14 de outubro de 2016

O Que é um Teosofista?

A Importância de Procurar a Verdade Por Si Mesmo

Helena P. Blavatsky




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Nota Editorial de 2017:

No texto a seguir, fragmento de um artigo maior,
Helena Blavatsky menciona a Sociedade Teosófica original,
que deixou de existir durante a década de 1890. Há hoje uma vasta
diversidade organizativa nas associações teosóficas. Onde se lê
“Sociedade Teosófica”, portanto, deve-se ler “Movimento Teosófico”.

(Carlos Cardoso Aveline)

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..... Todos os pensadores e investigadores originais do lado oculto da natureza, sejam materialistas - aqueles que veem na matéria “a promessa e a potencialidade de toda força terrestre” - ou sejam espiritualistas (aqueles que descobrem no espírito a fonte de toda energia e também de toda matéria) foram e são, propriamente falando, teosofistas. Porque, para ser teosofista, não é necessário reconhecer a existência de qualquer Deus ou divindade especial.

Basta adorar o espírito da natureza viva, e tentar identificar-se com ele. Trata-se de reverenciar esta Presença, a Causa invisível, que no entanto está sempre se manifestando em seus resultados incessantes; o Proteus intangível, onipotente, e onipresente: indivisível na sua Essência e na sua forma indefinida, e no entanto aparecendo sob todas as formas e sob cada uma delas; e que está aqui e lá, em todo lugar e em lugar algum; que é TUDO e NADA; ubíquo e no entanto uno; a Essência que preenche, reúne, amarra e contém todas as coisas, e que está presente em tudo.

Pode-se ver agora, cremos, que, quer sejam classificados como teístas, panteístas ou ateus, tais homens estão próximos de todos os outros.

Seja como for, uma vez que um estudante abandona o velho e desgastado caminho da rotina e entra no caminho solitário do pensamento independente - em direção à divindade - ele é um teosofista. É um pensador original, um buscador da verdade eterna e que possui “uma inspiração própria” para resolver os problemas universais.

A teosofia é aliada de todo aquele que busca seriamente, da sua própria maneira, obter um conhecimento do Princípio Divino, da relação do homem com este Princípio e das manifestações deste Princípio na natureza. Ela é igualmente aliada da ciência honesta - algo que é diferente de muita coisa apresentada como ciência exata, física - enquanto esta última não invadir indevidamente os domínios da psicologia e da metafísica.

E é também aliada de toda religião honesta - isto é, qualquer religião que está disposta a ser avaliada pelos mesmos critérios que aplica aos outros. Os livros que contêm a verdade mais autoevidente devem ser inspirados (não revelados). Mas, devido ao elemento humano presente neles, a teosofia vê todos os livros como inferiores ao Livro da Natureza, para cuja leitura e compreensão corretas os poderes inatos da alma devem estar altamente desenvolvidos. As leis do plano ideal só podem ser percebidas pela função intuitiva; elas estão acima do território da argumentação e da dialética, e ninguém pode entendê-las ou apreciá-las corretamente através de explicações dadas por outra mente, mesmo que esta mente pretenda possuir uma revelação direta. E como a Sociedade [Teosófica], além de permitir o mais amplo exame dos reinos do puro ideal, tem uma igual firmeza na esfera dos fatos, o seu respeito pela ciência moderna e pelos seus representantes corretos é sincero. Apesar da grande falta de uma intuição espiritual mais elevada por parte dos representantes da ciência física moderna, a dívida do mundo para com eles é imensa; portanto, a Sociedade apoia o protesto nobre e indignado do Rev. O. B. Frothingham contra aqueles que subestimam o valor dos serviços prestados pelos nossos grandes naturalistas. “Falam da ciência como se ela fosse não-religiosa, ateísta”, disse ele em uma palestra recente em Nova Iorque. “A ciência está criando uma nova imagem de Deus. É só graças à ciência que nós temos uma concepção de um Deus vivo. Se não nos tornamos materialistas um dia destes sob o efeito enlouquecedor do protestantismo, será graças à ciência, porque ela está libertando-nos das ilusões medonhas que nos burlam e atrapalham, e porque ela nos coloca no caminho para saber como raciocinar sobre as coisas que vemos…”.

É também graças ao trabalho incessante de orientalistas como Sir W. Jones, Max Müller, Burnouf, Colebrooke, Haug, de Saint-Hilaire e tantos outros, que a Sociedade, como um corpo, sente um igual respeito e uma veneração pelas religiões védica, budista, zoroastrista e outras religiões antigas do mundo, e tem um sentimento fraterno semelhante em relação aos seus membros que são hindus, cingaleses [1], pársis [2], jainistas, hebreus e cristãos, e que são estudantes individuais do “ser”, da natureza e do que é divino no mundo natural.

Nascida nos Estados Unidos da América do Norte, a Sociedade foi formada sobre o modelo da sua terra natal. Aquele país, omitindo o nome de Deus na sua Constituição para que não houvesse pretexto algum dia que justificasse fazer uma religião estatal, atribui absoluta igualdade em suas leis a todas as religiões. Todas elas apoiam e são por sua vez protegidas pelo Estado. A Sociedade [Teosófica], modelada sobre esta Constituição, deve ser justamente chamada de “uma República da Consciência”.

Fica claro, agora - pensamos nós - por que motivo os nossos membros, como indivíduos, estão livres para pertencer ou não a qualquer crença que quiserem, uma vez que não tenham a pretensão de que só eles possuem o privilégio da consciência, e que não tentem, portanto, impor a sua opinião sobre outros. Neste aspecto as regras da Sociedade são bastante restritas. Ela tenta agir com base na sabedoria do velho axioma budista que diz: “Honra a tua própria religião, e não calunies a religião dos outros”. O axioma tem um reflexo no nosso século atual [3] na “Declaração de Princípios” de Brahmo Samaj [4], que afirma com nobreza: “nenhuma seita será caluniada, ridicularizada ou odiada”. [5] Na seção VI dos Estatutos Revisados da Sociedade Teosófica, adotados recentemente em assembleia geral, em Bombaim (Mumbai), há esta determinação:

“Não é correto que qualquer dirigente da Sociedade expresse, por palavras ou atos, qualquer hostilidade ou preferência por qualquer seção (divisão sectária ou grupo dentro da Sociedade) mais do que em relação a outra. Todas devem ser vistas da mesma forma, recebendo a mesma atenção e o mesmo apoio. Todos os [membros da Sociedade] têm o mesmo direito de colocar os traços essenciais das suas crenças religiosas para julgamento de um mundo imparcial.”

Nas suas funções individuais, os membros podem, quando atacados, quebrar ocasionalmente esta Regra, mas os dirigentes não têm tal possibilidade, e a Regra é aplicada estritamente durante as reuniões. Porque acima de todas as seitas está a Teosofia no seu sentido abstrato. A Teosofia é demasiado ampla para que qualquer uma das seitas a contenha, mas contém facilmente a todas elas.

Para concluir, podemos dizer que, sendo mais ampla e muito mais universal em suas visões do que qualquer Sociedade meramente científica que exista hoje, a Sociedade Teosófica possui além da ciência uma crença na possibilidade, e uma vontade determinada de investigar aquelas regiões espirituais desconhecidas que a ciência exata pretende que seus seguidores jamais explorem. E ela tem uma qualidade que nenhuma religião possui, porque não faz diferença entre o pagão, o judeu e o seguidor do cristianismo. É neste espírito e sobre a base da Fraternidade Universal que foi estabelecida a Sociedade.

Indiferente em relação à política [6], hostil aos sonhos insanos do socialismo e do comunismo, que ela rejeita, porque ambos são apenas conspirações disfarçadas da força bruta e da preguiça contra o trabalho honesto, a Sociedade dá pouca importância à administração externa e humana do mundo material. O conjunto das suas aspirações está voltado para as verdades ocultas dos mundos visíveis e invisíveis. O fato de que o homem físico esteja sob a orientação de um império ou de uma república diz respeito apenas ao ser material. O seu corpo pode ser escravizado; quanto à sua alma, ele tem o direito de dar a seus governantes a orgulhosa resposta de Sócrates aos seus juízes. Eles não têm controle nem influência sobre o homem interno.

Esta é, pois, a Sociedade Teosófica, e estes os seus princípios, as suas múltiplas metas e seus objetivos. Será necessário ficar perplexo diante das concepções erradas alimentadas no passado pelo público em geral, e diante do modo fácil como o inimigo tem podido rebaixá-la junto à opinião pública? O verdadeiro estudante tem sido sempre um recluso, um homem de silêncio e de meditação. Seus hábitos e sua maneira de ser têm tão pouco em comum com o mundo agitado que, enquanto ele está estudando, os seus inimigos e detratores têm oportunidades irrestritas. Mas o tempo cura tudo e as mentiras não resistem ao tempo. Só a verdade é eterna.

NOTAS:

[1] Cingaleses: nativos do Ceilão, atual Sri Lanka. (CCA)

[2] Pársis - a palavra significa “persas”, nativos da Pérsia, atual Irã, e se refere aos seguidores do zoroastrismo que emigraram para a Índia visando evitar a perseguição religiosa promovida pelos muçulmanos. (CCA)

[3] Isto é, no século 19. (CCA)

[4] Brahmo Samaj - movimento reformador do hinduísmo. (CCA)

[5] Por outro lado, o cidadão e o teosofista devem discutir com respeito os pontos falhos de todas as religiões, já que elas são humanas e imperfeitas, assim como o movimento teosófico o é. Ninguém pode impor a sua opinião aos outros, mas cada um tem o direito de expressar respeitosamente suas opiniões. HPB fez críticas severas aos erros das mais diversas religiões. (CCA)

[6] HPB se refere aqui à política partidária, eleitoral, e à política vista como luta entre “direita” e “esquerda”. O próprio fato de a teosofia ser contrária ao marxismo, como afirma HPB nesta mesma frase, mostra que não é indiferente à política quando ela é examinada desde o ponto de vista filosófico. A teosofia ensina que o ser humano evolui de dentro para fora, a partir da alma, e não através da implantação de algum sistema político. Neste mesmo artigo, ela afirmou mais acima que o movimento teosófico original foi criado com base na estrutura político-institucional dos Estados Unidos, o que significa uma apreciação da prática democrática e do respeito aos direitos humanos. Veja em nossos websites associados os artigos “A Teosofia e a Segunda Guerra Mundial”, “Blavatsky, ONU e Democracia”, e “Blavatsky, Judaísmo e Nazismo”. (CCA)

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O texto acima faz parte do artigo What Are The Theosophists?”, publicado pela primeira vez em 1879 e incluído na coletânea de três volumes “Theosophical Articles”, de Helena P. Blavatsky, Theosophy Co., Los Angeles, volume I, 1981 - ver pp. 48-55. Nos “Collected Writings” de HPB, o texto está no volume II, pp. 98-106. Em português, parte dele está também publicada na edição de março de 2010 de “O Teosofista”.

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Em 14 de setembro de 2016, depois de uma análise da situação do movimento esotérico internacional, um grupo de estudantes decidiu criar a Loja Independente de Teosofistas. Duas das prioridades da LIT são tirar lições práticas do passado e construir um futuro saudável

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