O Evangelho de São Tomé Ensina a Olhar Melhor
Carlos Cardoso Aveline
A sabedoria divina, tal como pode ser vivida nas primeiras décadas do século 21, parece coincidir com a perspectiva de alguns trechos do Evangelho de São Tomé ― um curto documento que faz parte da chamada Biblioteca de Nag Hammadí.
Esta Biblioteca é
um conjunto de textos gnósticos e cristãos dos primeiros tempos. Eles foram
descobertos em 1945, e sua publicação só ocorreu no final dos anos 1970. Geralmente
ignorados pelas igrejas cristãs, os documentos ampliam de modo radical a visão
convencional de Jesus e mostram novas facetas do seu ensinamento, que nem
sempre se encaixam na imagem fixa construída por alguns setores do
cristianismo.
Embora tenha pontos em comum com os evangelhos mais conhecidos, o evangelho de São Tomé possui valor próprio e é um dos textos mais profundos de Nag Hammadí. Ele inicia dizendo:
“Estes são os ensinamentos secretos do Jesus vivo...”.
Com belas afirmativas simbólicas, o documento é, no mínimo, interessante e inspirador. Ele dá uma certa prioridade à capacidade de enxergar corretamente e, nos fragmentos 5 e 6, Jesus afirma:
Embora tenha pontos em comum com os evangelhos mais conhecidos, o evangelho de São Tomé possui valor próprio e é um dos textos mais profundos de Nag Hammadí. Ele inicia dizendo:
“Estes são os ensinamentos secretos do Jesus vivo...”.
Com belas afirmativas simbólicas, o documento é, no mínimo, interessante e inspirador. Ele dá uma certa prioridade à capacidade de enxergar corretamente e, nos fragmentos 5 e 6, Jesus afirma:
“Reconheçam o que
está ao alcance da sua visão, e aquilo que está oculto para vocês se tornará
claro. Porque não há nada oculto que não se tornará manifesto.”
E
acrescenta:
“Não digam mentiras, e não façam aquilo de que não gostam, porque todas as coisas são claras para a visão do céu. Pois nada que está oculto deixará de tornar-se manifesto, e nada que está encoberto deixará de ser descoberto.”
Esse trecho se relaciona com a prática da presença divina, e é claramente pitagórico. Um aspecto primeiro e essencial do trabalho de busca da sabedoria divina é, sem dúvida, relacionado com a atenção e com a consciência de que nada há separado da consciência cósmica. A boa lei do Carma fotografa e registra tudo: nada se oculta dela. Saber disso é algo que aumenta o nosso sentido de responsabilidade a cada momento da vida. Por outro lado, se aproveitarmos bem as possibilidades que hoje vemos ao nosso alcance, passaremos a ser capazes de ver outras tantas oportunidades, que hoje ainda não conseguimos enxergar.
“Não digam mentiras, e não façam aquilo de que não gostam, porque todas as coisas são claras para a visão do céu. Pois nada que está oculto deixará de tornar-se manifesto, e nada que está encoberto deixará de ser descoberto.”
Esse trecho se relaciona com a prática da presença divina, e é claramente pitagórico. Um aspecto primeiro e essencial do trabalho de busca da sabedoria divina é, sem dúvida, relacionado com a atenção e com a consciência de que nada há separado da consciência cósmica. A boa lei do Carma fotografa e registra tudo: nada se oculta dela. Saber disso é algo que aumenta o nosso sentido de responsabilidade a cada momento da vida. Por outro lado, se aproveitarmos bem as possibilidades que hoje vemos ao nosso alcance, passaremos a ser capazes de ver outras tantas oportunidades, que hoje ainda não conseguimos enxergar.
O parágrafo 34 do
evangelho de São Tomé sugere, porém, que é recomendável desenvolver
atenção e luz própria para enxergarmos o caminho, porque:
“Se um
cego conduz um cego, ambos cairão no buraco”.
Nos primeiros estágios do caminho do autoconhecimento, aalma
inexperiente anseia por fatos grandes e espetaculares, mas trata-se de uma
ilusão. A luz está nas pequenas coisas. No parágrafo 20, um discípulo pergunta
ao Mestre:
“Diga-noscomo
é o reino dos céus.”
E Jesus responde:
“Écomo um grão
de mostarda. É a menor de todas as sementes. Mas quando cai em solo arado, ela
produz uma grande planta e se torna um abrigo para as aves do céu.”
Uma das conclusões práticas a que se pode chegar refletindo sobre este trecho é que o renascimento da sabedoria no país e na civilização em que vivemos depende de pequenas iniciativas ― de pequenas sementes lançadas em bom solo. Tudo que é criativo começa em pequena escala. A chave que permite mudar a realidade está em ver, e perceber, a identidade interna entre a semente e a árvore, entre o pequeno e o grande, a terra e o céu, o microcosmo e o macrocosmo, o agora e o amanhã.
Nos primeiros estágios do caminho do autoconhecimento, a
“Diga-nos
E Jesus responde:
“É
Uma das conclusões práticas a que se pode chegar refletindo sobre este trecho é que o renascimento da sabedoria no país e na civilização em que vivemos depende de pequenas iniciativas ― de pequenas sementes lançadas em bom solo. Tudo que é criativo começa em pequena escala. A chave que permite mudar a realidade está em ver, e perceber, a identidade interna entre a semente e a árvore, entre o pequeno e o grande, a terra e o céu, o microcosmo e o macrocosmo, o agora e o amanhã.
O parágrafo 32 usa a imagem da montanha como símbolo dos níveis superiores de
consciência:
“Uma
cidade que é construída sobre uma montanha alta e é fortificada não pode cair,
nem pode ficar escondida.”
O parágrafo 48 desse evangelho destaca o potencial ilimitado da cooperação entre as pessoas, quando há uma merecida confiança recíproca:
O parágrafo 48 desse evangelho destaca o potencial ilimitado da cooperação entre as pessoas, quando há uma merecida confiança recíproca:
“Se dois fizerem a paz um com o outro nesta casa, eles dirão à montanha: ‘afaste-se’, e a montanha se afastará.”
O texto
atribuído a Tomé aborda também a expectativa humana sobre uma nova era global
de paz e união entre todos os povos. No trecho 113, já na conclusão do documento, um
discípulo pergunta:
“Quando é que o reino virá?”
E Jesus responde:
“Ele não virá porque as pessoas fiquem esperando por ele. Não será uma questão de dizer 'aqui está ele' ou 'lá está ele'. Em vez disso, o reino do pai está espalhado pela terra toda, e os homens não o vêem.”[1]
Este fragmento indica que a sabedoria, a paz e a fraternidade já estão em todos nós, ainda que mais ou menos adormecidas. Mas não só em nós: o “reino do pai”, a lei do equilíbrio, está também no mundo desde sempre. Cabe a cada um despertar a atenção necessária para VER e PERCEBER com clareza a ação dessa Lei Eterna em sua vida cotidiana. Deste modo, poderá agir conscientemente de acordo com a lei do universo, e participar do lento despertar coletivo para a sabedoria.
NOTA:
[1] “The Gospel of Thomas”, em “The Nag Hamadí Library”, Revised Edition, Complete in One Volume, James Robinson, General Editor, HarperSanFrancisco, 1990, 550 pp., ver pp. 124 a 138.
“Quando é que o reino virá?”
E Jesus responde:
“Ele não virá porque as pessoas fiquem esperando por ele. Não será uma questão de dizer 'aqui está ele' ou 'lá está ele'. Em vez disso, o reino do pai está espalhado pela terra toda, e os homens não o vêem.”[1]
Este fragmento indica que a sabedoria, a paz e a fraternidade já estão em todos nós, ainda que mais ou menos adormecidas. Mas não só em nós: o “reino do pai”, a lei do equilíbrio, está também no mundo desde sempre. Cabe a cada um despertar a atenção necessária para VER e PERCEBER com clareza a ação dessa Lei Eterna em sua vida cotidiana. Deste modo, poderá agir conscientemente de acordo com a lei do universo, e participar do lento despertar coletivo para a sabedoria.
NOTA:
[1] “The Gospel of Thomas”, em “The Nag Hamadí Library”, Revised Edition, Complete in One Volume, James Robinson, General Editor, HarperSanFrancisco, 1990, 550 pp., ver pp. 124 a 138.