Os Motivos Pelos Quais a Filosofia
Esotérica Recomenda Evitar Práticas Mediúnicas
Joaquim Duarte Soares

Para Helena Blavatsky (foto) é fundamental
em teosofia ser independente e ter vontade própria
Qual a visão da teosofia original em relação à mediunidade espírita?
Para examinar esta questão, é
fundamental o estudo amplo e calmo da constituição oculta do ser humano, tal
como ensinada pela Filosofia Esotérica. Sem compreender a sua natureza complexa
não será possível perceber os processos naturais de desenvolvimento e evolução,
de vida e morte, e do caminho do discipulado. [1]
Vejamos, resumidamente, algumas
ideias básicas.
O Ser Humano tem a seguinte natureza
setenária:
1) Sthula-sharira -
Corpo Físico;
2) Prana -
Princípio Vital;
3) Linga-Sharira -
Modelo ou duplo astral;
4) Kama - A sede
dos desejos, paixões e emoções;
Estes 4 Princípios (ou mais
corretamente 3 Princípios e o Corpo Físico) formam aquilo que a Teosofia
designa por Quaternário Inferior, ou os níveis
mortais; a Personalidade, que apenas subsiste durante o período de uma
encarnação.
Em seguida, temos a Tríade
Superior:
5) Manas -
Mente, Inteligência. Este princípio é dual em suas funções;
6) Buddhi - Intuição Espiritual,
a Alma espiritual;
7) Atma - O Eu Imortal, o Espírito.
Um ponto importante a considerar
é que existe uma ligação entre o Quaternário Inferior e a Tríade
Superior, que é Antahkarana. O objetivo de todo aquele que
percorre o Caminho Espiritual é ir “construindo”, ao longo de várias vidas, uma
ponte cada vez maior entre os níveis mortais e os níveis espirituais e
imperecíveis.
Na constituição setenária podemos
distinguir igualmente três Almas, ou, três “tipos de consciência”:
1) Alma Animal ou Mortal (eu
inferior): um agregado de Kama + Manas
2) Alma Humana: Buddhi +
Manas
3) Alma Espiritual ou Imortal (Eu
Superior): Atma + Buddhi
O caminho espiritual consiste na
transferência da consciência do eu inferior para o eu
superior, da alma
mortal para Alma Imortal, através do despertar da Alma
Humana, ou Buddhi-Manas, a Inteligência e Compaixão
Universal.
Diante desta perspectiva da
constituição integral do ser humano, podemos perceber que a mediunidade
espírita e os demais fenômenos mediúnicos têm a sua base na atividade da alma
animal ou mortal, no nível da Ilusão. Para a Teosofia autêntica, a mediunidade
é um grave infortúnio e o discípulo esotérico é o oposto do médium. Um é ativo
e positivo, o outro é passivo e negativo; um desenvolve progressivamente a sua
vontade e poder sobre todas as circunstâncias e forças inferiores, o outro vai
perdendo cada vez mais a sua autonomia e passa a ser o instrumento “dócil” de
todo tipo de influências; enquanto um se esforça por polarizar nos níveis
espirituais (Alma Imortal), o outro se deixa dominar e enredar nos níveis da
ilusão (Alma Mortal); um refina os seus veículos de percepção, o outro
desestrutura e degrada a sua fisiologia oculta; um amplia a sua consciência, o
outro limita a sua consciência; um procura ler o Pensamento Divino, outro se ilude
com os reflexos da Luz Astral; um toma nas mãos a responsabilidade de se
conduzir pelo Caminho ascendente, outro delega a forças estranhas seu percurso
de crescentes infortúnios.
Num capítulo da obra “Ísis Sem
Véu”, de Helena Blavatsky, podemos ler o seguinte, a propósito da mediunidade
(passiva):
“Longe de nós o pensamento de
lançar uma mácula injusta sobre os médiuns físicos. Exauridos por diversas
inteligências, reduzidos pela influência predominante dos espíritos [2] -
à qual suas naturezas fracas e nervosas são incapazes de resistir - a um estado
mórbido, que ao fim se torna crônico, eles são impedidos por essas
‘influências’ de assumir outra ocupação. Eles se tornam mental e fisicamente
incapazes para qualquer outra atividade. Quem pode julgá-los severamente
quando, lançados numa situação extrema, são constrangidos a aceitar a
mediunidade como um negócio? E o céu sabe, como bem o demonstraram os últimos
acontecimentos, se essa profissão deve ser invejada por quem quer que seja!”[3]
Todo o texto restante merece ser
lido. Em um trecho mais adiante, HPB nos oferece palavras muito claras sobre a
situação dos médiuns:
“É um erro dizer que um médium
tem poderes desenvolvidos. Um médium passivo não tem poder. Ele tem uma
certa condição moral e física que produz emanações, ou uma aura, na qual as
inteligências que o guiam podem viver e pela qual elas se manifestam. Ele é
apenas o veículo através do qual elas
exercem seu poder. Essa aura varia dia a dia, e, segundo as experiências do sr.
Crookes, mesmo de hora em hora. É um efeito externo que resulta de causas
internas. A condição moral do médium determina a espécie dos espíritos que vêm;
e os espíritos que vêm influenciam reciprocamente o médium, intelectual, física
e moralmente. A perfeição de sua mediunidade está na razão da sua passividade,
e o perigo que ele incorre está no mesmo grau. Quando ele está completamente
‘desenvolvido’ - perfeitamente passivo -, o seu próprio espírito astral pode
ser paralisado, [até] mesmo retirado de seu corpo, que é então ocupado por um
elemental (…).”
E ela prossegue:
“Como a mediunidade física
depende da passividade, o seu antídoto é óbvio: o médium deve cessar de
ser passivo. Os espíritos nunca controlam pessoas de caráter positivo que
estão determinadas a resistir a todas as influências estranhas. Levam ao vício
os fracos e os pobres de espírito que eles conseguem levar ao vício. Se os
elementais que produzem milagres e os demônios desencarnados chamados de
elementários fossem de fato os anjos guardiães, como se acreditou nos últimos
trinta anos, por que não deram eles a seus médiuns fiéis pelo menos boa saúde e
felicidade doméstica? Por que os abandonam nos momentos críticos do julgamento,
quando são acusados de fraude? É notório que os melhores médiuns físicos são doentios,
ou, às vezes, o que é ainda pior, inclinados a um ou outro vício anormal. Por
que esses ‘guias’ curadores, que fazem seus médiuns exercerem o papel de
terapeutas e taumaturgos para os outros, não lhes dão a dádiva de um robusto
vigor físico? Os antigos taumaturgos e os apóstolos gozavam geralmente, se não
invariavelmente, de boa saúde; seu magnetismo nunca trazia ao doente qualquer
mácula física ou moral; e eles nunca foram acusados de VAMPIRISMO, como o faz
muito justamente um jornal espírita contra alguns médiuns curadores.” [4]
Ação Definida e Plena Atenção
Segundo a filosofia esotérica, a
mediunidade e a perda da independência devem ser evitadas a todo custo, mas
elas não ocorrem apenas em sessões espíritas. Os perigos da passividade
psíquica diante de forças sutis pouco recomendáveis são enormes em qualquer
ambiente “espiritual” que estimule nas pessoas uma obediência cega.
Para evitar esta dominação
paralisante, uma pedagogia espiritual eficaz deve estimular no aprendiz o desenvolvimento
de uma vontade individual ativa, unida a um desejo de agir corretamente, e a
uma decisão de ser individualmente responsável pelos seus pensamentos, palavras
e ações.
Em 1885, Helena Blavatsky publicou
três perguntas de um leitor no jornal “The Theosophist”, que ela editava mensalmente
na Índia:
1) Quais são os sintomas, tanto
externos como internos, que permitem detectar se estamos tornando-nos, ou se já
nos tornamos de fato, um médium “espírita”?
2) Serão parte dos sintomas a má
saúde, a perda da vitalidade, e a consequente perda de força-de-vontade, assim
como a distração mental?
3) Quais são os meios para
defender-nos eficientemente de tal processo? E se o processo já se
completou, quais são os meios para dissipar os seus efeitos?
HPB respondeu da seguinte
maneira:
1) Perda de vitalidade e seus
resultados.
2) Sim.
3) Vontade positiva, estudo,
atividade, trabalho. [5]
A prática da teosofia clássica
nada tem a ver com passividade. Ela inclui elementos de Raja Ioga (a sabedoria
pelo autocontrole e autoconhecimento), de Carma Ioga (a sabedoria pela ação
correta) e de Jnana Ioga (a sabedoria pela contemplação das verdades
universais).
Nestas três linhas de ação, uma
vontade ativa, unida à ética, é um elemento central e
indispensável.
NOTAS:
[1] Nossos websites associados contêm vários textos de estudo
que permitem uma melhor compreensão da mediunidade, do processo pós-morte e da
reencarnação, bem como algumas semelhanças e as muitas diferenças entre a
filosofia espírita e a Teosofia. O texto “Os Sete Princípios da Consciência”,
de Carlos Cardoso Aveline, é fundamental.
[2] Os “espíritos” de que H.P.B. fala não são as “almas dos
desencarnados”, como supõem os espíritas, mas antes as “cascas astrais” ou
então elementais.
[3] “Ísis Sem Véu”, H. P. Blavatsky, Ed. Pensamento, SP, vol.
II, pp. 174-176.
[4] “Ísis Sem Véu”, obra citada, vol. II, p. 176-177.
[5] “The Theosophist”, Adyar, Índia, February 1885, p. 119.
000
No texto
acima o autor unifica os seus artigos “Como
Evitar a Mediunidade e Seus Perigos” e “A Mediunidade e a Teosofia”, que foram publicados
respectivamente nas edições de abril de 2008 e julho de 2010 do boletim
eletrônico “O Teosofista”.
000
Para conhecer a teosofia original desde o ângulo da
vivência direta, leia o livro “Três Caminhos Para a Paz Interior”, de
Carlos Cardoso Aveline.

Com 19 capítulos e 191 páginas, a obra foi publicada em
2002 pela Editora Teosófica de Brasília.
000