Eu Ouço as Vozes, eu Vejo as Cores, eu
Sinto os Passos, de um País Mais Brasileiro

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Nota Editorial de 2025
Este poema profético foi publicado em livro em 1980 e
portanto durante o período da ditadura militar. Os versos
anunciam uma nova etapa histórica em que o Brasil viria
a ser governado por trabalhadores, e não já por membros
das velhas elites. No entanto, devemos evitar conclusões
apressadas. O governante-trabalhador poderá liderar o
país “contanto que seja digno do governo do Brasil”, isto é,
que seja honesto, íntegro e fale a verdade, “que tenha olhos
para ver pelo Brasil, ouvidos para ouvir pelo Brasil, coragem
de morrer pelo Brasil”. Em outras palavras, o governante
deve sacrificar-se pelo país, ao invés de ser corrupto e usar
a corrupção como forma de se manter no poder. O cidadão
do povo poderá governar o país contanto que tenha “ânimo de
viver pelo Brasil, mãos para agir pelo Brasil”. E isto não surge
por obra do Espírito Santo apenas. É preciso fazer por merecer.
A preparação ética do povo deve ser realizada. Cada brasileiro
pode alcançar o privilégio de compreender as vantagens de ser
honesto e honrado. Mas, para alcançar o privilégio de ser íntegro
e sincero ele deve educar com calma a sua própria vontade, tanto no
plano consciente como no plano subconsciente. Esta tarefa é mais
complexa e mais difícil do que alguns pensam, e requer um longo
esforço individual e coletivo de autoconhecimento e autoeducação.
O momento de começar o fortalecimento moral de um país está
disponível sempre agora, neste exato momento, porque é a força
moral e ética que permite a um povo não só existir de modo organizado,
mas também construir um futuro. A mesma força interior sustenta
individualmente cada um de nós - e merece ser cultivada a todo instante.
(Carlos Cardoso Aveline)
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O Outro Brasil Que Vem Aí
Gilberto Freyre
Eu ouço as vozes
eu vejo as cores
eu sinto os passos
de outro Brasil que vem aí
mais tropical
mais fraternal
mais brasileiro.
O mapa desse Brasil em vez das cores dos Estados
terá as cores das produções e dos trabalhos.
Os homens desse Brasil em vez das cores das três raças
terão as cores das profissões e das regiões.
As mulheres do Brasil em vez das cores boreais
terão as cores variamente tropicais.
Todo brasileiro poderá dizer: é assim que eu quero o Brasil,
todo brasileiro e não apenas o bacharel ou o doutor
o preto, o pardo, o roxo e não apenas o branco e o semibranco.
Qualquer brasileiro poderá governar esse Brasil
lenhador
lavrador
pescador
vaqueiro
marinheiro
funileiro
carpinteiro
contanto que seja digno do governo do Brasil
que tenha olhos para ver pelo Brasil,
ouvidos para ouvir pelo Brasil
coragem de morrer pelo Brasil
ânimo de viver pelo Brasil
mãos para agir pelo Brasil
mãos de escultor que saibam lidar com o barro forte e novo dos Brasis
mãos de engenheiro que lidem com ingresias e tratores europeus e norte-americanos a serviço do Brasil
mãos sem anéis (que os anéis não deixam o homem criar nem trabalhar)
mãos livres
mãos criadoras
mãos fraternais de todas as cores
mãos desiguais que trabalham por um Brasil sem Azeredos,
sem Irineus
sem Maurícios de Lacerda.
Sem mãos de jogadores
nem de especuladores nem de mistificadores.
Mãos todas de trabalhadores,
pretas, brancas, pardas, roxas, morenas,
de artistas
de escritores
de operários
de lavradores
de pastores
de mães criando filhos
de pais ensinando meninos
de padres benzendo afilhados
de mestres guiando aprendizes
de irmãos ajudando irmãos mais moços
de lavadeiras lavando
de pedreiros edificando
de doutores curando
de cozinheiras cozinhando
de vaqueiros tirando leite de vacas chamadas comadres dos homens.
Mãos brasileiras
brancas, morenas, pretas, pardas, roxas
tropicais
sindicais
fraternais.
Eu ouço as vozes
eu vejo as cores
eu sinto os passos
desse Brasil que vem aí.
(Gilberto Freyre)
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O poema “O Outro Brasil Que Vem Aí” está disponível nos websites da Loja Independente de Teosofistas desde o dia 10 de junho de 2025. Os versos são reproduzidos do livro “Poesia Reunida”, de Gilberto Freyre, Edições Pirata, Recife, 1980, 107 pp., ver pp. 15-17. O poema faz parte também da edição de junho de 2020 de “O Teosofista”, pp. 10-11.
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Leia mais:
* Corpo e Alma, Cavalo e Cavaleiro (texto de Theodoro D’Almeida).
* Regra da Vida Honesta (tratado estoico clássico de Martinho Bracarense)
* João de Deus, Louco, Santo, e Sábio (Como a Ruptura da Rotina Psicológica Pode Abrir as Portas Para a Vida Mística).
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Helena Blavatsky (foto) escreveu estas palavras: “Antes de desejar, faça por merecer”.
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