Construindo a Harmonia
Entre Congresso e Governo
Michel Temer
André Franco
Montoro (esquerda) e Michel Temer, em
1986
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Nota Editorial
de 2017
O artigo a seguir faz um exame da estrutura do
Estado
brasileiro, demonstrando simpatia pelo
parlamentarismo.
Foi publicado pela primeira vez em 22 de julho de
1999, e
é aqui reproduzido do livro “Democracia e Cidadania”, de
Michel Temer, Malheiros Editores, SP, 2006, 288 pp.,
pp. 43-45.
(Carlos Cardoso Aveline)
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Além de evocar
seriedade, dignidade, compostura, política, coerência, modéstia (atributo da
grandeza) Franco Montoro, exemplo para todos, evoca parlamentarismo. Esta foi
uma de suas últimas bandeiras. Nos seus 82 anos, ágil como nunca, foi a mim
para insistir na instalação da comissão especial que examinaria o tema.
Instalei-a. E vejo, hoje, que a luta política de Montoro pelo parlamentarismo é
simétrica com as suas teses de descentralização, participação e emprego. Democrata,
Montoro sempre ensinou que a centralização (trazer tudo para um mesmo centro) é
prejudicial à democracia.
O
Presidente, no presidencialismo, é um monarca a prazo certo, dizia. Tudo gira
em torno dele. Inclusive as crises. Quando a crise se avoluma, surgem as
propostas de renúncia do Presidente ou de seu impedimento. Até nos Estados
Unidos é assim. Exemplos recentes o revelam. E renúncia ou impedimento é crise
agravada, não resolvida. Isto quando não ocorrem movimentos contestadores
revolucionários para derrubar o Presidente. A composição de forças políticas,
no presidencialismo, por sua vez, é extremamente complicada. Especialmente em
país como o nosso com grande número de partidos.
No
Brasil, o Presidente é eleito pela maioria do povo, mas por uma minoria
partidária. Foi assim com [Fernando] Collor
(eleito pelo PRN) e com Fernando Henrique (integrante do PSDB). Depois, é
preciso costurar o apoio político congressual, o que acarreta inúmeras críticas
aos partidos políticos e ao Legislativo.
Diria
- sem medo de errar - que o Executivo e o Legislativo praticamente se
antagonizam, na medida em que, de um lado, exige-se a independência absoluta do
Legislativo como se este também não fosse “governo” e, de outro, quando o
Presidente consegue montar sua base de apoio, o faz sob a acusação de
fisiologismo e outras práticas condenáveis.
Esquecem-se,
aqueles que cobram independência integral do Legislativo, que a Constituição
também determina a harmonia entre os Poderes, o que significa trato
institucional respeitoso e integrativo. Como, de resto, não são poucas as vezes
em que se exige do Presidente, “autoridade”, como se esta fosse um atributo do
governante e não da lei.
A
autoridade provém da lei, não da pessoa física eventualmente ocupante do poder.
Como o presidencialismo é sistema centralizado de poder, é desse centro, o
Presidente, que se espera a solução de todos os problemas. Este fenômeno, em
democracias frágeis, gera o caciquismo, o caudilhismo, o populismo demagógico.
Exige-se do Presidente esse papel. A polícia do Pará tira a vida de
“sem-terra”? Cobra-se do Presidente providência, nada importando o sistema
federativo, segundo o qual segurança pública é competência do Estado. Índio pataxó
é morto, queimado, embaixo de viaduto em Brasília? A responsabilidade é do
Presidente.
São,
como se vê, pequenos exemplos reveladores do fenômeno “centralização do Poder”.
Ademais disso, nunca é suficientemente respeitosa a relação dos partidos políticos
e do Legislativo com o Presidente e deste com aqueles. Mesmo quando a relação é
com a sua base de apoio. As intrigas vicejam; as brigas por espaços de poder
são constantes; os partidos criticam o Presidente e este critica os partidos.
As ironias nascidas desse trato desrespeitoso em nada contribuem para a
evolução dos costumes políticos. A conduta de todos deveria pautar-se por certa
cerimônia que as instituições legais determinam.
É
interessante notar que, no nosso presidencialismo há, sempre, a busca de alguém
que faça as vezes de interlocutor qualificado com a classe política e a própria
administração. A figura do articulador político é recorrente no sistema. Sempre
se pensa em alguém que faça a ligação direta com o Parlamento e deste com a
Administração. Talvez para deixar o Presidente exercer, com mais tranquilidade,
a Chefia de Estado (representação externa e participação nas linhas gerais da
política administrativa interna).
Montoro,
quando Governador, ao nomear Roberto Gusmão, Secretário do Governo, enfatizou,
em reunião do Secretariado, que ele seria o seu Primeiro Ministro, ou seja,
aquele que cuidaria da política administrativa do Estado. Esse gesto simbólico
teve o objetivo de evidenciar a importância da descentralização do poder.
Penso
que devemos reativar o tema. Revitalizá-lo mediante discussão. Verificar quais
os limites da competência do Chefe do Estado e do Chefe do Governo.
Transferindo esta última atividade ao Parlamento, estaremos eliminando crises
que, no Presidencialismo, se arrastam, paralisam o Governo e quando se
resolvem, deixam sequelas.
No
parlamentarismo, sabidamente, a composição de forças é mais natural, pois é de
sua essência a coalizão política com vistas ao exercício governamental. Não
costuma remanescer trauma político ou institucional quando há mudança
administrativa. E o partido ou a coalizão governante é, sempre, a que foi
vitoriosa nas urnas. Fui, no passado, presidencialista, mas a experiência que
tenho vivido nestes últimos 8 anos, no Parlamento, indica-me, mais uma vez, que
Montoro tinha razão. Por isso, em próximo artigo, analisarei os projetos que
tramitam pela Câmara Federal.
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Veja em PDF em nossos websites o ensaio “Significação da Filosofia no Contexto
Brasileiro”, do Senador Franco Montoro (1916-1999).
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