Regras Básicas Para Um Uso Eficaz
do Tempo
Carlos
Cardoso Aveline
Há pelo menos quatro motivos pelos
quais as reuniões são fatores decisivos na vida de quase todo cidadão.
Em
primeiro lugar, grande parte do nosso tempo é gasto nelas e, naturalmente, este
tempo deve ser bem empregado. Em segundo lugar, nas reuniões ocorrem fatos e
são tomadas decisões que afetam radicalmente a nossa vida, tanto no plano
profissional como na dimensão pessoal ou espiritual. Estas decisões devem ser
corretas.
O
terceiro ponto é que as reuniões são momentos importantes para todos os grupos
e instituições de que participamos, desde o sindicato ou cooperativa até a
associação de moradores, a entidade ecológica ou grupo teosófico. E mesmo a família.
O que acontece nas reuniões determina a vitória ou não dos nossos esforços
coletivos, em qualquer frente de atuação.
Em
quarto lugar, as reuniões são laboratórios de relações humanas. Nelas ocorrem
amizades e parcerias fundamentais, e podemos superar dificuldades no nosso
relacionamento com as pessoas. Por tudo isso, vale a pena quebrar a rotina
mental para examinar de perto a questão de como fazer reuniões mais eficazes,
de modo que não haja perdas desnecessárias de tempo ou energia, e todos possam
interagir corretamente.
Como Trabalhar Produtivamente
O sábio
grego Pitágoras foi um dos primeiros a ensinar que a Geometria, como ciência,
não está presa ao plano físico. Há uma geometria que estuda as proporções de
ideias e pensamentos. E há também uma geometria que visa compreender e
harmonizar o fluxo das energias mentais e emocionais em uma reunião de
lutadores sociais ou buscadores da verdade. O objetivo desta ciência é que -
havendo paz, ordem e liberdade nos planos concretos - a energia dos planos
superiores da consciência humana possa manifestar-se livremente.
Daí a
importância de adotar regras de jogo claras que assegurem a proporção
entre as coisas que ocorrem durante uma reunião. É relativamente fácil elevar
bastante o nível de consciência de um grupo de pessoas durante uma reunião de
estudos; especialmente quando todos conseguem deixar de lado seus eus
pessoais. Nem sempre é fácil manter a mesma harmonia quando o grupo faz uma
reunião administrativa, discutindo coisas como a escolha de dirigentes, o rumo
do movimento e o destino de bens materiais - decisões que implicam um manejo
claro, transparente e leal de questões de poder. Este é, às vezes, um teste
dramático para as nossas teorias sobre justiça social ou fraternidade
universal. Então nem sempre é fácil ouvir respeitosamente o outro e desviar o
olhar dos seus erros para corrigir os nossos próprios defeitos, como recomenda,
por exemplo, um grande instrutor espiritual no livro “Cartas dos Mestres de
Sabedoria” [1].
A adoção
de algumas regras simples pode eliminar desarmonias desnecessárias. Grande
parte das aparentes divergências entre os seres humanos se deve à falta de
esclarecimento das suas ideias através de um diálogo honesto e franco. Devemos
desarticular com calma e determinação quaisquer sistemas estabelecidos de
divergências ou incompatibilidades, através do exercício da fraternidade, da
impessoalidade e do discernimento. Isso nem sempre é fácil. Há, inclusive,
certo tipo de liderança que prolifera quando não há transparência, e sim
manipulação, nos grupos humanos. Neste caso, a adoção de regras claras de jogo
requer uma mudança profunda no estilo de administração das decisões comuns e
das energias do grupo.
A
seguir, enumero e comento em ordem alfabética 47 ideias-chave sobre a
dinâmica das reuniões de trabalho. Não se trata de algum manual dogmático a ser
obedecido mecanicamente. Nem todos os itens precisam ser colocados em prática o
tempo todo e em qualquer reunião. Num grupo pequeno, ou em momentos harmônicos,
não há necessidade de lista de inscrições, por exemplo. Mas toda reunião
é um processo vivo. De repente surge uma polêmica, todos querem falar ao mesmo
tempo, o tempo fica curto e a ansiedade se espalha: então a geometria da boa reunião passa a ser
uma arte indispensável para preservar a lucidez coletiva. Outras reuniões, mais
numerosas ou sobre temas mais complexos, já devem começar com um coordenador
usando os melhores recursos.
O
conhecimento amplo das técnicas da reunião eficaz é útil mesmo quando não é
necessário usá-las ostensivamente. Saber das alternativas possíveis dá
segurança e tranquilidade. Assim, cada um dos itens tem seu valor potencial em
qualquer reunião - mesmo a mais simples e pacífica.
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1. Administração do Tempo. Todos os integrantes da reunião devem
ser coadministradores conscientes do tempo comum. É aconselhável saber quanto
durará a reunião, e como se distribuirá o tempo entre os vários assuntos da
pauta. O tempo pode até ser remanejado, eliminando-se um ponto de pauta, ou
dois, para discutir melhor um assunto. Mas esta decisão deve ser tomada
conscientemente, para que não haja depois sentimentos de frustração.
2. Agenda ou Pauta. No começo da reunião, a pauta ou
agenda deve ser lida, abrindo-se inscrições de temas rápidos para um item
final, “outros assuntos”. A abertura é um bom momento para calcular a duração
da reunião e fazer uma previsão inicial do tempo dado a cada item. Durante a
reunião, o grupo deve ter sempre claro qual é o item em discussão em cada
momento. É recomendável manter plena atenção.
3. Apartes. Ninguém deve interromper o outro
por um ato impensado e impulsivo. Pode, porém, pedir um aparte para acrescentar
algo, ou para lembrar um ponto importante. Por uma questão de ética, um aparte
não deve ser frontalmente contrário à ideia que está sendo exposta. Para isto
existe a inscrição. O aparte deve ser breve. De preferência menos de um minuto.
E quem pede o aparte deve aceitar com tranquilidade que ele seja concedido ou
negado por quem está falando.
4. Ata. Quando são tomadas decisões,
deve haver uma ata, que será feita por alguém designado para esta função pelo
grupo ou pelo coordenador. A ata pode descrever tudo que é dito, ou, mais
simplesmente, relatar apenas as decisões tomadas, para evitar excesso de
trabalho. Pode-se pedir que algo em particular seja transcrito na ata, quando
houver motivo forte para isto, do ponto de vista do solicitante. É boa prática
começar uma reunião administrativa com a leitura da ata da reunião anterior, ou
pelo menos do que se decidiu nela, para que se tenha uma consciência histórica das decisões tomadas e de sua execução
prática. Memória coletiva é importante. Quando há um nível maior de
formalidade, a ata da reunião anterior deve ser discutida, emendada e aprovada
pelos presentes.
5. Bom Humor. Contentamento e bom humor são
características de um trabalho coletivo bem encaminhado. O humor nunca deve
servir para atacar alguém, nem mesmo “de brincadeira”. O subconsciente não distingue o ataque “de
brincadeira” do ataque sério. Um clima de descontração moderada e positiva
relaxa os espíritos, torna a reunião interessante e faz o trabalho em grupo
render mais. O bom humor deve expressar a alegria de trabalhar pelo bem em
companhia de gente sincera.
6. Bom Senso. Certa vez uma garota perguntou a
Helena Blavatsky qual era a coisa mais importante para o trabalho espiritual.
“Bom senso”, respondeu Blavatsky. De fato, ter os pés bem plantados no chão nos
permite erguer melhor nosso pensamento em direção à consciência divina. O bom
senso nos permite colocar as coisas na devida proporção, olhando os fatos de
modo claro e desapaixonado.
7. Consenso. Nos seus primeiros anos, o grupo
ecologista Greenpeace seguia a tradição de indígenas norte-americanos e
só tomava decisões por consenso. As reuniões podiam durar 15 horas ou mais. Mas
as resoluções eram aprovadas por todo o grupo e não por sua maioria. O consenso
em torno das coisas básicas mantém unido um grupo de trabalhadores. É uma
unanimidade virtual. Muitas vezes ele fica implícito. Em uma reunião, as decisões
devem ser tomadas por consenso ou maioria folgada, com aprovação no mínimo de
dois terços dos presentes. Quando o consenso não for possível, deve-se
assegurar que há uma atitude respeitosa e fraterna em relação às posições
rejeitadas. O coordenador tem responsabilidade pessoal nisto.
8. Conversa Paralela. Quando duas ou mais pessoas
cochicham enquanto a reunião prossegue, rompe-se a unidade do grupo. A atenção
de todos é perturbada. A egrégora do grupo é momentaneamente fragmentada. Esta
é uma clara falta de respeito e não deve ser tolerada. Se surgir uma conversa
paralela em reunião com menos de 30 pessoas, o coordenador deve interromper a
reunião até que haja a devida atenção de todos. Permiti-la seria um precedente
perigoso.
9. Coordenador. O coordenador deve sacrificar
suas posições pessoais em função das decisões do grupo. Deve mostrar
impessoalidade e grandeza de espírito, preocupando-se mais com a eficácia da
reunião do que com a “vitória” ou predominância da sua visão das coisas. Por
isto, é correto selecionar um coordenador que esteja alheio a alguma questão
especialmente polêmica ou que saiba posicionar-se de modo equidistante e
equilibrado, produzindo bom senso, harmonia e clareza entre os presentes.
10. Coordenador-adjunto. O coordenador-adjunto,
usualmente convidado para a função pelo coordenador da reunião, pode ser muito
útil ao manter atualizada a lista de inscrições. Coordenar uma reunião, quando
os temas são complexos e os trabalhos se dão em vários níveis de consciência ao
mesmo tempo, é tarefa para uma equipe. Todos devem ajudar. O coordenador só
trabalha bem quando todo o grupo compreende e participa do seu trabalho. O
coordenador-adjunto cumpre uma tarefa importante neste contexto, porque auxilia
o coordenador especialmente no plano mental concreto.
11. Crítica. Deve ser evitada. Pode envenenar
facilmente a aura do local ou egrégora do grupo. Quando inevitável, deve ser
endereçada sempre à atitude de alguém, não à pessoa. Não há pessoas erradas,
mas pessoas que têm, em determinado momento, uma atitude errada. A
personalização das críticas gera um mal-estar que afasta da reunião as energias
superiores e atrai elementos destrutivos. Nunca se deve mencionar o lado
negativo de algo sem lembrar, ao mesmo tempo, o seu lado positivo. É sempre melhor
usar o poder do pensamento inspirador. A visão crítica é importante. Ver erros, no entanto, é bem diferente
de ficar pensando ou - o que é ainda
mais grave - falando neles. É bom
pensar no aspecto positivo dos outros, até porque há uma lei inevitável segundo
a qual nos transformamos naquilo em que pensamos.
12. Data e Local da Reunião. Devem ser anunciados a tempo e
repetidamente. Há vantagens em que a reunião seja feita com certa regularidade
cíclica - semanal, mensal, bimestral, etc. - e no mesmo local ou em um número
limitado de locais. Tudo na vida tem um ritmo, e é válido usar este fato a
nosso favor. Através da constância e da regularidade, reúne-se magnetismo.
13. Declaração de Voto. Durante a votação, se ela for
nominal (um a um sendo chamado pelo nome), ou logo após a votação, se ela for
pelo método de braços erguidos, qualquer votante tem direito de fazer uma
declaração de voto para explicar por que votou deste ou daquele modo.
14. Democratização da Fala. Em reuniões de até 15 ou 20
pessoas, deve ser estimulada a
participação de todos. É frequente a fala ser monopolizada por poucas pessoas.
Para evitar esta tendência, uma prática recomendável é estabelecer que quem vai
falar pela primeira vez na reunião tem preferência e não espera sua vez na
lista de inscritos, se todos os outros inscritos já tiverem falado antes. Esta
medida estimula a participação daquelas pessoas que são menos ansiosas ou
ávidas por serem ouvidas, e que muitas vezes têm contribuições importantes a
fazer. Por outro lado, a democratização da fala não é um valor absoluto. Uma
pessoa menos experiente deve falar, mas falar com concisão. A função do
coordenador é manter ao mesmo tempo a democracia da fala e o bom rumo da
reunião.
15. Democratização da Informação. Há uma quantidade básica de
informação que todos devem ter para compreenderem a marcha da reunião. As
pessoas devem apresentar-se, se não conhecem umas às outras. E um histórico
mínimo do ponto a ser discutido é frequentemente recomendável. Decisões sólidas
só são tomadas quando todos estão razoavelmente bem informados. Tudo isto deve
ser feito sem desperdício de tempo.
16. “Diálogo”. O “diálogo” ocorre quando duas
pessoas polarizam indevidamente a reunião, interrompendo-se e respondendo uma à
outra em uma sequência interminável que prejudica a ordem dos trabalhos. O
“diálogo” acontece quando a ansiedade sobe a níveis indesejáveis. É importante
saber esperar. O debatedor deve praticar a tolerância, fazer sua inscrição e
esperar o momento certo de falar.
17. Discordância pessoal. Não há nenhuma ética que nos
obrigue a realimentar desavenças ou a permitir a existência de sistemas
estáveis de produção de rancor. Ao contrário, nosso compromisso com a
solidariedade é muito prático. A proposta de uma civilização fraterna não
pode viver só de discursos. Cada dia da nossa vida pode ser algo completo, que
não deixa desarmonias para o dia seguinte.
18. Duração da Reunião. Deve haver um intervalo a cada
80 ou 90 minutos, para que as pessoas possam relaxar e movimentar um pouco o
corpo físico. Um dos mecanismos para diminuir os efeitos tensionantes de uma
reunião longa é coordenar exercícios de ginástica simples, durante um minuto,
antes do intervalo para chá ou café. Um corpo físico relaxado, com os fluxos
energéticos adequados, é um fator importante para um bom desempenho. A duração
da reunião depende em parte do trabalho preparatório. Quando se levam ideias
claras e pré-discutidas para uma reunião, as decisões são mais fáceis. As
questões mais difíceis podem ser encaminhadas informalmente antes,
preparando-se um acordo e uma proposta de consenso que permita ganhar tempo.
19. Egrégora. Palavra que se tornou popular
entre os espiritualistas, embora não conste do “Glossário Teosófico” nem dos
dicionários de língua portuguesa. Significa
a aura de um local onde há reuniões
de grupo, e também a aura de um grupo
de trabalho. Aura, diz o “Glossário”,
é a “essência sutil invisível que emana dos corpos humanos e animais e também
das coisas”. Egrégora é, então, o registro no mundo sutil do conjunto dos
trabalhos de um grupo. É a sua presença impressa na luz astral, com suas
tendências- skandhas, em sânscrito - que formam padrões vibratórios
relativamente constantes. Daí a importância do hábito da ordem, da paz e da
harmonia nos trabalhos. Todos nossos atos, pensamentos, sentimentos e palavras
ficam registrados na egrégora, que é feita de luz astral. O conceito de aura ou egrégora é recuperado na ciência moderna por pesquisadores como o
físico David Bohm, com o conceito de ordem implícita, e o biólogo Rupert
Sheldrake, com o conceito de campo mórfico. Você pode fazer a
experiência de “sentir” a energia da aura de uma sala ou local onde foram
feitas muitas reuniões teosóficas e espiritualistas. A egrégora é maior do que
a soma aritmética da energia dos integrantes do grupo. Se tivéssemos sempre
presente a existência da luz astral registrando tudo o que se faz ou pensa em
uma reunião, teríamos um forte sentido de responsabilidade durante as
reuniões.
20. Escutar. Há uma profunda diferença entre deixar
o outro falar e ouvir realmente o que o outro diz. Muitas opiniões
fixas e doutrinas são, segundo escreveu Gibran Khalil Gibran, “como a vidraça
da janela: vemos através dela mas ela nos separa da verdade”. [2] Quando somos capazes de abandonar
por um momento as nossas opiniões para examinar e ouvir ideias novas, estamos
dando um passo importante em nosso próprio desenvolvimento intelectual. O
hábito de escutar profundamente o outro torna as reuniões mais produtivas.
21. Estatutos e Regulamento. É bom conhecer e ter por perto.
Estatutos e regulamentos da entidade civil a que pertencemos são contratos de
trabalho e permitem colocar nosso esforço em uma perspectiva histórica. Quando
eles são esquecidos, fica mais fácil tomar decisões afastadas da realidade. As
decisões devem ser definidas dentro de uma perspectiva institucional, embora o
livre pensar, a criatividade e a capacidade de transformar a realidade sejam
igualmente importantes. A perspectiva institucional é um corrimão importante para que não caiamos no território do devaneio.
22. Ética. Há motivos práticos para agir de
modo correto em todos os momentos. Gibran Khalil Gibran escreveu: “A velhacaria
às vezes tem êxito, mas acaba sempre se suicidando”.[3] A ética, em compensação,
é um valor central porque é em torno dela que surgem parcerias duráveis,
baseadas na confiança mútua. Mas ética não é uma acomodação preguiçosa às
circunstâncias, nem consiste no medo de questionar pontos “difíceis”. Ela
supõe, ao contrário, coragem e franqueza. A verdadeira ética nasce da percepção
de que a cada ação corresponde, cedo ou tarde, uma reação igual e contrária, ou
“retorno cármico”. Isso é razão suficiente para que nossas ações sejam as mais
corretas possíveis durante todo o trabalho em grupo.
23. Franqueza com Respeito. O trabalho em grupo só pode ser
eficiente quando há sinceridade entre as pessoas. Ao mesmo tempo, um sólido
respeito mútuo é fundamental. Deve-se
evitar toda agressividade pessoal. Há momentos em que você contraria alguém.
Mesmo que você evite generalizações, criticando apenas a atitude e não a
pessoa, o outro pode ficar aborrecido. Para evitar isso tanto quanto possível,
deixe claro o seu respeito por ele. Demonstre que reconhece suas qualidades.
Esvazie-se de todo rancor, porque os sentimentos negativos matam a
produtividade do indivíduo e do grupo. Em compensação, quando há franqueza e
otimismo, as pessoas confiam naturalmente umas nas outras, não há melindres
pessoais, o grupo é capaz de corrigir seus erros e as chances de êxito são muito
maiores.
24. Grupos de Trabalho. São importantes para descontrair
e diminuir o trabalho da plenária. Um Conselho Regional ou Nacional pode ter
grupos de trabalho (GTs) permanentes, ou semipermanentes, para lidar com
problemas ou tarefas que não se esgotam em uma única reunião. Durante uma
reunião ou seminário, se ela tiver duração suficiente, pode-se dividir a
plenária em grupos menores, estimulando a criatividade e a participação de
todos. O trabalho em grupos menores pode, também, dissolver questões polêmicas
em que não há acordo. A plenária deve ser poupada de discussões áridas, longas,
em que nada se decide e em que frequentemente se deriva para sistemas de
discordância estabelecida. Pequenos GTs coordenados por pessoas aptas podem
gerar consenso sobre as principais dificuldades.
25. Infraestrutura da Reunião. A geometria física tem sua
importância. Quando o número de pessoas permite, as cadeiras devem estar
colocadas em círculo. Se
necessário, em dois círculos concêntricos. Assim cada integrante tem a visão do
grupo todo. Os coordenadores não devem dirigir a reunião de uma plataforma
elevada, a menos que haja muitas pessoas na sala. Neste caso, a plataforma pode
aumentar a visibilidade dos oradores. Algumas garrafas térmicas com chá e café,
talvez biscoitos, são interessantes para os intervalos, ou para o final, porque
relaxam e aproximam as pessoas. Uma máquina fotocopiadora por perto pode ser
útil para reproduzir pequenos documentos, como propostas a serem discutidas e
outros textos de importância para a pauta do encontro. Recursos audiovisuais
podem ser úteis, mas não substituem ideias claras. Evidentemente, o local deve
estar ao abrigo de barulhos ou interferências externas. Nada deve dispersar a
atenção dos presentes durante o trabalho.
26. Intervalo. É importante. A qualidade dos
trabalhos cai rapidamente quando o cansaço passa de certo limite. Dez minutos
são suficientes. O intervalo também serve para contatos laterais e para
preparar melhor ideias a serem colocadas no plenário. Do ponto de vista
individual, é uma chance de estar só, em silêncio, por algum tempo, e
recarregar as baterias.
27. Liderança Eficiente. A função de um líder não é falar
o tempo todo, tomar decisões sem consultar ninguém, ou fazer manobras políticas
discretamente autoritárias. O verdadeiro líder percebe e aponta com clareza o
rumo que é melhor para todos. Ele ajuda a formular as metas do grupo e as
mantém sempre em pauta, mas evita manipular pessoas, age de modo transparente,
sabe ouvir a todos, inclusive os mais tímidos e retraídos, estimula a formação
de novas lideranças e é o primeiro a obedecer às regras, inclusive as regras da
boa reunião. O bom dirigente deve trabalhar duro, dando exemplo de dedicação à
causa e fazendo pessoalmente o que espera que os outros façam. Ele inspira o
crescimento de todos, mantém viva a chama do ideal e sabe ficar em silêncio
quando tudo vai bem, mas atua com decisão de ferro e paciência infinita quando
a situação fica crítica para os esforços do grupo. O líder experiente atua
seletivamente, isto é, age nos momentos oportunos e com intensidade adequada.
28. Lista de Inscrições. Figura essencial do trabalho em grupo. Deve ser
respeitada. A prática mostra que vale a pena esperar a nossa vez de falar. Mas
é útil ter papel e caneta à mão para anotar o gancho, a ideia básica do que queremos falar. Alguns não querem
esperar sua vez alegando que irão esquecer o que têm para dizer. Na verdade, a
ordem dos trabalhos, a tranquilidade que permite o brilho da luz da intuição é
mais importante do que os impulsos de última hora e a ansiedade por ser
escutado. O domínio destas ansiedades é um exercício valioso de auto-observação
e autoconhecimento. Saber esperar é fundamental. Em uma reunião, não se deve
falar mais que 5 minutos, a menos que seja feito um informe ou relato. Quando o
tempo fica curto, é correto anunciar que as inscrições serão encerradas nos
próximos dois ou cinco minutos. Se necessário, é válido também limitar as falas
a um minuto cada. É importante lembrar que ninguém
é tão sábio que tenha que falar o tempo todo, e ninguém é tão ignorante que não
tenha algo a ensinar aos outros.
29. Meditação de Abertura e
Fechamento. O
coordenador ou alguém a pedido dele dirige dois minutos de introspecção
meditativa do grupo, antes e depois dos trabalhos propriamente ditos. Nem a
meditação de abertura nem a meditação de fechamento são, necessariamente,
faladas. Mas umas poucas frases têm normalmente efeito inspirador, criando um
foco comum para a força do pensamento e do sentimento conjuntos. Usualmente se
recomenda alguns instantes de relaxamento físico, emocional e mental, deixando de lado as
preocupações pessoais, e focando a consciência em nosso centro de paz interior,
que é eterno. Deve-se trazer a consciência para fora do plano verbal e para dentro
do coração.
30. Meta Clara. É a agulha da bússola. O grupo deve ter suas metas
claras. A reunião deve ter objetivos definidos. Isso impede discussões confusas
ou discordâncias fora de contexto, e une esforços em torno do que é essencial.
31. Momentos de Silêncio. O silêncio permite ordenar melhor
as ideias. Durante a reunião, o coordenador ou outro membro pode solicitar um
minuto de introspecção para que o grupo aprofunde a vivência da serenidade, da
harmonia, ou retome o contato com sua consciência mais interna e superior. É
válido não só em momentos de agitação crescente, para neutralizar as tendências
ao descontrole, mas também em um momento feliz da reunião, para estimular ainda
mais o equilíbrio e a força interior.
32. Otimismo. Do latim optimum, o melhor. Otimismo é a tendência de ver o melhor nas
coisas, pessoas e situações. Há um otimismo ingênuo, feito de desejos
ilusórios, que leva à derrota. E há um otimismo sábio, que é irmão do desapego
e nasce quando sabemos que tudo o que existe - doloroso ou prazenteiro - faz
parte do plano da evolução. Aquele que vivencia a luz interna pode parecer
otimista aos olhos dos demais, mas na verdade é realista. Vê a realidade
externa, onde há dor, à luz da realidade interna, que é feita de paz. Por isto
o bom trabalho solidário irradia otimismo. Cada grupo que luta por uma causa
nobre deve ser um centro de luz para o mundo ao redor, e também um centro de
pensamento construtivo. Um clima de confiança no futuro é fator importante para
a eficiência das reuniões.
33. Pontualidade. A pontualidade deve estar
acompanhada de bom senso. Às vezes, deixar cinco ou dez minutos iniciais para
conversas paralelas e preparatórias enquanto as pessoas ainda estão chegando é uma boa prática. Mas quinze ou mais
minutos de atraso descaracterizam o horário e fazem com que os que são pontuais
percam tempo, enquanto se premia a desatenção. Por outro lado, pontualidade é
algo para ser exercido durante toda a reunião, que também deve terminar
pontualmente à hora prevista, sempre que possível. Reuniões intermináveis são
frustrantes.
34. Proposta de Encaminhamento. É uma forma de questão de ordem,
que interrompe a ordem das inscrições. O orador tem até um minuto para propor
uma maneira adequada de se encaminhar a discussão ou deliberação, caso esteja
havendo incerteza de rumos a este respeito. Em situações muito complexas, em
que surgem discordâncias sobre como encaminhar o debate e a tomada de decisões,
o coordenador pode estabelecer um intervalo de cinco minutos na reunião para articular
uma proposta consensual de encaminhamento. Isso é melhor do que deixar que as
divergências se aprofundem.
35. Prorrogação do Tempo de Fala.
Esgotados os
três, cinco ou sete minutos de fala, o orador pode solicitar mais alguns
minutos para concluir. Neste ponto, algumas opiniões da plenária podem ajudar a
mesa coordenadora a decidir pelo sim ou pelo não. Sem prorrogação, o orador
poderá reinscrever-se para complementar suas ideias. Prorrogação não é ideia a
ser estimulada. É uma exceção a ser evitada,
salvo em situações excepcionais.
36. Questão de Esclarecimento. É outro tipo de questão de ordem.
Pode ser levantada para solicitar, ou para prestar informação decisiva sobre
qualquer ponto obscuro e que não esteja sendo compreendido por quem levanta a
questão, ou pela plenária. A questão de esclarecimento só deve interromper o
orador em último caso, mas tem preferência em relação ao próximo inscrito da
lista, porque envolve a democratização da informação. De qualquer modo,
o coordenador não deve permitir que, sob a aparência de questões de
esclarecimento ou questões de ordem, sejam feitos na realidade comentários ou
defendidas opiniões.
37. Questão de Ordem. A questão de ordem permite
interromper o orador porque levanta um ponto de procedimento. Pode ser que o
tema esteja fora da pauta. Ou que o orador desconheça um detalhe importante
(ver Questão de Esclarecimento). O
coordenador deve permitir que a questão de ordem seja colocada, mas deve exigir
que seja apenas uma questão relativa ao procedimento e coordenação dos
trabalhos. A questão de ordem serve também para propor formas de encaminhar o trabalho. Uma Proposta de Encaminhamento pode ser colocada rapidamente em votação
pela mesa, sem perda de tempo. Mas esta
proposta pode, também, dependendo das circunstâncias, ser simplesmente acatada ou rejeitada pela mesa coordenadora. Isto dependerá da margem de
autonomia que a mesa tiver, graças ao clima de confiança reinante e ao bom
senso demonstrado.
38. Recém-chegado. É um padrão energético comum que
pessoas recém-chegadas caiam às vezes na tentação de querer mudar o curso da
reunião, ou as metas do grupo, ou seu método de trabalho. A historicidade da
situação deve ser respeitada. Quem chega deve passar algum tempo observando o
trabalho até integrar-se à sua aura
e perceber o que está acontecendo em todos os níveis da realidade.
39. Regime de Votação. Durante a votação, só o
coordenador fala. Deve-se ter certeza de que se esgotaram as questões de ordem
e os pedidos de informação antes de entrar em regime de votação. Deve-se
repetir suficientemente o que será votado, e isto de forma muito clara, sem
subestimar a capacidade humana de gerar distrações e desatenções. Os mais
impacientes devem ter tolerância com o coordenador para que ele possa dirigir a
votação lentamente e com clareza. A cada decisão, o coordenador deve “passar a
limpo” o fato e lembrar o que foi decidido, para só depois avançar em direção
ao ponto seguinte. Especialmente quando a questão tiver despertado ansiedades.
40. Respeito às Decisões. As decisões devem ser bem
pensadas, para que depois de tomadas mereçam o respeito de todos. Quando as
reuniões não têm capacidade de produzir decisões legítimas e dignas de
respeito, o trabalho grupal perde a consistência. Por outro lado, em certos
casos as decisões devem ter flexibilidade para que os encarregados da sua
execução adaptem os seus detalhes à dinâmica da vida, sem necessidade de novas
reuniões a todo momento. Para isso, a
confiança recíproca é fundamental. E a confiança surge da prática da lealdade.
41. Telefone Celular. Deve haver um acordo expresso
pelo qual todos os telefones celulares são desligados antes de começar a
reunião. Esta é uma questão de respeito pelo trabalho coletivo.
42. Tempo de Fala. É bom limitar as falas desde o
início da reunião em 5 minutos e usar a restrição de modo flexível, sem cortar
desnecessariamente o pensamento de ninguém, mas sem permitir que algum amigo
mais entusiasmado dê um longo discurso fora de contexto. Saber que temos poucos
minutos para falar nos leva a usar o discernimento para separar o essencial do
secundário.
43. Uso Correto das Palavras.
Deve-se falar com simplicidade e clareza. O taoísmo filosófico ensina: “As palavras
elevadas são usadas com objetivos baixos, as palavras simples são usadas com
objetivos elevados. (....) Só os sábios são efetivamente capazes de
conhecer estratégia; assim, as suas palavras demonstram ser verdadeiras e suas
expectativas são comprovadamente exatas.” [4]
43. Vaidade Pessoal. É um problema grave. Revela falta
de uma autoestima verdadeira, cujo déficit procura compensar. A vaidade não
deve ser tolerada quando ela prejudica uma reunião, e é recomendável
desmascarar impessoalmente seus mecanismos. Isto protegerá nossos líderes
contra o personalismo e a arrogância. Os movimentos sociais e espiritualistas
têm sofrido derrotas desnecessárias devido a esse problema, que também coloca
em sério risco a eficácia de qualquer reunião.
44. Veracidade. Helena Blavatsky escreveu:
“Teosofia é conhecimento divino, e conhecimento é verdade; todo fato verdadeiro e cada palavra sincera são,
portanto, parte da Teosofia”.[5] Os
grupos humanos que funcionam com equilíbrio colocam a verdade acima das
conveniências. A pior verdade é melhor do que a mais agradável das mentiras.
46. Verificar a Relação Entre as
Palavras e a Ação. O zen-budismo afirma: “Aquilo que
pode ser dito mas não praticado, é melhor não dizer. Aquilo que pode ser
praticado mas não dito, é melhor não fazer. Ao se proferir palavras, deve-se
sempre atentar para sua consecução. Ao se estabelecer uma prática, deve-se
sempre atentar para as suas implicações.
É por isso que os sábios antigos eram cuidadosos nas suas palavras e
seletivos nos seus atos.” [6]
47. Vocação de Vitória. O grupo deve trabalhar a partir
da percepção de que nenhum esforço se perde quando a meta é nobre. Não há nada
mais poderoso do que a evolução da vida, e cada pequeno passo adiante é uma
vitória. A vocação de vitória dá ânimo e coragem para enfrentar todos os
obstáculos - reais ou imaginários.
NOTAS:
[1]
“Cartas dos Mestres de Sabedoria”, Ed. Teosófica, Brasília, 1996, carta
82, 2a série, p. 266.
[2] “Parábolas”, Gibran Khalil
Gibran, Ed. ACIGI, RJ, p. 46.
[3] “Areia e Espuma”, Gibran Khalil
Gibran, Ed. ACIGI, RJ, 89 pp., ver p.
40.
[4] Da obra taoista clássica
“Wen-tzu”, de Lao-tzu, tradução do chinês de Thomas Cleary, tradução do inglês
de Carlos Cardoso Aveline, Ed. Teosófica, Brasília, 2002, capítulo 85.
[5] H. P. Blavatsky, “Collected
Writings”, TPH, Índia, 1986, volume IX, p. 38.
[6] Da obra “A Arte da Liderança,
Ensinamentos Zen”, de Thomas Cleary, Ed. Siciliano, SP, segunda edição, 1993,
184 pp., ver pp. 42-43.
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O texto “A Geometria da Boa Reunião” foi revisado e ampliado pelo
autor em maio de 2011. Uma versão inicial do texto havia sido publicada anos
antes pela revista “Planeta”, de São
Paulo.
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Sobre o crescimento interior e a
transformação pessoal no século 21, leia a obra “O Poder da Sabedoria”, de Carlos Cardoso Aveline.
O livro foi publicado pela Editora
Teosófica, de Brasília, tem 189 páginas divididas por 20 capítulos e inclui uma
série de exercícios práticos. Está na terceira edição.
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