Uma Carta
Aberta ao Arcebispo de Cantuária
Helena
P. Blavatsky

Helena Blavatsky em seu escritório, em 1887
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Nota Editorial de 2009:
Durante
séculos, o Vaticano promoveu a tortura e a morte no fogo de
centenas
de milhares de pessoas inocentes. A
desculpa era “Lúcifer”,
o
inimigo imaginário de um deus medieval
sedento de sangue. A palavra
“Lúcifer”,
porém, é muito anterior ao cristianismo e significa “portador
da
luz”. O termo designa o planeta Vênus, a “estrela da manhã”,
que
anuncia o nascer do sol. A palavra foi distorcida pelos teólogos
medievais,
quando eles decidiram fabricar um “inimigo terrível”
para justificar o uso sistemático do assassinato em
nome de Deus.
Em Londres, na etapa final da sua
vida, Helena P. Blavatsky fundou
uma revista e chamou-a de “Lúcifer”. H.P.B. queria resgatar da fraude
teológica
este termo
pré-cristão da sabedoria universal. Foi
em “Lúcifer”,
na
edição de dezembro de 1887, que apareceu pela primeira vez o artigo
a
seguir, uma carta aberta ao Arcebispo de
Cantuária. Seu título original é
“Lucifer to the Archbishop of
Canterbury, Greeting!” (“Saudações
de
Lúcifer ao Arcebispo de Cantuária!”). A cidade de Cantuária (em inglês,
Canterbury) está situada no sudeste da
Inglaterra e constitui o principal
centro religioso do país. Ali
vive tradicionalmente o arcebispo que lidera
a Igreja Anglicana. Cabe
registrar ainda que a Sociedade Teosófica
original já não existe. Ela deu
lugar a um movimento amplo e marcado
pela diversidade de organizações.
Portanto, no texto a seguir,
onde se lê “Sociedade
Teosófica”, deve-se ler “Movimento
Teosófico”.
(Carlos Cardoso Aveline)
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Senhor Primaz de toda a Inglaterra,
Fazemos uso de uma carta aberta a Sua Graça para transmitir
a você e para fazer chegar através de você aos membros do clero, às suas
ovelhas e a todos os cristãos em geral - que nos consideram como inimigos de
Cristo - uma breve descrição da posição da teosofia em relação ao cristianismo,
pois pensamos que chegou o momento de fazer isso.
Sua Graça é sem dúvida consciente de que a teosofia não é
uma religião, mas uma filosofia ao mesmo tempo religiosa e científica; e que a
principal tarefa da Sociedade Teosófica até agora tem sido fazer reviver em
cada religião o seu espírito próprio que a anima, ao encorajar e ajudar o
estudo do verdadeiro significado das suas doutrinas e das suas práticas. Os
teosofistas sabem que quanto mais profundamente se avança na compreensão das
doutrinas e das cerimônias de todas as religiões, maior e mais aparente se
torna a sua semelhança básica, até que, por fim, se chega à percepção da sua
unidade fundamental. Este terreno comum é a teosofia - a Doutrina Secreta de
todas as épocas; que, diluída e disfarçada para se adaptar à percepção das
multidões e às exigências de cada época, constitui a essência viva de todas as
religiões. A Sociedade Teosófica tem lojas compostas por budistas, hindus, maometanos,
parses, cristãos e livres-pensadores, que trabalham como irmãos no terreno
comum da teosofia. E é precisamente porque a teosofia não é uma religião, nem
pode cumprir o papel de uma religião para as multidões, que o sucesso desta
Sociedade foi tão grande, não apenas em relação ao número crescente dos seus
membros e à sua influência cada vez maior, mas também no que se refere à
realização do seu trabalho - o resgate da espiritualidade na religião, e o
cultivo do sentimento de FRATERNIDADE entre os homens.
Nós, teosofistas, cremos que a religião é um incidente natural
na vida do homem, no seu estágio atual de desenvolvimento; e que embora em
casos raros os indivíduos possam nascer sem o sentimento religioso, uma comunidade
deve ter uma religião, isto é, um laço de união - sob pena de cair na decadência
social e na aniquilação material. Acreditamos que nenhuma doutrina religiosa
pode ser mais que uma tentativa de descrever - para a nossa limitada capacidade
atual de compreensão e nos termos das nossas experiências terrestres - grandes
verdades cósmicas e espirituais que, no estado normal de consciência, sentimos
vagamente, mais do que realmente percebemos e compreendemos; e uma revelação, para
que possa revelar alguma coisa, deve necessariamente adequar-se às mesmas exigências
do intelecto humano.
Na nossa avaliação, portanto, nenhuma religião pode ser
absolutamente verdadeira, e nenhuma pode ser absolutamente falsa. Uma religião
é verdadeira na medida em que atende as necessidades espirituais, morais e
intelectuais da sua época, e ajuda o desenvolvimento da humanidade nestas
áreas. Ela é falsa na medida em que bloqueia este desenvolvimento e prejudica a
parte espiritual, moral e intelectual da natureza do homem. E as ideias transcendentemente
espirituais sobre os poderes dirigentes do universo, adotadas por um sábio do
Oriente, seriam para um selvagem africano uma religião tão falsa quanto o
fetichismo inferior deste selvagem seria para aquele sábio, embora os dois pontos
de vista devam necessariamente ser verdadeiros, em certa medida, porque ambos
representam as mais elevadas ideias que estes indivíduos podem respectivamente
conceber a respeito destes fatos cósmico-espirituais. Tais fatos jamais podem
ser conhecidos na sua realidade pelo homem, enquanto ele for apenas um
homem.
Os teosofistas, portanto, respeitam todas as religiões e
têm uma profunda admiração pela ética religiosa de Jesus. E não poderia ser de
outro modo, pois estes ensinamentos que chegaram até nós são os mesmos que os
da teosofia. Na medida, pois, em que o cristianismo moderno se conduz de acordo
com a sua afirmação de que é a religião prática ensinada por Jesus, os teosofistas
estão com ele de todo o coração. A partir do momento em que age contra esta
ética, pura e simples, os teosofistas tornam-se seus opositores. Qualquer cristão
pode, se quiser, comparar o Sermão da Montanha com os dogmas da sua igreja e o
espírito que respira nela, e com os princípios que guiam esta civilização cristã
e governam a sua própria vida; e então estará em condições de julgar por si mesmo
até que ponto a religião de Jesus está presente em seu cristianismo, e até que
ponto, consequentemente, ele e os teosofistas estão de acordo. Mas os cristãos
declarados, e especialmente o clero, evitam fazer esta comparação. Como
comerciantes que temem ir à falência, eles parecem ter receio de encontrar na
sua contabilidade um saldo negativo que não poderia ser compensado contabilizando
bens materiais em lugar de bens espirituais. A comparação entre os ensinamentos
de Jesus e as doutrinas das igrejas foi, todavia, feita frequentemente - e
muitas vezes com um grande conhecimento e uma perspicácia decisiva - tanto por
aqueles que queriam abolir o cristianismo, quanto pelos que queriam reformá-lo;
e o resultado total destas comparações, como Sua Graça deve saber, prova que em
quase todos os pontos as doutrinas das igrejas e o modo de agir dos cristãos
estão em contradição direta com os ensinamentos de Jesus.
Temos o costume de dizer aos budistas, aos maometanos,
aos hindus ou aos parses: “O caminho que conduz à teosofia passa por vocês
mesmos, por sua própria religião”. Dizemos isto porque as suas crenças possuem
um significado profundamente filosófico e esotérico, que explica as alegorias
sob as quais são apresentadas ao povo. Mas não podemos dizer a mesma coisa aos cristãos.
Os sucessores dos Apóstolos nunca registraram por escrito
a doutrina secreta de Jesus - os “mistérios do reino dos céus” -, que foi
dada a conhecer apenas a eles (seus apóstolos) [1]. Estes mistérios
foram suprimidos, afastados, destruídos. O que nos chegou através do tempo são os
preceitos, as parábolas, as alegorias e as fábulas que Jesus destinou expressamente
aos espiritualmente surdos e cegos, e que deveriam ser reveladas mais tarde
para o mundo, e que o cristianismo moderno ora as toma na íntegra,
literalmente, ora as interpreta segundo a fantasia dos Padres da igreja
secular. Em ambos os casos, elas são como flores cortadas: estão separadas da
planta em que cresceram e da raiz de que esta planta tirou sua vida. Portanto, se
fôssemos encorajar os cristãos, como fazemos com os fiéis de outras crenças, a
estudarem por si mesmos a sua própria religião, a consequência seria não um
conhecimento do significado dos seus mistérios, mas o redespertar da
superstição e da intolerância medievais, acompanhado de uma formidável explosão
de preces e sermões ditos apenas da boca para fora - tal como o que resultou na
formação de 239 seitas protestantes, apenas na Inglaterra - ou,
alternativamente, um grande aumento do ceticismo, pois o cristianismo não tem uma
base esotérica conhecida pelos que o seguem. Porque mesmo você, Senhor Primaz da
Inglaterra, deve estar dolorosamente consciente do fato de que não sabe absolutamente
nada sobre os “mistérios do reino dos céus” ensinados por Jesus aos seus
discípulos - que não seja conhecido pelo membro mais humilde e mais iletrado da
sua Igreja.
Portanto, é facilmente compreensível que os teosofistas
nada têm a dizer contra a política da Igreja Católica Romana de proibir, e a
política das igrejas protestantes de desencorajar, qualquer investigação
individual sobre o significado dos dogmas “cristãos” que seja correspondente ao
estudo esotérico das outras religiões. Com as suas ideias e conhecimentos
atuais, os cristãos não têm condições de empreender um exame crítico da sua fé
com uma perspectiva de bons resultados. O seu efeito inevitável seria paralisar,
ao invés de estimular, os sentimentos religiosos adormecidos; porque os estudos
críticos da Bíblia e a mitologia comparada provaram de uma forma conclusiva -
pelo menos, para aqueles que não têm interesse pessoal, espiritual ou temporal,
na manutenção da ortodoxia -, que a religião cristã, tal como existe agora, é
composta de cascas externas do judaísmo, com retalhos do paganismo e restos mal
digeridos de gnosticismo e neoplatonismo.
Este curioso conglomerado que se formou gradualmente à
volta do registro das palavras ditas por Jesus começou agora, eras mais tarde, a
desintegrar-se e a desagregar-se, separando-se das joias puras e preciosas da
verdade teosófica que durante tanto tempo ele encobriu e escondeu, mas que
nunca puderam ser desfiguradas ou destruídas. A teosofia não só resgata estas joias
preciosas do destino que ameaça o lixo ao qual estiveram tanto tempo misturadas.
Ela também salva o próprio lixo de uma condenação completa; porque ela mostra
que o resultado do exame crítico da Bíblia está longe de ser a análise última
do cristianismo, uma vez que cada um dos pedaços que compõem os curiosos
mosaicos das Igrejas pertenceu, em algum momento, a uma religião que tinha um
significado esotérico. Só quando estes pedaços forem recolocados nos lugares
que ocupavam originalmente poderá ser percebido o significado real das doutrinas
do cristianismo. Para fazer tudo isto, contudo, é necessário um conhecimento da
Doutrina Secreta tal como ela existe nas bases esotéricas de outras religiões;
e o clero não possui este conhecimento, pois a Igreja escondeu as suas chaves,
e depois as perdeu.
Sua Graça compreenderá agora por que motivo a Sociedade
Teosófica tem como um dos seus três “objetivos” o estudo das religiões e
filosofias orientais, que lançam esta luz sobre o sentido oculto do cristianismo;
e compreenderá também, segundo esperamos, que, ao fazê-lo, não agimos como
inimigos, mas como amigos da religião ensinada por Jesus – o verdadeiro cristianismo,
na realidade. Porque é só através do estudo destas religiões e filosofias que
os cristãos poderão chegar em algum momento à compreensão das suas próprias
crenças, ou descobrir o sentido oculto das parábolas e das alegorias ditas pelo
Nazareno aos paralíticos espirituais da Judeia. Ao considerá-las como fatos
literais ou como fantasia, as igrejas colocaram os seus próprios ensinamentos
no ridículo e fizeram com que eles fossem desprezados, levando o cristianismo a
um sério perigo de um colapso completo, debilitado como ele está pelos estudos
históricos críticos e pelas pesquisas mitológicas, além de ser quebrado pela
marreta da ciência moderna.
Deveriam então os próprios teosofistas ser considerados
pelos cristãos como seus inimigos, porque creem que o cristianismo ortodoxo é
em tudo oposto à religião de Jesus; e porque têm a coragem de dizer às igrejas
que elas são traidoras do MESTRE que elas pretendem venerar e servir? Longe
disso, de fato. Os teosofistas sabem que o mesmo espírito que animava as
palavras de Jesus existe em estado latente no coração dos cristãos, como existe
naturalmente no coração de todos os homens. A sua doutrina fundamental é a
Fraternidade Humana, cuja realização última só é possibilitada por aquilo que
era conhecido muito tempo antes de Jesus como “o espírito de Cristo”. Mesmo
agora este espírito está potencialmente presente em todos os homens e se
tornará ativo quando os seres humanos não forem mais impedidos de se
compreenderem, de se apreciarem e de simpatizarem entre si pelas barreiras da luta
e do ódio, erguidas pelos sacerdotes e pelos príncipes.
Sabemos que os cristãos, nas suas vidas, se elevam
frequentemente acima do cristianismo. Todas as Igrejas têm numerosos homens e mulheres
nobres, virtuosos e com espírito de sacrifício, desejosos de fazer o bem durante
suas vidas, segundo o seu grau de compreensão e as oportunidades que encontram,
e que estão plenos de aspiração por coisas mais elevadas que as da terra - sendo
seguidores de Jesus apesar do cristianismo.
Por indivíduos como estes os teosofistas sentem a mais
profunda simpatia; porque só um teosofista, ou então uma pessoa que tenha a
delicada sensibilidade e o grande saber teológico de Sua Graça, pode apreciar adequadamente
as dificuldades horríveis contra as quais a frágil planta da religiosidade natural
deve lutar, quando afunda com esforço suas raízes no solo estéril da nossa
civilização cristã, e tenta florir na atmosfera fria e árida da teologia. Como
deve ser difícil, por exemplo, “amar” um Deus como aquele que é descrito numa
bem conhecida passagem de Herbert Spencer:
“A crueldade de um deus Fidjiano que, representado como
devorador das almas dos mortos e, pode supor-se, torturando-as enquanto as engole,
é pouca coisa se comparada à crueldade de um deus que condena os homens a
torturas eternas. … Atribuir aos descendentes de Adão, durante centenas de
gerações, castigos horríveis por uma pequena transgressão que eles não
cometeram; a condenação de todos os homens que não têm a possibilidade de
recorrer a um pretenso método de obter o perdão, e do qual a maior parte dos
homens nunca ouviu falar, e a reconciliação efetuada pelo sacrifício de um filho
perfeitamente inocente, para satisfazer a suposta necessidade de uma vítima
propiciatória, são modos de ação que, se fossem atribuídos a um dirigente
humano, provocariam horror.”[2]
Sua Graça dirá, sem dúvida, que Jesus nunca ensinou que
se deveria adorar um deus como este. Nós, teosofistas, dizemos o mesmo. Contudo
este deus é o deus cuja adoração é oficialmente pregada na Catedral de Cantuária,
por você mesmo, Senhor Primaz da Inglaterra; e Sua Graça concordará seguramente
conosco em que deve existir de fato uma centelha divina de intuição religiosa
no coração dos homens, que os capacita a resistir tão bem quanto resistem à
ação mortal de uma teologia venenosa como esta.
Se Sua Graça dirigir o olhar à sua volta, verá desde
a sua elevada posição uma civilização cristã em que uma luta frenética e sem
trégua do homem contra o homem é, não só a característica que a distingue, mas
também um princípio reconhecido. É um axioma científico e econômico bem estabelecido
em nossos dias que todo progresso é conseguido através da luta pela vida e
sobrevivência do mais apto; e os mais aptos a sobreviver nesta civilização cristã
não são os que possuem as qualidades reconhecidas pela moralidade de todos os
tempos como sendo as melhores - não são os generosos, os piedosos, os nobres de
coração, capazes de perdoar, humildes, fiéis, honestos e bons - mas sim aqueles
que são mais fortes em egoísmo, astúcia, hipocrisia, em força bruta,
fingimento, falta de escrúpulos, crueldade e avareza.
Os indivíduos espirituais e os altruístas são “os
fracos”, a quem as “leis” que governam o universo dão como alimento aos
egoístas e aos materialistas - “os fortes”. A “ lei do mais forte” é a única
conclusão legítima, a última palavra da ética do século 19, pois o mundo
tornou-se um grande campo de batalha no qual os “mais aptos” descem como
abutres para arrancar os olhos e o coração dos que caíram durante o combate. Será
que a religião faz cessar a batalha? As igrejas espantam os abutres, ou
reconfortam os feridos e os moribundos? Hoje a religião no mundo em
geral não pesa mais que uma pluma, quando as vantagens terrestres ou os
prazeres egoístas são colocados no outro prato da balança; e as igrejas não têm
o poder de revivificar o sentimento religioso entre os homens, porque as suas
ideias, o seu conhecimento, os seus métodos e os seus argumentos são os da
Idade das Trevas. Senhor Primaz, o seu cristianismo é o de quinhentos anos
antes da nossa época.
Enquanto os homens discutiam para saber se este deus ou aquele
outro era o verdadeiro deus, ou se a alma ia para este ou aquele lugar depois
da morte, vocês, do clero, compreendiam a pergunta e tinham argumentos prontos
para influenciar a opinião – pelo silogismo ou pela tortura, conforme fosse o
caso. Mas agora é a própria existência de qualquer ser semelhante a Deus, ou de
qualquer espécie de espírito imortal, que é questionada ou negada. A ciência
inventa novas teorias sobre o Universo que ignoram com desprezo a existência de
qualquer deus; os moralistas concebem teorias relativas à ética e à vida social
nas quais a não-existência de uma vida futura é considerada como uma premissa; em
física, em psicologia, em direito, em medicina, a única coisa necessária para
assegurar o sucesso de um professor é que a exposição das suas ideias não
contenha nenhuma alusão à Providência, ou à alma. O mundo é conduzido
rapidamente à convicção de que deus é uma concepção mítica, que não tem de fato
nenhum fundamento, e nenhum lugar na Natureza; e que a parte imortal do homem é
o sonho estúpido de selvagens ignorantes, perpetuado pelas mentiras e pelos embustes
dos padres, que fazem uma ampla colheita cultivando nos homens o temor de que
as suas almas imaginárias sejam torturadas, por toda a eternidade, pelo seu
Deus mítico, num Inferno que só existe em fábulas. Diante de tudo isto, o clero
permanece, atualmente, silencioso e impotente. A única resposta que a Igreja
sabia dar a “objeções” como estas era a tortura e a fogueira; mas agora
ela não pode servir-se deste sistema de argumentação.
É certo que se o Deus e a alma descritos pelas igrejas
são entidades imaginárias, então a salvação e a danação cristãs são puras
ilusões da mente, produzidas em grande escala pelo processo hipnótico de
afirmação e de sugestão, agindo cumulativamente sobre gerações de dóceis
“histéricos”. Que resposta você dá a uma tal teoria da religião cristã, além da
repetição de afirmativas e sugestões? Que modo tem você de reconduzir os homens
às suas antigas crenças, além de fazer reviver os seus velhos hábitos? “Construam
mais igrejas, rezem mais orações, fundem mais missões e a sua fé na condenação e
na salvação será reanimada e uma nova crença em Deus e na alma será o resultado
inevitável”. Tal é a política das igrejas. É a sua única resposta ao
agnosticismo e ao materialismo. Mas sua Graça deve saber que responder aos
ataques da ciência e da crítica modernas com armas como a afirmação e o hábito
é como atacar metralhadoras usando bumerangues e escudos de couro. No entanto, enquanto
o progresso das ideias e o aumento do conhecimento arruínam a teologia popular,
cada descoberta da ciência e cada nova concepção do pensamento europeu avançado
aproximam o espírito do século 19 das ideias do Divino e do Espiritual,
conhecidos de todas as religiões esotéricas e da teosofia.
A Igreja alega que o cristianismo é a única religião verdadeira,
e esta pretensão implica duas afirmações diferentes, a saber, que o cristianismo
é uma religião verdadeira, e que não há religião verdadeira exceto o cristianismo.
Parece que nunca passa pela cabeça dos cristãos a ideia de que Deus e o
Espírito possam existir de qualquer forma diferente da que é apresentada nas
doutrinas da igreja. O selvagem chama o missionário de ateu porque ele não
transporta um ídolo na sua mala; e o missionário, por sua vez, qualifica de ateu
qualquer um que não traga um fetiche no seu espírito; e nem o selvagem, nem o
cristão parecem ter jamais suposto que possa existir uma concepção mais elevada
que a sua em relação ao grande poder oculto que governa o Universo, e ao qual o
nome “Deus” é muito mais aplicável. É difícil saber se as Igrejas tentam mais
provar que o cristianismo é “verdadeiro”, ou provar que qualquer outra espécie
de religião é necessariamente “falsa”; as más consequências que resultam deste
seu ensino são terríveis. Quando as pessoas rejeitam o dogma, elas imaginam que
rejeitaram também o sentimento religioso, e concluem que a religião é algo
supérfluo na vida humana – uma forma de mandar para as nuvens coisas que
pertencem à terra, uma perda de energia que poderia ser usada mais eficientemente
na luta pela existência. O materialismo desta época é, portanto, consequência
direta da doutrina cristã segundo a qual não existe poder dirigente no
Universo, nem qualquer Espírito imortal no homem, além dos que foram descritos nos
dogmas cristãos. O ateu, Senhor Primaz, é o filho bastardo da Igreja.
Mas isto não é tudo. As igrejas nunca ensinaram aos
homens alguma razão para serem justos, bons e sinceros, que seja mais elevada do
que a esperança de uma recompensa ou o medo do castigo; e, quando eles
abandonam a crença no capricho Divino e na injustiça Divina, as bases da sua
moralidade ficam fragilizadas. Eles nem sequer têm uma moralidade natural à
qual possam voltar conscientemente, pois o cristianismo ensinou-lhes a considerá-la
como algo sem valor, alegando a perversidade natural do homem. Portanto, o
interesse pessoal torna-se a única motivação da conduta, e o receio de ser
descoberto, a única coisa que o afasta do vício. Assim, no que se refere à
moralidade, bem como a Deus e à alma, o cristianismo empurra os homens para
fora do caminho que conduz ao conhecimento, e precipita-os no abismo da
incredulidade, do pessimismo e do vício. A Igreja é agora o último lugar onde
os homens iriam procurar ajuda contra os males e as misérias da vida, porque eles
sabem que a construção de igrejas e a repetição de ladainhas não influenciam
nem os poderes da natureza nem os conselhos das nações. Eles sentem
instintivamente que, desde o momento em que as Igrejas aceitaram o princípio da
conveniência, elas perderam o poder de chegar ao coração dos homens, e agora elas
só podem agir no plano externo, apoiando a ação do policial e do político.
A função da religião é reconfortar e encorajar a
humanidade na sua luta constante contra o pecado e o sofrimento. Isto só pode
ser feito apresentando à humanidade o nobre ideal de uma vida mais feliz após a
morte, e de uma vida mais digna sobre a terra, o que deve ser obtido nos dois
casos por um esforço consciente. O que o mundo necessita agora é de uma Igreja
que lhe fale da Divindade ou Princípio Imortal no homem como algo situado pelo
menos ao nível das ideias e do conhecimento dos tempos atuais. O cristianismo dogmático
não é adequado para um mundo que raciocina e pensa. Só aqueles que estão dispostos
a lançar-se a um estado de espírito medieval podem apreciar uma Igreja cuja
função religiosa (considerada como diferente da sua função social e política) é
manter Deus de bom humor enquanto os fiéis fazem o que creem que não é aprovado
por ele; cuja função é rezar para obter mudanças no clima; e, ocasionalmente,
agradecer ao Todo Poderoso por haver ajudado a massacrar o inimigo. Não é de “curandeiros”,
mas de guias espirituais que o mundo necessita hoje - um “clero” que lhe dê
ideais tão adequados para a inteligência do nosso século como o eram o Céu e o
Inferno, o Deus e o Diabo cristãos, na época de sombria ignorância e da superstição.
Será que o clero cristão atende, ou pode atender, esta necessidade? A miséria,
o crime, o vício, o egoísmo, a brutalidade, a falta de autorrespeito e de
autocontrole que caracterizam a nossa civilização moderna unem as suas vozes
num grito terrível e respondem - NÃO!
Qual o significado da reação contra o materialismo, um
materialismo cujos sinais hoje enchem o ar? O significado é que o mundo está mortalmente
cansado do dogmatismo, da arrogância, da autossuficiência e da cegueira
espiritual da ciência moderna, dessa mesma ciência moderna que os homens ainda
ontem saudavam como a sua libertadora do fanatismo religioso e da superstição cristã,
mas que, assim como o Diabo das lendas sacerdotais, reclama, como recompensa
pelos seus serviços, o sacrifício da alma imortal do homem. E, enquanto isso, o
que fazem as Igrejas? Elas dormem o sono pacífico obtido pelas doações e pela
influência social e política, enquanto que o mundo, a carne e o diabo se
apropriam dos seus segredos, dos seus milagres, dos seus argumentos e da sua fé
cega.
Os espíritas - ó Igrejas de Cristo! - roubaram o fogo dos
seus altares para iluminar as suas salas de sessões mediúnicas. Os salvacionistas
pegaram o seu vinho sacramental e se embriagam espiritualmente nas ruas; o infiel
roubou as armas com as quais vocês o venceram em outros tempos, e diz a vocês
triunfantemente: “O que vocês afirmam, já foi dito muitas vezes antes”. Teve o
clero alguma vez uma oportunidade tão esplêndida? As uvas da vinha estão
maduras, e só faltam os trabalhadores eficazes para a colheita. Se vocês dessem
ao mundo alguma prova, situada no padrão intelectual do que é verificável, de
que a Divindade - o Espírito imortal no homem - tem uma existência real como
fato da Natureza, será que os homens não os saudariam como salvadores que os
libertaram do pessimismo e do desespero, do pensamento enlouquecedor e
brutalizante de que não há para o homem outro destino a não ser um vazio
eterno, após alguns breves anos de duras fadigas e sofrimentos? Como seus
salvadores de uma luta assustadora pela satisfação material e pelas vantagens
do mundo, consequência direta da crença de que esta vida mortal é o começo e o
fim da existência?
Mas as Igrejas não possuem nem o conhecimento nem a fé
necessários para salvar o mundo, e a sua Igreja, Senhor Primaz, talvez ainda
menos que as outras, porque está com a pesada carga de oito milhões de libras
por ano à volta do pescoço. Vocês tentam em vão tornar o navio mais leve, lançando
pela borda, como lastro, as doutrinas que os seus antepassados consideravam
vitais ao cristianismo. O que mais pode fazer agora a sua Igreja, exceto fugir
da tempestade com os mastros desguarnecidos, enquanto o clero tenta,
debilmente, tapar os buracos do casco com a “versão revisada” da Bíblia, e
procura impedir que o navio naufrague com a sua pesada carga social e política,
levando para o fundo do mar a sua carga de dogmas e de doações?
Quem construiu a catedral de Cantuária, Senhor Primaz? Quem
inventou e deu vida à grande organização eclesiástica que torna possível a
existência de um Arcebispo de Cantuária? Quem estabeleceu as bases de um vasto
sistema de impostos religiosos que lhe dá quinze mil libras por ano e um
palácio? Quem instituiu os rituais e as cerimônias, as orações e as litanias
que, ligeiramente alteradas e despojadas de arte e ornamento, fazem a liturgia
da Igreja da Inglaterra? Quem extorquiu ao povo os orgulhosos títulos de
“divino reverendo” e “Homem de Deus”, dos quais o clero da sua Igreja se
apropria com tamanha confiança? Quem, de fato, exceto a Igreja de Roma? Falamos
sem espírito de inimizade. A teosofia viu a ascensão e a queda de muitas crenças,
e estará presente ao nascimento e à morte de muitas outras. Sabemos que a vida
das religiões está sujeita à lei. Se vocês receberam uma herança legítima de Roma,
ou tomaram posse pela violência, é uma questão que vocês devem decidir com os seus
inimigos e com a sua consciência; a atitude mental frente à sua Igreja é
determinada pelo seu valor intrínseco. Sabemos que se ela for incapaz de
desempenhar a verdadeira função espiritual de uma religião será certamente
exterminada, mesmo que o erro se encontre mais nas suas tendências hereditárias,
ou no que a rodeia, do que em si mesma.
A Igreja da Inglaterra, para usar uma comparação simples,
é como um trem que prossegue a sua marcha graças à velocidade adquirida antes de
o vapor ter sido cortado. Depois de ter deixado a linha principal, encontra-se
num desvio que não leva a lugar algum. O trem está agora quase parado, e muitos
dos seus passageiros o trocaram por outros meios de transporte. Os restantes
estão, na maioria, conscientes de que durante este tempo só podiam contar com o
pouco vapor que restou na caldeira depois que os fogos de Roma foram retirados.
Eles suspeitam que, neste momento, talvez já estejam apenas brincando de andar
de trem; mas o maquinista continua a assobiar, o controlador prossegue a sua
inspeção, examinando os bilhetes, os freios foram acionados como antes e,
convenhamos, não é uma brincadeira desagradável. As carruagens estão aquecidas
e confortáveis e o dia é frio, e, desde que recebam gorjetas, os empregados da
companhia são muito obsequiosos. Mas aqueles que sabem para onde querem ir não
estão assim tão contentes.
Durante vários séculos, a Igreja da Inglaterra conseguiu
a difícil proeza de navegar em duas canoas ao mesmo tempo, dizendo aos
católicos romanos: “Raciocinem!” e aos céticos: “Tenham Fé!” Foi regulando
constantemente as forças desta atitude de duas caras que ela pôde permanecer durante
tanto tempo em cima do muro. Mas agora, o próprio muro está caindo. A supressão
das doações e a separação entre Igreja e Estado pairam no ar. E o que a sua
Igreja invoca a seu favor? A sua utilidade. É útil ter muitos homens instruídos, morais, não-mundanos, espalhados
por todo o país, impedindo o mundo de esquecer completamente a ideia de
religião, e agindo como centros de ação benfeitora. Mas a questão agora já não
é a de repetir orações e dar esmola aos pobres, como era há quinhentos anos
atrás. As pessoas tornaram-se maiores de idade, e tomaram nas mãos o seu
pensamento e a direção dos seus assuntos sociais, individuais e até mesmo
espirituais, porque descobriram que o clero não sabe mais do que elas mesmas
sobre as “coisas do Céu”.
Mas a Igreja de Inglaterra, diz-se, tornou-se tão liberal
que todos devem apoiá-la. Realmente, pode-se fazer uma excelente imitação da
missa, ou ser um virtual Unitário, e ainda fazer parte do seu rebanho. Esta
bela tolerância, no entanto, significa apenas que a Igreja achou necessário
tornar-se um vasto campo comum, em que cada um pode armar a sua própria tenda e
agir como lhe aprouver, desde que participe na manutenção dos benefícios. A
tolerância e a liberalidade são contrárias às leis da existência de qualquer
igreja que crê na condenação divina, e a sua aparição na Igreja da Inglaterra
não é um sinal de vida renovada, mas antes da chegada da desagregação. Não
menos ilusória é a energia manifestada pela Igreja na construção de igrejas. Se
isto fosse um critério de medição do espírito religioso, que piedosa época
seria a nossa! Nunca o dogma esteve tão bem alojado, embora os seres humanos
sejam obrigados a dormir aos milhares nas ruas, e morram literalmente de fome à
sombra das suas majestosas catedrais, construídas em nome d´Aquele que não
tinha onde repousar a Sua cabeça. Terá Jesus dito a você, Sua Graça, que a
religião não se encontra no coração dos homens, e sim nos templos feitos pelas
mãos? Vocês não podem converter sua piedade em pedra e utilizá-la nas suas vidas;
e a história mostra que a petrificação do sentimento religioso é uma doença tão
mortal como a ossificação do coração. No entanto, ainda que as igrejas fossem
multiplicadas por cem, e que cada pastor se tornasse um centro de filantropia,
isso iria apenas produzir o trabalho que os pobres esperam dos seus
semelhantes, mas não dos seus líderes espirituais - em lugar daquilo que eles
pedem e não conseguem obter. Isso só colocaria em maior destaque a esterilidade
espiritual da Igreja e das suas doutrinas.
Aproxima-se o tempo em que o clero terá de prestar contas das suas ações. Você está pronto, Senhor Primaz, a explicar ao SEU MESTRE por que tem dado pedras aos Seus Filhos, quando eles lhe suplicavam por pão? Você sorri na sua imaginária segurança. Os servidores fizeram festas durante tanto tempo nos aposentos interiores da casa do Senhor, que pensavam que Ele certamente nunca voltaria. Mas Ele disse que Ele viria como um ladrão durante a noite; e eis! Ele está chegando já no coração dos homens. Ele está vindo para tomar posse do reino do Seu Pai, no único lugar em que o Reino Dele existe. Mas vocês não
O conhecem! Se as próprias Igrejas não estivessem sendo carregadas pela onda de
negação e de materialismo que dominou a sociedade, elas reconheceriam o germe
do espírito do Cristo crescendo com rapidez no coração de milhares de seres, a
quem agora classificam como infiéis e loucos. Reconheceriam neles aquele mesmo
espírito de amor, sacrifício de si mesmo e piedade imensa pela ignorância, pela
loucura e pelos sofrimentos do mundo, que surgiu em toda a sua pureza no
coração de Jesus, assim como surgiu no coração de outros Santos Reformadores em
diferentes épocas. Este espírito é a luz de toda verdadeira religião, e o
archote com o qual os teosofistas de todos os tempos trataram de iluminar os
seus passos, ao longo do caminho estreito que conduz à salvação - o caminho que
é percorrido por toda encarnação de CHRISTOS ou o ESPÍRITO DA VERDADE.
E agora, Senhor Primaz, expusemos muito respeitosamente a
você os pontos principais de divergência e desacordo que existem entre a teosofia
e as igrejas cristãs, e mostramos a unidade entre a teosofia e os ensinamentos
de Jesus.
Você viu a nossa profissão de fé, e conheceu quais são os
nossos protestos e as nossas queixas contra o cristianismo dogmático. Nós, um
punhado de indivíduos humildes, que não possuímos riquezas materiais nem
influência sobre o mundo, mas somos fortes no nosso conhecimento, estamos
unidos na esperança de cumprir a tarefa que você diz que lhe foi confiada pelo seu
MESTRE, mas que é tão tristemente negligenciada por esse colosso opulento e
dominador – a Igreja Cristã.
Nós nos perguntamos se você chamará isso de presunção. Será
que, nesta terra de liberdade de pensamento, de palavra e de ação, você não nos
responderá exceto pelo anátema habitual que a Igreja reserva para todo
reformador? Ou podemos esperar que as amargas lições da experiência, obtidas no
passado pelas Igrejas devido a esta política, terão mudado o coração e
iluminado o espírito dos seus dirigentes; e que o próximo ano, de 1888, verá os
cristãos estender-nos a mão com toda a simpatia e boa-vontade? Isso seria
apenas o reconhecimento de que o grupo relativamente pequeno chamado de Sociedade
Teosófica não é pioneiro do Anticristo, nem fruto do Maldoso, mas, o ajudante
prático, talvez o salvador da Cristandade, e que só está se esforçando por
fazer a obra que Jesus - assim como Buddha e os outros “filhos de Deus” que o
precederam - recomendou a todos os seus seguidores que realizassem, mas que as
Igrejas, tendo-se tornado dogmáticas, são inteiramente incapazes de fazer.
E agora, se Sua Graça puder provar que somos injustos em
relação à Igreja da qual você é o Chefe, ou em relação à teologia popular,
prometemos reconhecer publicamente nosso erro. Contudo - “QUEM CALA
CONSENTE”.
NOTAS DE HPB:
[1] Marcos, 4:11; Mateus, 13:11; Lucas,
8:10.
[2] “Religion: A Retrospect and Prospect”,
na publicação periódica Nineteenth
Century, Vol. XV, número 83, janeiro 1884.
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Quando esta carta foi publicada, em 1887, o arcebispo de Cantuária era
Edward White Benson. O texto acima faz parte da edição em 15 volumes dos “Collected
Writings” (“Escritos Reunidos”), de H. P. Blavatsky, publicados pela editora TPH,
Adyar, Índia, volume VIII, pp. 268-283.
Uma primeira tradução do texto, realizada pelo teosofista português Humberto
Álvares da Costa, apareceu na revista “Portugal Teosófico”, número 76,
de 1999, pp. 7 a 12. Em dezembro de 2009, foi feita a presente tradução especialmente para os nossos
websites associados. Durante o trabalho foi consultada a versão de Álvares da
Costa, com autorização do teosofista português.
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