Uma Chave Oculta Para
Entender o Ritmo da Vida
Helena P. Blavatsky
Nota Editorial:
Poucos meses depois da publicação do texto “O Número Sete”, Helena Blavatsky escreveu um artigo sobre a relação
oculta entre o número sete e o movimento teosófico.
Nele, a fundadora do movimento teosófico moderno afirma:
“O leitor atento deve haver ponderado bastante sobre a
misteriosa importância que o número Sete
parece ter tido sempre entre os antigos, tal como foi sucintamente resumido em
nosso número de junho (...). Na ocasião, foi afirmado que cientistas alemães
estão agora dando atenção a esta
manifestação da harmonia numérica e da periodicidade das operações da
Natureza.”
E acrescenta:
“Uma série de observações estatísticas, abrangendo alguns
séculos de acontecimentos históricos, tende a mostrar que os antigos devem ter
estado perfeitamente conscientes desta lei ao construir os seus sistemas de
filosofia. Na verdade, quando a ciência estatística estiver completamente
desenvolvida, como parece provável que um dia estará, haverá provas sempre mais
numerosas de que a evolução dos heróis, poetas, chefes militares,
filósofos, teólogos, grandes mercadores
e todos os outros personagens notáveis, pode ser avaliada com base na
potencialidade dos números, assim como o retorno de um cometa pode ser
calculado pelas regras de cálculos astronômicos. O sistema relativamente
moderno de seguros de vida está baseado sobre a expectativa de vida calculada a
partir da média de certas idades; e, ao mesmo tempo que nada parece ser tão
incerto quanto a longevidade provável de qualquer indivíduo isolado em uma
comunidade, nada é mais certo que o fato de que a chance de vida provável de qualquer pessoa,
na massa da população, pode ser
conhecida com base na média geral da vida humana.”
Blavatsky escreve:
“Na verdade, como
o sr. de Cazeneuve afirma corretamente no ‘Journal du Magnetisme’, a lei das
proporções numéricas é verificada em cada departamento das ciências físicas.
Vemos isso em química como a lei das proporções definidas e das múltiplas
proporções; em física, como a lei da ótica, da acústica, da eletricidade, etc.;
em mineralogia, nos fenômenos maravilhosos da cristalização; na astronomia, na
mecânica celeste. Bem pode o escritor citado acima dizer: ‘As leis físicas e morais têm entre si pontos de
contato tão infinitamente numerosos que, se ainda não chegamos ao ponto de
poder demonstrar a sua identidade, é, pelo menos, seguro afirmar que há entre
elas uma grande analogia’.”
Ela diz ainda:
“Tentamos mostrar de que modo, por uma espécie de
instinto comum, uma especial solenidade e um significado místico têm sido
atribuídos ao número Sete por todos os povos, em todos os tempos.” [1]
Como ocorre com outros escritos sobre filosofia
esotérica, há uma “sabedoria implícita” nas entrelinhas do texto “O Número Sete”. Ela poderá ser melhor
percebida se o artigo for lido pelo menos duas ou três vezes, em diferentes
ocasiões, com calma, lenta e meditativamente.
(Carlos Cardoso Aveline)
000
O Número Sete
Helena Blavatsky
Na antiguidade mais distante, atribuía-se um profundo significado aos números.
Qualquer povo que tivesse alguma coisa parecida com uma filosofia dava grande
destaque aos números na realização das suas práticas religiosas, no estabelecimento de dias de festivais, de símbolos,
dogmas, e até mesmo na distribuição geográfica dos impérios. O misterioso
sistema numérico de Pitágoras já não era nada novo quando surgiu, mais de 600
anos antes da era cristã. O significado
oculto dos algarismos e suas combinações faziam parte das meditações dos sábios
de todos os povos, e não está muito distante o dia em que, levado pela eterna
rotação cíclica dos acontecimentos, o nosso agora cético Ocidente terá de
admitir que, naquela periodicidade regular de eventos sempre recorrentes, há
algo mais que mero acaso. Os nossos sábios
ocidentais já começam a notar o fato. Ultimamente, eles têm aguçado sua atenção
e começado a especular sobre ciclos, números e tudo aquilo que, apenas alguns
anos atrás, eles haviam condenado ao esquecimento nos velhos arquivos da
memória, que nunca seriam reabertos
exceto para rir das superstições estranhas e idiotas dos nossos ancestrais não-científicos.
Uma destas novidades é que o velho jornal alemão Die Gegenwart apresentou a seus leitores
um artigo sério e erudito sobre “o significado do número sete”, e o chamou de “ensaio
sobre história cultural”. Depois de citar alguns parágrafos deste texto, nós
teremos algo a acrescentar, talvez. O autor diz:
“O número sete era considerado sagrado não só em todas as
nações com culturas próprias da
antiguidade e do Oriente, mas tem sido visto com a maior reverência também pelas nações mais recentes
do Ocidente. A origem astronômica deste número está confirmada além de toda
dúvida. O homem, sentindo desde tempos imemoriais que depende de forças
celestes, sempre e em todo lugar considerou que a Terra estava sujeita ao céu.
Assim, o corpo celeste maior e mais iluminado tornou-se para ele o
poder mais importante e mais elevado; e assim eram os planetas que toda a
antiguidade contou como sendo sete.
Ao longo do tempo, eles se transformaram em sete
divindades. Os egípcios tinham sete
deuses originais e mais elevados; os fenícios tinham sete kabiris; os persas, sete
cavalos sagrados de Mitra; os parsis, sete
anjos opostos a sete demônios, e sete moradas celestes em paralelo
com sete
regiões inferiores. Para representar essa ideia mais claramente em sua
forma concreta, os sete deuses eram
frequentemente descritos como uma divindade com sete cabeças. Todo o céu estava sujeito aos sete planetas; portanto, em quase todos os sistemas religiosos nós
encontramos sete céus.”
A crença no sapta
loka [2] da religião bramânica permaneceu fiel à filosofia arcaica; mas - quem sabe -
essa própria ideia originou-se em Aryavarta [3], este berço de todas as filosofias e fonte de todas as
religiões subsequentes! Se o dogma
egípcio da metempsicose ou
transmigração da alma ensinava que há sete
estágios de purificação e de progressiva perfeição, também é verdade que os
budistas tomaram dos arianos da Índia, e não do Egito, a sua ideia de sete estágios de progressivo
desenvolvimento da alma desencarnada, o que é simbolizado pelos sete andares e guarda-chuvas, que
gradualmente diminuíam à medida que
ficavam mais próximos do topo dos seus templos.
No misterioso culto a Mitra havia “sete portões”, sete altares,
sete mistérios. Os sacerdotes de muitas nações
orientais eram subdivididos em sete graus;
sete degraus levavam ao altar, e os templos eram
iluminados por candelabros de sete
velas. Várias lojas maçônicas têm, até hoje, sete e catorze passos.
As sete esferas
planetárias serviam como um modelo para divisões e organizações nos Estados. A
China era dividida em sete
províncias; a Pérsia antiga, em sete satrapias.
De acordo com uma lenda árabe, sete
anjos esfriam o sol com gelo e neve, para que ele não queime a Terra
reduzindo-a a cinzas e brasas; e sete mil
anjos animam o sol e o colocam em movimento a cada manhã. Os dois rios mais
velhos do Oriente - o Ganges e o Nilo - têm, cada um, sete desembocaduras. O Oriente tinha em sua antiguidade sete principais rios (o Nilo, o Tigre, o
Eufrates, o Oxus, o Yaksart, o Arax e o Indo); sete tesouros famosos; sete cidades cheias de ouro; sete maravilhas do mundo, etc. O número sete cumpria um papel igualmente
importante na arquitetura dos templos e palácios. O famoso pagode de Churingham
é rodeado por sete muros quadrados,
pintados em sete cores diferentes, e
no meio de cada muro há uma pirâmide de sete
andares; assim como nos tempos antediluvianos o templo de Borsippa, agora o
Birs-Nimrud, tinha sete plataformas, que simbolizavam os sete círculos concêntricos das sete esferas, cada uma construída com
peças de cerâmica e metal que correspondiam com a cor do planeta regente da
esfera simbolizada.
Estes são todos “restos do paganismo” - dizem-nos; são traços
“das superstições antigas, que, como corujas e morcegos em um subterrâneo
escuro, voaram para longe e nunca retornarão em direção à luz gloriosa do
Cristianismo” - uma afirmação, aliás, extremamente fácil de desmentir. O autor
do artigo em questão coletou centenas de exemplos para mostrar que não só os
cristãos antigos, mas também os cristãos modernos preservaram o número sete, e de modo tão sagrado como sempre
foi preservado; porém, na verdade, poderiam ser encontrados milhares de exemplos. Pode-se começar
com o antigo cálculo astronômico e religioso dos romanos pagãos, que dividiam a
semana em sete dias, e consideravam o
sétimo dia como o mais sagrado, o Sol, o Domingo ou Dia do Sol de Júpiter, para o qual todos os povos cristãos - e
especialmente os protestantes - fazem homenagens até o dia de hoje. Se por
acaso alguém disser que não é por causa dos romanos pagãos mas dos judeus
monoteístas que temos o domingo, então por que não é o sábado, o verdadeiro
“sabath”, que é tido como dia santo, ao
invés de domingo, o dia do Sol?
Se no “Ramayana” [4]
sete pátios são mencionados nas
residências dos reis hindus, e geralmente sete
portões levavam aos famosos templos e cidades de antigamente, então por que
os habitantes de Friesland [5] aderiram
no século 10 da era cristã estritamente ao número sete ao dividir suas
províncias, e insistiam em pagar sete “pfennigs”
de contribuição? O Império Sagrado Romano e Cristão tem sete Kurfursts ou Eleitores. Os húngaros
emigraram sob a liderança de sete duques
e fundaram sete cidades, chamadas Semigradyá (agora Transylvania). Se a Roma pagã foi construída em sete colinas, Constantinopla tinha sete nomes - Bizâncio, Antonia, Nova Roma, cidade de Constantino, a
Separadora das Partes do Mundo, o Tesouro do Islam, Istambul - e também era
chamada de “a cidade das sete
colinas”, e “a cidade das sete
torres”. Com os muçulmanos, “ela foi sitiada sete vezes e tomada depois de sete
semanas pelo sétimo dos sultões
Osman.” De acordo com as ideias dos povos orientais, as sete esferas planetárias são representadas pelos sete anéis usados pelas mulheres em sete partes do corpo - na cabeça, no
pescoço, nas mãos, nos pés, nas orelhas, no nariz, ao redor da cintura - e
estes sete anéis ou círculos são
presenteados até hoje pelos candidatos orientais às suas noivas; a beleza da
mulher consiste, segundo as canções persas, de sete encantos.
Os sete
planetas permanecem sempre à mesma distância uns dos outros, e giram no mesmo
caminho; destes fatos surge a ideia da eterna harmonia do universo. Em função
disso o número sete tornou-se
especialmente sagrado para os antigos, e sempre preservou a sua importância
entre os astrólogos. Os pitagóricos consideravam o algarismo sete como a imagem e o modelo da ordem e
da harmonia divinas na natureza. Era o número que continha duas vezes o número
sagrado três ou “tríade”, ao qual era
somado o “um” ou a divina mônada: 3 + 1 + 3.
Assim como a harmonia da natureza soa no teclado do espaço, entre os sete planetas, assim também a harmonia
dos sons audíveis ocorre em um plano menor com a escala musical dos sempre
recorrentes sete tons. Daí, os sete canudos na syrinx [6] do deus Pan (ou a Natureza), e a
proporção gradualmente decrescente das suas formas, representando a distância
entre os planetas e entre o último deles e a Terra - e, a lira de sete cordas de Apolo [7]. Consistindo de uma união entre o
número três (o símbolo da tríade
divina para todos os povos, cristãos e pagãos) e o número quatro (símbolo das forças ou elementos cósmicos), o número sete aponta simbolicamente para a união
da Divindade com o universo; esta ideia pitagórica foi aplicada pelos cristãos -
(especialmente durante a idade média ) - que usaram amplamente o número sete no simbolismo da sua arquitetura
sagrada. Assim, por exemplo, a famosa catedral de Colônia e a Igreja Dominicana
em Regensburg mostram este número até nos menores detalhes arquitetônicos.
Este número místico não tem importância menor no mundo do
intelecto e da filosofia. A Grécia tinha sete
sábios, a idade média cristã tinha sete
artes livres (gramática, retórica, dialética, aritmética, geometria, música,
astronomia). O Sheik-ul-Islam muçulmano
convoca para todo encontro importante sete
“ulems”. Na idade média, um voto solene tinha que ser feito diante de sete testemunhas, e aquele que o assumia
era aspergido sete vezes com sangue. As
procissões ao redor dos templos eram feitas sete
vezes, e os devotos tinham que ajoelhar-se sete
vezes antes de pronunciar um voto. Os peregrinos muçulmanos dão a volta ao
redor de Kaaba sete vezes, quando
chegam. Os vasos sagrados eram feitos de ouro e prata purificados sete vezes. Os locais dos velhos
tribunais alemães eram assinalados com sete
árvores, sob as quais eram colocados sete
“Schoffers” (juízes), que requeriam sete
testemunhas. O criminoso era ameaçado com um castigo sétuplo, e era exigida uma purificação sétupla, assim como era prometida uma recompensa sétupla para o virtuoso. Todos sabem da
grande importância atribuída no Ocidente ao sétimo
filho de um sétimo filho. Todos os
personagens míticos são geralmente descritos como tendo sete filhos. Na Alemanha, o rei, e agora o imperador, não pode
recusar-se a ser padrinho de um sétimo
filho, ainda que seja de um mendigo. No Ocidente, ao marcar o término de um
conflito ou ao assinar um tratado de paz, os governantes trocam sete, ou
quarenta e nove (7 x 7), presentes.
Para tentar citar todas as coisas incluídas neste número
místico, seria necessária uma biblioteca. Nós encerraremos citando apenas mais
alguns fatos da região do demoníaco. De acordo com as autoridades nesses
assuntos - o antigo clero cristão - um contrato com o diabo tinha que ter sete parágrafos, tinha validade de sete anos e era assinado sete vezes; todas as bebidas mágicas
preparadas com ajuda do inimigo da
humanidade consistiam de sete ervas;
ganha aquele bilhete de loteria que é retirado por uma criança de sete anos. As guerras lendárias duravam sete anos, sete meses e sete dias; e
os heróis combatentes são sete, setenta, setecentos, sete mil e setenta mil. As princesas, nos contos de
fadas, permaneciam sete anos sob um
feitiço, e as botas do famoso gato - o marquês de Carabas - eram de sete léguas. Os antigos dividiam o corpo
humano em sete partes; a cabeça, o
peito, o estômago, duas mãos e dois pés; e a vida do homem era dividida em sete períodos. Os dentes de um bebê começam a nascer aos sete meses; uma criança começa a
sentar-se após catorze meses (2 x 7);
começa a caminhar depois de vinte e um
meses (3 x 7); começa a falar depois de vinte
e oito meses (4 x 7); deixa de mamar no peito depois de trinta e cinco meses (5 x 7); aos catorze anos (2 x 7) , ele começa
finalmente a formar a si mesmo; aos vinte
e um anos (3 x 7) ele deixa de crescer. A altura média do homem, antes que
a humanidade degenerasse, era de sete
pés; disso surgiram as velhas leis ocidentais determinando que os muros dos
jardins deviam ter sete pés de
altura. Em Esparta e na antiga Pérsia a
educação dos garotos começava aos sete
anos. E nas religiões cristãs - entre os católicos romanos e os gregos - a
criança não é considerada culpada por qualquer crime até sete anos de idade, e esta é a idade indicada para que comece a
confessar-se.
Se os hindus pensarem no seu Manu e no que os velhos
Shastras [8] contêm, encontrarão,
sem dúvida, a origem de todo este simbolismo. Em nenhum lugar o número sete exerceu um papel tão importante
como entre os antigos Árias da Índia. Basta pensar nos sete sábios - os Sapta Rishis;
os Sapta Loka - os sete mundos; os Sapta Pura - as sete
cidades sagradas; as Sapta Dvipa - as
sete ilhas sagradas; os Sapta Samudra - os sete mares sagrados; as Sapta
Parvatta - as sete montanhas
sagradas; os Sapta Arania - os sete desertos; as Sapta Vriksha - as sete árvores
sagradas; e assim por diante, para que se veja a probabilidade da hipótese. Os
Árias nunca adotavam nada de outra
cultura, nem os brâmanes, que eram demasiado orgulhosos e exclusivistas para
fazer isso. De onde vem, então, o
mistério e a sacralidade do número sete?
NOTAS:
[1] “The Number Seven and Our
Society”, em “Theosophical Articles”, H. P. Blavatsky, Theosophy Company, Los
Angeles, 1981, volume I, pp. 351-352.
[2] Sapta loka: em sânscrito, as setes regiões mais elevadas, a partir
da Terra. (CCA)
[3] Aryavarta: o nome antigo da Índia. (CCA)
[4] Ramayana: famoso poema épico
hindu. (CCA)
[5] Friesland: região norte dos
Países Baixos (Holanda). (CCA)
[6] Syrinx: a gaita musical de Pan. Syrinx
era o nome de uma ninfa pela qual Pan se apaixonou. Para escapar de Pan, a
ninfa foi transformada em um junco. Em homenagem à ninfa, Pan deu então o nome
de “Syrinx” à sua gaita musical de sete canudos. (“Dicionário Oxford de
Literatura Clássica”, Jorge Zahar Editor, versículo “Pan”.) (CCA)
[7] Apolo era uma divindade solar: esta
é uma referência aos sete logoi. (CCA)
[8] Shastras: em sânscrito, tratados
ou livros sobre assuntos divinos e sobre ética. (CCA)
000
O título original do texto acima é “The
Number Seven”. Ele foi publicado pela primeira vez em “The Theosophist”,
junho de 1880, quando esta revista era editada na Índia por H. P. Blavatsky. A
tradução foi feita de “Theosophical Articles”, H. P. Blavatsky, Theosophy
Company, Los Angeles, volume I, 512 pp., 1981, ver pp. 345-350.
000