas de Carlos
Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014
por “The Aquarian Theosophist”.
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