13 de outubro de 2012

O Que Se Ganha Sendo Altruísta?

Uma Questão Aberta no
Caminho do Autoconhecimento

Carlos Cardoso Aveline




O serviço altruísta - feito por uma causa nobre, sem esperar benefícios pessoais - talvez seja a melhor linguagem prática pela qual o cidadão pode expressar livremente uma visão planetária e fraterna da vida.

As  ações generosas são um passaporte  ao nosso dispor para viajar até regiões mais amplas e elevadas de consciência -  especialmente quando  tais ações estão associadas ao estudo cotidiano da sabedoria  divina.   

Não é necessário um grande esforço para ver ao nosso redor possibilidades de exercitar a arte de agir com inegoísmo. A grande questão é como ter a motivação correta. Cedo ou tarde, surgirá a pergunta:

“Afinal, o que o buscador da verdade tem a ganhar de prático com o exercício do altruísmo?”

A resposta não é difícil. O bom carma deve amadurecer.  Uma boa árvore não dá frutos em uma semana. Grande parte do que o cidadão tem a receber em troca do seu altruísmo virá por  acréscimo - a médio e longo prazo -  e não porque ele o busque ansiosamente e sem poder esperar.

Há um ganho,  porém,  que é quase imediato.   A primeira coisa que o cidadão tem a ganhar - e talvez a mais importante -  é uma  ruptura com o círculo vicioso do egoísmo e da ignorância espiritual, o que inclui o desejo neurótico e cego de “levar vantagem” em  cada situação da vida.

Essa ruptura com a cegueira e a surdez interiores abre gradualmente a possibilidade do acesso direto àquela  Consciência de Sabedoria Universal  que está presente no interior de cada cidadão.

O que dizer,  então,  daqueles que pretendem trilhar o caminho do autoconhecimento buscando sobretudo o benefício próprio, e estudando e “meditando” enquanto se abstêm de ajudar os outros?

Cada um deve saber de si, é claro. Mas  é possível - e saudável -  trocar ideias.  O  “Bhagavad Gita” hindu ensina algo que para  muitos é surpreendente.  A antiga escritura afirma que a meditação,  desvinculada de ação altruísta,  pode ser pior que inútil.

Diz o “Gita”:  

“Ninguém jamais fica sequer um momento inativo.  Todo ser humano é involuntariamente levado à ação pelas energias que  emergem da natureza.  Aquele que permanece imóvel, restringindo os sentidos e os órgãos, mas pensa com seu coração nos objetos dos sentidos,  é considerado um falso pietista de alma confusa.  Mas aquele que, tendo dominado todas as suas paixões,  usa ativamente seus talentos para cumprir todos os deveres da vida e faz isso sem preocupar-se com resultados,  deve ser estimado.  A jornada da tua estrutura mortal não pode ser cumprida através da inação.”[1] 

Sábias palavras de Krishna.

De fato,  a  ação com motivação sinceramente altruísta é um instrumento eficaz  pelo qual podemos juntar e harmonizar em nossas vidas a energia do céu e a energia da terra.  

Isso não basta, é claro. Para que uma ação qualquer seja correta, bom senso e discernimento são essenciais.   Mas estas duas qualidades indispensáveis não surgem da imobilidade nem do egoísmo.  Elas se desenvolvem através do método científico de “tentativa e erro”. O  velho ditado popular brasileiro está certo: “é fazendo que se aprende”. A prática  ensina que aprendemos mais e melhor quando ampliamos a nossa capacidade de estar atentos, enquanto agimos.    

Um paradoxo da sabedoria universal é expressado por Jesus,  no Novo Testamento, quando ele diz que aquele que busca coisas para si, as  perde, mas aquele que não busca coisas para si, as ganha.  E Helena P. Blavatsky escreveu que, no caminho do autoconhecimento,  é impossível beneficiar os outros sem ser beneficiado internamente por isso, assim como é impossível beneficiar de fato a si mesmo sem que isso seja benéfico para os outros ao nosso redor. 

Em última instância, há uma unidade universal entre todos os seres. Por causa dessa unidade dinâmica, tudo o que se planta, se colhe. Em consequência desse fato da natureza,  é inteligente e de bom senso fazer aos outros o que esperamos que eles façam por nós.  

Isso nem sempre será fácil. Porém, tentar agir corretamente é algo que está ao nosso alcance.  Ao fazer isso sempre, obteremos pouco a pouco  uma parcela de verdadeira sabedoria,  e desse modo as causas do nosso sofrimento começarão a desaparecer.

NOTA:

[1] “Bhagavad Gita”,  versão de William Q. Judge, The Theosophy Company,  Los Angeles, EUA e Mumbai, India, 1986, 134 pp., capítulo III, p. 23.  Na versão brasileira de Francisco Valdomiro Lorenz (Ed. Pensamento), ver pp. 37-38.

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