A Arte de Enxergar
Lições em Toda Parte
Carlos Cardoso Aveline
“Tu podes criar neste ‘dia’ as tuas
possibilidades para o teu ‘amanhã’. Na
‘Grande Jornada’, as causas plantadas
a cada hora produzem, cada uma, a sua
colheita de efeitos; porque uma rígida
Justiça rege o Mundo. Com o impulso
poderoso de uma ação que jamais erra, ela
traz vidas de felicidade ou de sofrimento
para os mortais, resultados cármicos de todos
os nossos pensamentos e ações anteriores.”
Helena P. Blavatsky [1]
Bem-aventurança infinita e harmonia total: essa é a substância essencial da
vida. A lei eterna do equilíbrio e da verdade nos rodeia por todos os lados.
Caminhamos sobre ela. Ela é a meta dos nossos esforços. Ela também habita nosso
coração e o ar que respiramos.
Mas somos como peixes que navegam por um oceano infinito
e não têm consciência disso. Estamos rodeados de infinitas possibilidades em
todos os aspectos, e temos a impressão de que é difícil localizá-las e
aproveitá-las para expandir o contato com nossa natureza original.
Em consequência disso, a tarefa de identificar as
sementes do bem e fazê-las germinar é um dos grandes testes colocados diante do
ser humano.
Três dos principais axiomas da filosofia esotérica podem
ser colocados em palavras bastante simples, e deles os dois primeiros estavam inscritos
na entrada do oráculo de Delfos, na Grécia antiga:
* “Nada em excesso”;
* “Conhece-te a ti mesmo”; e
* “Percebe tua oportunidade”.
Há uma estreita relação entre esses conselhos. É preciso,
em primeiro lugar, viver com uma calma moderação interior para, em segundo
lugar, conhecer a si mesmo.[2] Essas duas condições permitem ao aprendiz
identificar, em terceiro lugar, as oportunidades no caminho da sabedoria.
O ser humano é contraditório. Sua vida é território de
uma constante luta entre acertos e erros. Desperdiçamos grande parte do nosso
potencial de felicidade, criamos problemas para nós mesmos e para os outros, e
temos de fazer um esforço para aceitar a verdade quando ela contraria nossas
opiniões ou ameaça nossa comodidade ou nossas rotinas preferidas.
Viver é perigoso. Há oportunidades para fazer o bem e há
oportunidades negativas ou ilusórias. O desejo, assim como a vontade, tende a produzir
as oportunidades que levam à sua materialização.
Quando o estudante de filosofia pratica uma
auto-observação honesta e a faz à luz do ideal do autoaperfeiçoamento humano, ele
enxerga as oportunidades ilimitadas de fazer o bem, trilhar o caminho da
sabedoria e alcançar a libertação através do altruísmo.
Na medida em que isso ocorre damos passos positivos,
temos gestos nobres e elevados, construímos situações saudáveis e aprendemos a
amar com altruísmo. Quanto mais o tempo passa, mais aprendemos a aprender. No
século 19, um raja-iogue dos Himalaias escreveu o seguinte à sua discípula
Laura Holloway, sobre a arte de aproveitar oportunidades positivas:
“Trate, filha, de aprender uma lição através de quem quer que
seja que ela possa estar sendo dada. ‘Até mesmo as pedras podem pregar
sermões.’ Não seja demasiado ansiosa por ‘instruções’. Você sempre obterá o que
necessita se o merecer, mas não mais do que merece ou estiver apta a
assimilar...” [3]
Porém, para aproveitar as possibilidades que a vida
coloca diante de nós, são necessárias pelo menos três coisas:
A) Saber o que queremos;
B) Ter olhos para ver as lições ocultas sob as aparências
externas;
C) Possuir uma serena autoconfiança.
Émile Coué, que formulou o método da autossugestão
consciente, afirmou o seguinte, na primeira parte do século 20:
“Aquele que parte na vida com a firme intenção de
alcançar um objetivo fatalmente o conseguirá, porque tudo fará para alcançá-lo.
Se uma só oportunidade se lhe apresenta, por duvidosa que seja, mesmo assim não
a deixa passar. Ademais, inconscientemente ou não, dá lugar a que sucedam
acontecimentos que lhe são propícios. Aquele que, ao contrário, duvida de si
mesmo, jamais alcançará coisa alguma. Pode ter carradas de oportunidades bem
favoráveis, mas não as enxergará, não poderá segurar uma só, por mais simples
que seja o esforço para alcançá-la.” [4]
Os cidadãos menos atentos chamam de “bom” o que é
agradável, e de “ruim” o que não é agradável. Esta visão das coisas é
superficial e a médio prazo produz mais sofrimento. O pensador Robert Crosbie escreveu:
“... Digamos que nada é bom e nada é mau, mas tudo é
oportunidade - a melhor oportunidade possível, porque a alma sabe o que ela
necessita para aumentar seus poderes e manter sua energia.”
E Crosbie acrescentou:
“Nós às vezes não reconhecemos nossas oportunidades,
porque elas surgem a cada momento do tempo. Cada acontecimento é uma
oportunidade - até mesmo a passagem das pessoas na rua e os pensamentos e
sentimentos que elas despertam em nós. Seja o que for que nós sentirmos em
relação aos outros, sejam quais forem nossas relações com eles, nosso contato
com eles, nossas relações familiares, nossas relações sociais, profissionais, e
nacionais - todas essas são oportunidades que podem ser aproveitadas de várias
maneiras; cada uma delas constitui Carma. Nosso contato com a Sabedoria Divina
(Teosofia) constitui uma oportunidade cármica.” [5]
O contato sincero com a filosofia esotérica autêntica
significa uma oportunidade de ouro. Aproveitá-la, porém, é algo que requer
paciência e uma visão de longo prazo da vida.
Uma certa humildade será necessária para aceitar o fato
de que a capacidade de identificar, assimilar e vivenciar lições só cresce
pouco a pouco ao longo dos anos. Por outro lado, cada passo dado na direção
correta é perfeitamente válido e completo em si mesmo, e muda para melhor algum
aspecto do nosso presente e do nosso futuro. A meta é longínqua e todo
progresso sincero na direção dela deve ser celebrado.
NOTAS:
[1] “A Voz do Silêncio”, Helena P. Blavatsky, edição online de nossos websites
associados, Fragmento II, aforismo 148.
[2] Veja o item Sete Sábios, em “Dicionário Oxford de Literatura
Clássica Grega e Latina”, Paul Harvey, Jorge Zahar Editor, RJ.
[3] “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, compiladas por C. Jinarajadasa, Ed.
Teosófica, Brasília, Seção de Cartas Para e Sobre Laura Holloway, ver Carta II,
p. 147. Neste trecho, o mestre chama atenção para o fato de que a relação entre
instrutor e discípulo ocorre sempre fundamentalmente além do verbal e do
visual. O discípulo deve ter os olhos bem abertos para distinguir o ensinamento
e a inspiração em qualquer aspecto da vida.
[4] “O Domínio de Si Mesmo Pela Auto-Sugestão Consciente”, Émile Coué, Ed.
Martin Claret, SP, 2002, ver p. 83.
[5] Citado na revista “The
Theosophical Movement”, Theosophy Company, Mumbai, Índia, Fevereiro 2005, p.
144.
000
Leia também o “Poema Para a
Oportunidade”, de Affonso Celso, que está disponível em nossos websites
associados.
000
Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia
a edição luso-brasileira de “Luz no
Caminho”, de M. C.
Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete
capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
000