Anotações de um Discípulo de
Helena P. Blavatsky, em Londres
Robert Bowen

A edição
original de “A Doutrina Secreta”,
em inglês, e Helena P. Blavatsky (1831-1891)
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Estes são extratos de anotações de
ensinamentos
pessoais dados por H.P. Blavatsky a
alunos da
escola esotérica durante os anos de 1888
a 1891,
incluídas num grande volume manuscrito
deixado a
mim por meu pai, [Robert Bowen], que era um dos alunos.
- P.G. Bowen
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Os
comentários de H.P.B. sobre “A Doutrina Secreta” estavam especialmente
interessantes na semana passada. Seria melhor eu tentar colocar isso tudo com
segurança no papel enquanto ainda consigo lembrar. Como ela própria disse, pode
ser útil para alguém dentro de trinta ou quarenta anos.
“A
Doutrina Secreta” é apenas um fragmento bastante pequeno da Doutrina Esotérica
conhecida pelos membros mais elevados das Fraternidades Ocultas. Ela contém,
diz HPB, apenas aquilo que pode ser recebido pelo mundo durante o próximo
século [vinte]. “O mundo”, ela
explicou, significa o Ser Humano vivendo na sua natureza pessoal. Este “mundo”
encontrará nos dois volumes da D.S.
tudo o que a sua mais alta compreensão pode absorver, mas não mais do que isso.
Isso não significa dizer que para um Discípulo que já não vive “no mundo” seja
impossível encontrar no livro mais do que “o mundo” vê nele. Toda e qualquer
forma, por mais “grosseira” que seja, contém oculta dentro de si a imagem do
seu criador. Da mesma forma a obra de um escritor, por mais obscura que seja,
contém a imagem oculta do conhecimento de quem a escreveu ….. . A partir desta afirmação, eu deduzo que a D.S.
deve conter tudo o que a própria H.P.B. sabe, e muito mais do que isso, já que
grande parte da obra vem de homens cujo conhecimento é imensamente mais amplo
que o dela. Além disso, ela deixa claro implicitamente que outra pessoa pode
encontrar na obra conhecimentos que ela mesma ainda não possui.
É
estimulante pensar que talvez eu possa encontrar nas palavras de HPB um
conhecimento do qual ela própria não tem consciência. Ela trabalhou bastante
com esta ideia. Alguém disse depois: “HPB deve estar perdendo o auge da força”,
o que significa, penso eu, confiança no seu próprio conhecimento. Mas ____,
____e eu temos uma interpretação melhor, creio. Ela está dizendo a nós,
seguramente, que não é correto ancorar-nos a ela como autoridade final, nem a
qualquer outro, mas devemos confiar nas nossas próprias percepções, que ganham
amplitude.
(Anotação
feita mais tarde a este respeito: eu disse isso a ela e ela fez um gesto
confirmando e sorriu. Tem um valor imenso ganhar um sorriso de aprovação de
HPB!)
Finalmente
conseguimos que HPB esclarecesse para nós a questão do estudo da Doutrina Secreta. Ler a DS página por página como se lê qualquer
outro livro (diz ela) só pode terminar em confusão. A primeira coisa a fazer,
mesmo que demore anos, é conseguir compreender “Os Três Princípios
Fundamentais” dados no Proêmio. [1] Em
seguida cabe estudar a Recapitulação - os itens numerados sob o título de
“Resumindo”, no Volume Um, Parte I. [2]
Depois disso, é melhor ir para as Notas Preliminares (Vol. II) e a Conclusão
(Vol. II) ….. .
HPB
parece ter uma posição muito definida sobre a importância do ensinamento (na Conclusão
de ‘A Doutrina Secreta’) sobre os
momentos em que surgem as Raças e Sub-Raças. [3] Ela afirma de maneira mais nítida que o habitual que não há na
verdade um “surgimento” futuro de raças. “Não há nem SURGIMENTO nem EXTINÇÃO,
mas uma eterna TRANSFORMAÇÃO”, diz ela. A Quarta Raça-Raiz ainda está viva.
Estão também vivas a Terceira, a Segunda e a Primeira; isto é, as manifestações
delas no nosso plano atual de substância estão presentes. Acho que sei o que
ela quer dizer, mas não consigo colocá-lo em palavras. Portanto do mesmo modo a
Sexta-Sub-Raça está aqui, e a Sexta Raça-Raiz, e a Sétima, e mesmo as pessoas
das próximas Rondas. Afinal de contas, é compreensível. [4] Os Discípulos e Irmãos e Adeptos não podem ser pessoas da
Quinta Sub-Raça comum, porque a Raça é um estado de evolução.
Mas
ela não deixa dúvidas de que, no que se refere à humanidade em seu conjunto,
estamos a uma distância de centenas de anos (em tempo e espaço) até mesmo da Sexta
Sub-Raça. Senti que HPB estava com uma ansiedade especialmente grande ao
insistir neste ponto. Ela mencionou “perigos e ilusões” que podem surgir da
ideia de que uma Nova Raça começou definitivamente no mundo. De acordo com ela,
a duração de uma Sub-Raça da humanidade em seu conjunto coincide com a duração
de um ano platônico (o círculo do eixo da Terra - cerca de 25 mil anos). Isso
coloca a nova raça a uma longa distância de nós.
Tivemos
uma sessão de estudos admirável sobre a D.S. nas três semanas que passaram.
Devo organizar minhas anotações e colocar o resultado em segurança antes que as
perca.
Ela
[Helena Blavatsky] falou bastante sobre os “Princípios Fundamentais”. Ela diz: “Se
alguém pensa que vai obter uma vista satisfatória da constituição do Universo a
partir da D.S., só vai conseguir ficar confuso com o seu estudo. A D.S. não foi
feita para transmitir nenhum veredito final sobre existência, mas para colocar o estudante no rumo da verdade.”
Ela repetiu esta última expressão muitas vezes. É
pior que inútil ir até aqueles que nós imaginamos que sejam estudantes
avançados - disse ela - e pedir a eles que nos deem uma “interpretação” da D.S. Eles não podem fazer isso. Se
tentarem, tudo o que poderão fazer é transmitir fragmentos isolados e exotéricos
que nem remotamente se parecem à Verdade. Aceitar uma tal interpretação
significa ancorar-nos a ideias fixas, quando a Verdade está além de quaisquer
ideias que possamos formular ou expressar. Interpretações exotéricas são
perfeitamente aceitáveis, e ela não as condena enquanto elas forem vistas como
sinalizações para os iniciantes, e não forem aceitas por eles como algo além
disso. Muitas pessoas que estão na Sociedade Teosófica [no movimento teosófico] são, é claro, potencialmente incapazes de
qualquer avanço além de uma concepção exotérica comum. Mas há outros, e haverá
outros, e para eles HPB estabelece o seguinte caminho de aproximação da D.S.,
que é o verdadeiro.
Venha
para o estudo da D.S. (diz ela) sem
qualquer esperança de alcançar a Verdade final da existência graças a esta
obra, nem qualquer outra intenção exceto a de ver até que ponto você pode
avançar na direção da Verdade. Veja
no estudo um meio de exercitar e desenvolver a parte da mente nunca alcançada
por outros estudos. Observe as seguintes regras.
Seja
o que for que você estuda na DS, faça com que sua mente mantenha firmemente
presente, como base da sua ideação as seguintes ideias:
A)
A
unidade fundamental de toda existência. Esta unidade é uma coisa totalmente
diferente da noção comum de unidade - como quando dizemos que uma nação está
unida ou um exército está unido; ou que este planeta está unido por linhas de
força magnética e assim por diante. O ensinamento não é este. Ele afirma que a
existência é uma só coisa, e não uma
coleção de coisas que foram reunidas. Fundamentalmente, há apenas UM SER. Este
Ser tem dois aspectos, positivo e negativo. O negativo é a substância, o sujeito da consciência. Este Ser é o
Absoluto na sua manifestação primária. Como ele é o Absoluto, não há coisa
alguma fora dele. Ele é TODO O SER. Ele é indivisível, caso contrário não
poderia ser absoluto. Se uma parte dele pudesse ser separada, o que restasse
não poderia ser absoluto, porque em seguida surgiria a questão da comparação entre ele e a parte separada.
A comparação é incompatível com qualquer ideia de coisa absoluta. Portanto é
claro que esta Existência Una fundamental deve ser a Realidade presente em cada
forma que existe …..
(Eu
disse que embora esse ponto fosse claro para mim eu achava que poucos
estudantes nas lojas teosóficas iriam compreendê-lo. Ela respondeu: “A Teosofia
existe para aqueles que conseguem pensar, ou para aqueles que podem fazer um
esforço para pensar, e não para preguiçosos mentais.” H.P.B. está muito
diplomática atualmente. Ela costumava usar a expressão “cabeça oca” para
referir-se à média dos estudantes.)
O
Átomo, o Homem, o Deus, (diz ela) são cada um, separadamente, assim como
coletivamente, Absoluto Ser, em última análise, isto é, na sua verdadeira individualidade. É esta ideia que deve
ser mantida sempre presente na mente para formar a base de toda concepção que
surja do estudo da DS. No momento em que o estudante deixa de lado esta ideia
(e isto é muito fácil de acontecer quando ele está engajado em qualquer um dos
muitos aspectos intricados da Filosofia Esotérica) a ideia da separação aparece
e o estudo perde o seu valor.
B)
A
segunda ideia a ter em conta sempre é que não
existe matéria morta. Cada átomo está vivo e não poderia ser diferente, já
que todos os átomos são fundamentalmente Ser Absoluto. Consequentemente não há
nada parecido com “espaços de Éter”, ou Akasha, ou chame-o como quiser, no qual
os anjos e os elementais se divertem como trutas na água. Esta é a ideia comum.
A ideia verdadeira mostra que cada átomo de substância, seja de que plano for,
é uma vida em si mesmo.
C)
A
terceira ideia básica a ter junto de si é que o Homem é o microcosmo. E na
medida em que ele é o microcosmo, todas as Hierarquias dos Céus existem dentro
dele. Mas na verdade não há nem Macrocosmo nem Microcosmo mas somente uma
EXISTÊNCIA UNA. O grande e o pequeno só existem quando vistos por uma
consciência limitada.
D) A quarta e
última ideia básica que se deve ter presente é a que se expressa pelo Grande
Axioma Hermético. Ela realmente resume e sintetiza todas as outras: “Assim como
é o interno, assim também é o externo; assim como é o grande, é o pequeno; assim
como é acima, é abaixo; há somente Uma Vida e Uma Lei: e aquele que trabalha
nela é UM. Nada é interno, nada é externo; nada é grande, nada é pequeno; nada
é alto, nada é baixo, na Economia Divina.”
Seja
o que for que examinemos no estudo da DS, devemos correlacioná-lo com estas
ideias básicas.
Eu
sugeri que este tipo de exercício mental deve ser extremamente cansativo. HPB
sorriu e concordou, fazendo um gesto com a cabeça. Não devemos (disse ela)
fazer a bobagem de exagerar no início até precisar de uma clínica psiquiátrica.
O cérebro é o instrumento da consciência de vigília, e toda imagem mental
consciente, uma vez formada, significa mudança e destruição dos átomos do
cérebro.
A
atividade intelectual comum segue caminhos costumeiros no cérebro, e não exige
destruições e ajustes súbitos em sua substância. Mas este novo tipo de esforço
mental necessita de algo muito diferente - o estabelecimento de novos “caminhos
cerebrais” e o estabelecimento de uma nova ordem de prioridades entre as
pequenas vidas do cérebro. Se o novo esforço for imposto sem o devido
equilíbrio, pode causar um dano físico sério ao cérebro.
Esta
maneira de pensar (diz ela) é o que os indianos chamam de Jnana Ioga. À medida que alguém avança em Jnana Ioga, vê o surgimento de ideias que, embora se tenha
consciência delas, não podem ser expressadas nem formuladas em qualquer tipo de
imagem mental. Com o tempo, estas ideias passarão a ser imagens mentais. Este é
o momento para ser vigilante e evitar a ilusão de pensar que a maravilhosa
imagem recém-alcançada deve representar a realidade. Ela não representa a
realidade. Continuando o trabalho, vemos que a imagem antes admirada se torna
tediosa e insatisfatória, e finalmente desaparece ou é jogada fora.
Este
é outro momento perigoso, porque o estudante é deixado por algum tempo num
vazio sem qualquer ideia que lhe dê um apoio, e pode surgir a tentação de reavivar
a imagem abandonada por falta de algo melhor a que agarrar-se. No entanto, o
verdadeiro estudante seguirá trabalhando sem preocupações, e surgirão mais impressões
cintilantes sem forma, que com o tempo darão lugar a uma imagem mais ampla e
mais bonita que a anterior. Mas o aprendiz já sabe, agora, que nenhuma imagem
jamais representará a verdade. Esta nova imagem esplêndida se tornará tediosa e
se dissolverá como as anteriores. E assim o processo continua, até que afinal a
mente e as suas imagens são transcendidas e o aprendiz entra no mundo da
não-forma e ali se estabelece: todas as formas são apenas reflexos
simplificados dele.
O
verdadeiro estudante de A Doutrina
Secreta é um Jnana Iogue, e este
Caminho da Ioga é o Verdadeiro Caminho para o estudante ocidental. Foi para dar
a ele uma sinalização deste trajeto que A
Doutrina Secreta foi escrita.
Anotação feita
mais tarde:
Reli
para H.P.B. este relato, perguntando se eu havia registrado corretamente o
pensamento dela. Ela me chamou de bobo cabeça oca por imaginar que alguma coisa
possa ser jamais colocada corretamente em palavras. Mas ao mesmo tempo sorriu e
fez que sim com a cabeça, e disse que eu havia feito um informe melhor que o de
qualquer outro estudante; e melhor do que ela própria seria capaz de fazer.
Pergunto
a mim mesmo por que motivo estou reunindo isso tudo. O material deveria ser
passado ao mundo, mas estou demasiado velho para divulgá-lo. Sinto-me
exatamente como se eu fosse um filho de H.P.B., no entanto, sou vinte anos mais
velho do que ela em idade física.
Ela
mudou muito desde que a conheci dois anos atrás. É maravilhoso o modo como ela
se comporta diante de uma doença séria. Se um indivíduo não soubesse nada e não
acreditasse em coisa alguma, ainda assim chegaria à conclusão de que HPB é
alguma coisa que está além e acima do corpo e do cérebro. Eu sinto,
especialmente durante estes últimos diálogos desde que ela se tornou tão frágil
em seu corpo, que estamos recebendo ensinamentos vindos de uma outra esfera,
mais elevada. Parece que sentimos e sabemos o que ela diz, mais do que
escutamos com os nossos ouvidos físicos. X___ disse basicamente a mesma coisa,
na noite passada.
19
de abril de 1891
Robert
Bowen (comandante)
NOTAS
DE 2019:
[1] Veja “As Três Proposições Fundamentais”.
(CCA)
[2] “A Doutrina Secreta”, tradução
passo a passo da edição original. (CCA)
[3] O movimento
teosófico propõe a fraternidade universal e é portanto antirracista. Os termos
“raça” e sub-raça” se referem a tipos de humanidade que se desenvolvem em
longos intervalos de tempo e ciclos maiores do que os ciclos da história
conhecida. As mesmas almas humanas passam por diferentes estágios ou
raças-raízes e sub-raças ao longo de períodos de tempo quase imensos. Estes são
termos técnicos de teosofia tal como abordada na obra “A Doutrina Secreta”.
Compreender a teosofia original permite perceber com maior clareza que “ninguém
é melhor que ninguém” e nenhum ser é intrinsecamente melhor que outro, porque a
vida universal está presente em todos. Os grandes iniciados não se consideram
“superiores” a ser algum, mas se colocam humildemente a serviço da evolução de
todos. (CCA)
[4] O tempo eterno
está presente aqui e agora. Portanto, também estão presentes aqui e agora as
etapas de longo prazo - anteriores e futuras - da evolução humana, que são
chamadas de Raças, Rondas e Cadeias. (CCA)
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O texto
acima foi publicado nos websites associados dia 30 de dezembro de 2019. A
tradução é de Carlos Cardoso Aveline. Veja o original do texto em inglês: “The ‘Secret Doctrine’ and Its Study”.
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Clique
para ver “A Doutrina Secreta”, no que já
existe em português da edição original e sem as adulterações promovidas por
Annie Besant.
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