A Criatividade na Teosofia da Vida Diária
Joaquim Duarte Soares
O caminho da
sabedoria é fonte de paz e felicidade e começa com o conhecimento de si mesmo.
A
filosofia esotérica ensina que aquilo a que chamamos personalidade, o quaternário
inferior, é um aglomerado de skandhas, ou o conjunto de registos
cármicos de vidas passadas. Os skandhas constituem a nossa herança
cármica. Estão compostos pela soma de tendências, hábitos, defeitos e
qualidades, e são ativados a cada nova encarnação. De um ponto de vista oculto,
podemos dizer que somos filhos de nós mesmos.
Um
dos efeitos do estudo sério da teosofia clássica e do esforço por viver o
ensinamento é que passamos a desafiar a ignorância acumulada em nós
próprios.
O
ser humano é complexo. Trazemos em nós hábitos e tendências que alimentam a
ignorância, produzindo sofrimento desnecessário. Ao mesmo tempo, também possuímos
em maior ou menor grau padrões energéticos sintonizados com a sabedoria e que produzem
felicidade.
O
desafio está em concentrar nossa energia e vontade naquilo que é positivo e
deixar de alimentar o que é negativo. A arte de substituir hábitos nocivos por
hábitos saudáveis é central na aprendizagem da sabedoria. [1]
Um
pequeno poema intitulado “Hábito” (“Habit”, no original em inglês) descreve a
importância de nos mantermos vigilantes em relação aos nossos hábitos:
“O
hábito no princípio é apenas um fio de seda,
Belo
como as delicadas teias aladas que balançam
Nos
raios quentes de sol de um dia de verão;
Um
riacho raso, ondulando sobre o seu leito;
O
broto da planta, antes de suas raízes se espalharem;
Um
espinho em teu caminho, ainda não endurecido;
Um
filhote de leão que ainda não fareja a presa;
Uma
pequena criança risonha obedientemente conduzida.
Cuidado!
Esse fio pode prender-te como um grilhão;
Esse
riacho se acumular num mar fatal;
Essa
muda se transformar numa árvore cheia de nós;
Esse
espinho, crescido e duro, pode ferir-te e trazer dor;
O
filhote brincalhão revelar seus dentes assassinos;
A
criança, um gigante, esmagar-te sob seus pés.” [2]
Ao
adquirirmos consciência dos hábitos instalados e das suas consequências para
nós e para os outros, temos a possibilidade de tomar a vida em nossas mãos e
decidir qual o tipo de carma que queremos plantar a cada dia.
Avançar
no caminho pressupõe o plantio de bons hábitos e de padrões vibratórios
corretos. Devemos elevar-nos acima dos velhos skandhas da ignorância individual
e coletiva. Este processo é probatório e contém múltiplos desafios e lições
valiosas. O progresso acontece quando aprendemos com os erros e acertos
enquanto perseveramos no esforço. O caminho é percorrido ao longo de várias
vidas, no ritmo e no modo de cada um. Podemos ler no texto “Uma Batalha
Diária”:
“A
luta por agir de modo correto é simultaneamente física, emocional e mental. Deve-se
estabelecer melhores hábitos. É necessário reduzir ou eliminar padrões errados
de vibração. Ao preparar a si próprio através de intenções nobres, pensamentos
adequados e ações justas, o indivíduo purifica seu instrumento - o eu inferior
- e se liberta gradualmente de ilusões e sofrimentos desnecessários. Assim ele
alcança uma paz que é interna, e não externa. O sofrimento humano será seu até
o final, mas ele aprenderá a ser maior que a dor.” [3]
Desenvolvendo
a capacidade de auto-observação, começamos a discernir os mecanismos
psicológicos de apego a um variado conjunto de hábitos inconscientes que
trazemos do passado. Esses elementos funcionam em nossa aura como bloqueios à
expansão do magnetismo curativo do amor que emana do coração.
Passo
a passo, vamos percebendo, não só mentalmente mas de forma vivencial, que nós
não somos o nosso corpo, nem o que sentimos, nem o que pensamos.[4] A nossa “personalidade”, o eu
inferior, é sim um valioso instrumento - o templo da Alma imortal. Nossa tarefa
sagrada é purificá-lo para que nele brilhe a luz do Eu Superior.
O
fato de que tudo é cíclico na vida é um aspecto a levar em conta em nossos
esforços. Robert Crosbie afirma:
“O
jeito de corrigir hábitos é reconhecer
que os pensamentos errados irão retornar, e que mesmo os pensamentos que não
são bem-vindos retornam obrigatoriamente devido à lei. Por isso, estabeleça um
pensamento oposto - ou um sentimento
oposto, ou comece uma ação na direção oposta. Continue fazendo isso da melhor
maneira que puder, e finalmente você vai destruir o velho ciclo e estabelecer
outro, novo.” [5]
Algumas
linhas mais adiante Crosbie comenta:
“...É
observando o retorno das impressões mentais que podemos corrigir os hábitos. Hábitos
de qualquer espécie são criados por repetição. Na primeira vez que fazemos
algo, ainda não há um hábito; mas se repetirmos a ação, e continuarmos repetindo,
ela finalmente se tornará automática. Com o conhecimento da lei dos ciclos, os
hábitos ficam dentro dos limites do nosso controle inteligente.”
Uma
visão de longo prazo e uma meta elevada contribuem para aumentar o desapego em
relação às marés e aos diferentes ciclos da vida. Mesmo pequenos passos dados
são valiosos e todas as tentativas de viver um ideal altruísta são importantes.
Nada se perde. O que importa é tentar, sempre.
Bons
hábitos em relação a pensamento, estudo, alimentação e saúde, assim como a dedicação
a uma causa nobre, abrem espaço para a vivência do que é bom, belo e verdadeiro.
A cada dia, temos a possibilidade de viver interiormente a paz e a felicidade.
NOTAS:
[1] Vale a pena ler o texto “Vivendo na
Atmosfera da Teosofia”, de Carlos Cardoso Aveline, que pode ser encontrado em
nossos websites associados.
[2]
O
poema, de autor anônimo, foi publicado na revista “Lucifer”, edição de maio de
1890, editada por HPB. (A palavra “Lúcifer” significa “portador da luz” e se
refere ao planeta Vênus: foi distorcida na Idade Média por teólogos
ignorantes.) O original em inglês do poema está disponível em nossos websites.
[3] O texto foi
escrito por C. C. Aveline e está publicado em nossos websites.
[4] A ideia está colocada em um trecho de
Robert Crosbie que encontramos no artigo “A Ioga do Dever”, de C. C. Aveline.
[5] Reproduzido do
artigo “Os Ciclos dos Hábitos”, de Robert Crosbie, que pode ser lido em nossos
websites associados.
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O artigo acima é
reproduzido da edição de maio de 2015 de “O
Teosofista”, pp. 16 a 18.
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