A
Alma de Cada Ser Adquire as
Dimensões Daquilo Que Contempla
Carlos Cardoso Aveline

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O
silêncio destrói os muros criados pela ausência de saber. A alma silenciosa contempla
do alto as ideias de curto prazo, e as transcende.
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Tendo abandonado o barulho, o cidadão atento deixa respeitosamente de lado o
“eu” pessoal e passa a tratar de assuntos mais importantes.
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Quando alguém desiste do processo de ganhos e perdas de curto prazo, torna-se
capaz de viver a ausência de ruído mental. Então são alcançados horizontes
amplos. A alma chega a níveis elevados de percepção da vida, e a cacofonia da
consciência separada dá lugar à música do silêncio.
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Todas as coisas estão rodeadas de paz, de espaço e de silêncio. Cada ser humano
vive em uma determinada atmosfera sutil, que ao mesmo tempo o contém e o
transcende. Assim, as tradições orientais ensinam sobre o Vazio que na verdade
é plenitude. No vazio e no silêncio encontramos a sabedoria. Neles compreendemos
o significado das coisas e o propósito e a harmonia de cada esforço feito.
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A independência liberta. A rejeição emocional é uma forma de apego desnecessário
a aquilo que nos desagrada. Ao aceitar as limitações da vida, o peregrino deixa
de ser escravo delas e as transcende no plano da alma.
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Não é suficiente tomar a decisão de fazer algo desejável. Os sábios optam por ações
que, além de corretas, são realizáveis. Antes de decidir, cabe avaliar os
meios, o esforço, a paciência e a força de vontade disponíveis para cumprir a
decisão. O cumprimento da resolução é uma oportunidade para crescer como ser
humano e para purificar a força interior.
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O primeiro passo no sentido de vencer as limitações que podem ser vencidas consiste
em observá-las serenamente, sem ser dominado pela ilusão de que elas são eternas.
O segundo passo é buscar pelo caminho para removê-las. O peregrino deve agir à
altura da situação, preservando a sua capacidade de aprender e perseverando no
caminho para o alto.
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A prática do autocontrole implica renunciar às Causas das ações erradas.
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Um dos fatores que levam ao controle de si mesmo é uma auto-observação
impessoal em que evitamos tanto a indulgência como a autocondenação, e focamos em
vez disso no autoaperfeiçoamento.
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A evolução espiritual depende de um esforço voluntário, mas também é um
processo natural tão inevitável como o nascer do Sol. Estes dois aspectos da
evolução, o esforço e a espontaneidade, parecem paradoxais. Na verdade, eles correspondem
aos dois hemisférios cerebrais do ser humano. O esforço consciente para
alcançar a verdade complementa os aspectos intuitivos e involuntários da
iluminação - e vice-versa.
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O que fazer se as tarefas que alguém precisa realizar diariamente crescem e se
multiplicam? Cabe evocar uma calma incondicional. É preciso preservar antes de
tudo a paz e a ordem do mundo interior.
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Os bons resultados que surgem do trabalho altruísta eficaz trazem com
frequência provações complicadas. É aconselhável manter uma certa independência
do mundo das ações externas.
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O bom senso protege o peregrino de uma visão mecânica do seu dever. A
prioridade central é ouvir a voz do silêncio, que transcende as palavras. A voz
sutil e suave da consciência é o mais esclarecedor dos discursos.
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O estudante de teosofia aprende a escutar o silêncio, a ler uma página em
branco, a falar sem o uso de palavras, a viajar enquanto permanece imóvel e
permanecer parado enquanto se movimenta com vigor externamente. Estas são
atividades importantes no caminho do autoconhecimento, porque o ser humano possui
vários níveis de consciência e - para aprender a usá-los - é preciso
transcender com lucidez o mundo das aparências.
* A origem de toda regra de conduta está na Lei natural do
equilíbrio, que cada ser humano saudável encontra em seu próprio coração.
* A palavra “lei”, no sentido espiritual, está associada aos
conceitos de “Dharma”, potencialidade divina, sabedoria, e ética. Uma
questão-chave para quem deseja compreender a trajetória do carma humano
consiste em avaliar o modo como as pessoas e as comunidades veem a ideia de lei,
ou de obrigação moral. O caminho da sabedoria depende de estudar a Lei natural,
e de viver de acordo com ela.
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Há séculos a história da humanidade experimenta uma aceleração constante. À
medida que a roda da vida ganha velocidade, a sua movimentação aparente se
torna febril. Grandes quantidades de Carma acumulado entram em movimento. A
aceleração alquímica acontece. Materiais e substâncias do passado entram em
ebulição.
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A aceleração geral do ritmo da vida externa não impede a ação do eu superior.
Um certo número de cidadãos preserva a lentidão e o bom senso, permanecendo em
contato direto com o Centro da Roda do Carma. Enquanto os seus níveis
“objetivos” de consciência participam da periferia agitada da vida, suas almas
pulsam em unidade com o Centro de Paz.
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O eixo de uma roda em movimento não oscila. Quanto mais movimento há no Círculo
externo da Vida, mais forte é o convite cármico para que o cidadão desperto aumente
seu contato com o Centro.
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A alma de cada ser tende a adquirir as dimensões daquilo que ele contempla. Quando
deseja aprender mais, um jogador de xadrez joga com enxadristas mais avançados
do que ele. Para expandir a sua compreensão da vida, o estudante de teosofia
procura indivíduos sábios. Ele observa o tempo eterno e o espaço infinito. Ele esquece
de si enquanto estuda o cosmos, e celebra a unidade de tudo o que há.
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A oração, entendida como evocação ativa do mais elevado em nós mesmos e na
vida, é uma alavanca para mudar o carma, e para renascer.
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Orar inclui frequentemente o uso de palavras, mas agir com altruísmo pode ser
uma oração sem palavras.
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Erguer o sentimento ao mais elevado é uma forma de orar sem nada dizer.
Concentrar o pensamento no que é universal equivale a outra forma de oração,
ainda que não se fale coisa alguma.
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Orar é buscar a essência. A alma que se orienta pelo mundo elevado vive em contemplação
contínua. O silêncio do eu inferior permite chegar ao estado natural de
meditação ininterrupta e oração permanente.
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O artigo acima foi publicado como texto independente
em 19 de março de 2019. Uma versão inicial e anônima dele está incluída na
edição de fevereiro de 2016 de “O
Teosofista”.
Embora o título “Ideias ao Longo do Caminho”
corresponda ao título em língua inglesa “Thoughts Along the Road”, do
mesmo autor, não há uma identidade exata entre os conteúdos das duas coletâneas
de pensamentos.
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