A Verdadeira Teosofia Surge
Na Contemplação do Silêncio
Carlos Cardoso Aveline

A tradição budista inclui a história de um paradoxo Zen sobre o tema da
percepção silenciosa.
Publicada pela primeira vez em 1783, a narrativa conta
que o mestre Zen Hsüan-sha enviou um monge até seu antigo professor,
Hsüeh-fêng. O monge levava uma carta de saudação.
Eram os bons tempos do budismo, que hoje sofre de
profunda decadência.
O antigo mestre Hsüen-fêng reuniu seus alunos monges no
Zen-do, o salão de meditação, e abriu a carta diante deles. O envelope continha
apenas três folhas de papel, completamente em branco. Hsüen-fêng mostrou o
papel aos monges e disse:
“Vocês entendem?”
Não houve resposta - e Hsüen-fêng completou a lição do
dia com essa frase enigmática:
“Meu filho pródigo escreve exatamente o que eu penso”.
Nyogen, mestre do século 20, explica o episódio assim:
“Zen é como um raio. Nenhum olhar humano pode rastreá-lo.”
[1]
De fato, as palavras têm um papel limitado no
aprendizado. O Zen ou a Sabedoria não podem ser transmitidos apenas por
palavras. Há uma passagem nas “Cartas dos Mahatmas” que explica essa
necessidade de uma transmissão interna, que é independente das escrituras ou da
fala. Um Mestre escreve:
“Na Ciência Oculta os segredos não podem ser transmitidos subitamente, mediante uma comunicação
escrita, nem mesmo oral. Se assim fosse, tudo que os ‘Irmãos’ teriam que fazer
seria publicar um Manual de Instruções que poderia ser ensinado nas escolas, ao lado
da gramática (...). A verdade é que, até que o neófito atinja a condição
necessária para aquele grau de Iluminação para o qual ele está qualificado e
apto, a maior parte dos segredos, se não todos eles, é incomunicável.” [2]
Por isso, as páginas em branco da carta aberta diante dos
monges.
Hsüan-sha expressou muito francamente na carta ao seu
antigo Mestre todos os pensamentos do seu eu inferior. Eles eram nenhum. E
Hsüen-fêng ficou bastante feliz com aquilo: “É exatamente assim que eu penso.”
A compreensão vem no silêncio. Ela emerge devido à aceitação
do vazio. Ela vem pelo mergulho no espaço livre que é a ausência de
pensamentos.
Ao estudar e contemplar a Teosofia além das palavras, nós
podemos chegar ao silêncio e ao entendimento corretos. Isso expandirá nossa
consciência. Mas o que é de fato “Teosofia”? Embora a teosofia ou sabedoria
divina transcenda qualquer conjunto de conceitos em particular, os conceitos
universais são um ponto de partida para alcançá-la. A teosofia é a sabedoria
comum e a ética presentes nas diferentes tradições e filosofias. As palavras
desta ou daquela filosofia são apenas “sinais de trânsito” que orientam a
caminhada da percepção direta, e não há por que agarrar-se demasiado a elas. Por
mais úteis que sejam as placas de trânsito, é preciso caminhar.
A Loja Independente de Teosofistas é um dos esforços que
plantam as sementes dessa consciência universal.
NOTAS:
[1] “The Iron Flute, 100 Zen Koan”,
(“A Flauta de Ferro, 100 Koans Zen”), Traduzido e editado por Nyogen Senzaki e
Ruth Strout McCandless, publicado por
Charles E. Tuttle Co., Rutland, Vermont & Tokyo, Japão, Segunda edição,
1985, 175 pp., veja p. 77.
[2] “Cartas dos Mahatmas Para A.P.
Sinnett”, Ed. Teosófica, Brasília, 2001, edição em dois volumes, ver Carta
20, volume I, p. 134.
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A propósito do ensinamento que transcende as
palavras, leia também os artigos “Como São Ensinados os
Mistérios”, “A Consciência Além da Linguagem”,
“A Palavra e o Pensamento” , “A Música do Silêncio” e “Simplificando e Elevando o Carma”.
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