Cabe Agir Com os
Outros Como
Gostaríamos que
Agissem Conosco
Carlos Cardoso
Aveline
Uma das metas da caminhada espiritual é o
contato consciente do indivíduo com o cosmo. Este nível de diálogo ocorre na
razão direta do contato do peregrino com a sua própria alma imortal.
Cabe ao aprendiz desenvolver em primeiro
lugar relações cármicas geometricamente corretas consigo mesmo e com todos os
seres.
Quando o eu inferior está em ordem, ele
pode ser esquecido e o foco de consciência se transfere para o que é superior. A
recíproca é verdadeira: na medida em que o foco de consciência busca o mais
elevado, o eu inferior se organiza e é iluminado pela luz do alto.
Havendo equilíbrio entre sentimentos,
pensamentos e ações, existirá lucidez e durabilidade no modo como se olha na
direção do infinito.
A prática da cordialidade ajuda a viver de
modo impessoal e constitui um ponto prioritário para as tradições de sabedoria do
extremo Oriente, inclusive as artes marciais. As civilizações orientais antigas
priorizam a prática da moderação nos vários níveis de consciência. [1]
Há um respeito que é superficial e gerado
pelo medo da represália. Há um respeito manipulador, movido pela intenção da
lisonja. Há um respeito que, embora sincero, ainda ocorre num plano superficial
e pode desaparecer quando as opiniões pessoais são contrariadas. Mas há uma
consideração pelos outros que é simultaneamente externa e interna e ocorre
tanto no coração como nas palavras.
A reciprocidade equilibrada faz parte das
relações humanas corretas e é necessária na vida familiar, no esforço
profissional e nas associações que visam o bem comum.
Quando amamos alguém, este sentimento deve
ser combinado ao respeito incondicional.
O nível de consideração e cordialidade
espontâneas de cada um para com os outros define a qualidade interna da vida de
uma comunidade.
Quando os cidadãos não se compreendem
reciprocamente, as cidades, os países ou civilizações se encaminham para o seu
final. A marca de uma civilização renovada está na consideração mútua entre os
cidadãos. Este sentimento produz a cooperação sincera.
O respeito por um ser está ligado ao
respeito por todos. Se amamos um filho, queremos o bem de todas as crianças. Se
amamos a vida própria, preservamos a vida alheia. Se conhecemos nosso
verdadeiro eu, somos amigos sinceros das árvores e dos pássaros. O vento, o sol
e as estrelas, assim como os rios e as montanhas, merecem a devida
consideração.
Respeito é um dos nomes da devoção. Os
diferentes mestres que encontramos na vida merecem reconhecimento. A
consideração por alguém não é algo que dependa de sinais externos. Não
necessita de demonstrações visíveis, mas surge de modo natural. Pode permanecer
em silêncio, iluminando imperceptivelmente o processo de cooperação e diálogo
ao longo dos altos e baixos da vida.
O verdadeiro respeito permanece vivo na
discordância. Ele cresce na dificuldade, porque não depende da maré da
superfície das coisas.
O respeito limita a raiva e a frustração.
E quando o peregrino está irritado consigo mesmo ou frustrado com algum
fracasso seu, cabe respeitar a si mesmo e lembrar do seu potencial divino. A
força da alma espiritual frequentemente cresce e brilha com mais intensidade
nos momentos difíceis. Se o peregrino estiver excessivamente contente com
alguma vitória, o respeito por si mesmo e pelos outros o fará lembrar das suas
limitações, receber a vitória com humildade e adotar uma atitude moderada.
A lisonja traz consigo a desconsideração:
manipular alguém é uma forma oculta de desprezo. A boa vontade existe em seres
sinceros: a coragem e a discordância honesta fazem com que a cordialidade
profunda seja preservada.
O respeito verdadeiro torna desnecessário
o fingimento. Ele brilha na concordância e na discordância, e se alimenta da
gratidão e do amor à verdade. Ele ilumina os seres nos momentos favoráveis e
desfavoráveis, na união e no distanciamento, e nos liberta da ignorância
espiritual.
O sentimento de consideração para com nossos
semelhantes sustenta a consciência da união na diversidade. Agindo com os
outros como gostaríamos que agissem conosco, abrem-se as portas da consciência
celeste. Lembrando da nossa unidade essencial com o infinito, percebemos um parentesco
com tudo o que existe, existiu ou irá existir no futuro.
NOTA:
[1]
Veja em nossos websites os artigos “O Respeito Derrota Agressões”, “O Respeito
Pelo Eu Inferior”, “A Teosofia do Namastê” e “A Arte de Agradecer”. Leia também
“A Filosofia do Aikidô” e “Força Moral no Judô e na Teosofia”.
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Uma versão inicial do artigo acima foi publicada sem indicação
do nome do autor em “O Teosofista”, abril
de 2016, páginas 7-8. Título original: “A Força Transformadora do Respeito”.
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